Milena Mangueira, mãe de três, administradora com rotina cheia. Katherine Reyes, fisioterapeuta, veio da Colômbia há cerca de dois anos. Amanda Saraiva, nascida em Lavras da Mangabeira, interior do Ceará, é analista de sistemas. Lia Raquel Escudeiro, advogada, se assume apaixonada pelo samba. Jasmin Zeidle abraça um dia a dia puxado de estudos. Elas poderiam não ter absolutamente nada da rotina em comum, se não fosse o amor pelo futebol.
Nas noites de terças-feiras, as bolsas com nécessaire de maquiagem, escova de cabelo e esmalte de unha precisam ter espaço para os meiões, as chuteiras e o colete em rosa ou verde sinalizando que o "Racha de Sainha" vai começar. Elas entram no gramado cheias de charme e com sorrisos de orelha a orelha. Entre gols, embaixadinhas e dribles, o grupo mostra (sem esforços) a sintonia que uma tem com a outra.
"A gente se incentiva muito. Tem gente que traz os filhos para o racha. Outras colocam os pequenos para dormir antes de vir. Algumas vêm direto do trabalho. Tem também quem faça tudo isso que eu citei e, depois, ainda consegue vir", conta Lia Raquel, fundadora do grupo, que surgiu há cerca de oito anos no Aterro da Praia de Iracema e até hoje segue por lá às segundas e quartas e, nas terças, no Alvo Futebol Society e Paintball.
Cada uma das cinco meninas tem histórias particulares na caminhada com o futebol. Milena, por exemplo, vem de uma família tradicional. Para seus pais era estranho ver uma mulher, dentro de casa, jogando bola. "Eles me perguntavam: 'tu vai sair de casa a essa hora pra jogar?', com um olhar de recriminação. Mas eu ia mesmo assim. E botei minha filha para começar a treinar também. Ela vê a mãe e o pai jogando. Se gostar, tem todo nosso apoio", explica a administradora.
Para Amanda, sua infância no Interior foi de pés descalços e com a bola rolando pelas calçadas. Ela diz não sentir os olhares de preconceito naquela época, o que mudou depois que cresceu e veio para a Capital. "Sempre que eu falo que jogo bola as pessoas me olham impressionadas. Dá para sentir", pontua.
A colombiana Katherine foi surpreendida ao chegar no Brasil. Ela, que já jogava no seu país de origem, chegou em Fortaleza imaginando que iria se esbaldar na terra do futebol. Mas não foi bem assim. "Eu tive uma dificuldade imensa de encontrar mulheres que jogavam. Comecei a praticar na turma dos amigos do meu marido. Era a única mulher. Até que encontrei as meninas e, desde então, não saí mais daqui", pontua. "Percebo que existe muita mulher que quer jogar, mas tem medo do preconceito. Mas não devemos ter medo. Temos muita gente do nosso lado", conta a fisioterapeuta.
Jasmin decidiu se juntar ao grupo há cerca de um ano, quando ia acompanhar os treinos do namorado e se perguntou: "Por que eu não jogo também?". Ela teve o apoio, dentre as outras participantes, de Lia Raquel, conhecida por elas como a capitã do time. Raquel é puro incentivo. No seu discurso, ela deixa de lado as lamentações e bate o pé quando fala que futebol é coisa de mulher. "Aqui encontramos nossa garra, ficamos unidas, aprendemos a conviver com as diferenças. Somos mil mulheres em uma só. Dá pra fazer a unha e vir jogar bola, assim como dá pra cuidar do filho, do trabalho, do estudo e vir jogar bola. Nós somos capazes, fortes e, unidas, seremos melhores ainda. O futebol nos ensina tudo isso", completa.
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Cartão vermelho!
Jamylla Sá, cearense,
jogadora da Universidade Federal do Ceará
"Precisamos de políticas públicas que nos incentivem e nos deem suporte para praticar o esporte de forma digna. Precisamos de apoio social, considerando que vivemos numa sociedade patriarcal, machista e preconceituosa, é necessário que exista uma conscientização em relação a mulher poder praticar o esporte, que a prática do futebol pelas mulheres não define orientação sexual. Nos colégios, nas aulas de Educação Física, por exemplo, é necessário que isso seja incentivado e orientado de forma adequada".
É gol!
Bruna Mavignier
"Foi muito bom a nova lei da Fifa que obriga os clubes de futebol masculino profissional a terem o time feminino. Isso foi um passo grande e, com isso, o Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino também começou a ganhar mais atenção. Obviamente, o suporte financeiro para as atletas femininas está muito abaixo dos atletas masculinos, o que ainda é de se lamentar, mas eu fico muito feliz com o que essa Copa do Mundo está trazendo, os jogos transmitidos em canais abertos, por exemplo"
Preconceito
Jade Monteiro, jogadora da UFC
"A diretora do colégio que eu estudava chegou a chamar minha mãe, quando eu era criança, orientando a mandar que eu fizesse coisas de garota. No meu interior era um escândalo uma mulher jogar futebol. Quando falava que jogava, perguntavam logo se era vôlei e, quando eu dizia que era futebol, me olhavam da cabeça aos pés"
Bruna Mavignier, cearense, jogadora da Universidade de Manitoba Bisons, no Canadá
"Talvez não exista tanto preconceito de forma clara, mas existe quando os pais de uma menina não deixa ela jogar futebol ou incentivam a fazer vôlei, ao invés de futebol. Ou uma escola não oferece o futebol feminino como modalidade esportiva. Ou quando ainda se dá preferência ao futebol masculino na federação, nos salários".
Beleza em jogo
A camisa 10 do time de futebol feminino brasileiro, Marta Silva, foi a escolhida para estrear campanha para promover o lançamento do Batom Power Stay de Avon, o novo batom líquido matte que promete 16 horas de fixação. O conceito "Veio Pra Ficar", desenvolvido pela J. Walter Thompson, teve como propósito criar uma narrativa que gerasse integração entre a jogadora de futebol e os atributos do novo produto.