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O novo "vácuo administrativo" da Cinemateca Brasileira
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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

O novo "vácuo administrativo" da Cinemateca Brasileira

Pesquisadora em preservação audiovisual avalia situação da Cinemateca Brasileira a partir da possível chegada da atriz Regina Duarte à gestão da instituição
Tipo Opinião
Cinemateca Brasileira vive período crítico (Foto: divulgação)
Foto: divulgação Cinemateca Brasileira vive período crítico

A Cinemateca Brasileira é responsável pela salvaguarda e difusão do patrimônio audiovisual do País. Criada em 1940 e estabelecida oficialmente em 1956, ela vem, pelo menos nos últimos sete anos, sofrendo com problemas estruturais, administrativos e de orçamento. O imbróglio mais recente ocorre pela anunciada promessa de que Regina Duarte assumirá a instituição após passar menos de três meses como secretária especial de cultura. O fato é que, em 2018, a Cinemateca passou a ser gerida por uma organização social, a Associação Comunicativa Roquette Pinto (Acerp), o que pressupõe autonomia da OS nas escolhas de gestão. Adicione-se, porém, o fato de que o contrato de gestão - que tinha validade até 2021 - foi encerrado em dezembro último e, em 2020, a instituição ainda não recebeu repasses financeiros. A situação, pelo menos, chama atenção para a instituição, como lembra a pesquisadora e membro da Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA) Lila Foster. Em entrevista à coluna, a especialista avalia os "vácuos administrativos" da Cinemateca, aborda a possível gestão de Regina Duarte e ressalta a importância de diálogo para a manutenção da instituição.

O POVO - Como avalia a situação da Cinemateca nos últimos anos?

Lila - Sempre existiu, historicamente, uma dificuldade do estatuto jurídico da instituição. Primeiro ela era uma entidade privada que, depois, passa para o braço público. Esse problema persiste nessa gestão via Organização Social, culminando na não transferência do dinheiro da Secretaria do Audiovisual para a instituição. Agora, a Cinemateca chega numa espécie de UTI, mas já há alguns anos não tem tido estrutura, tanto de pessoal - uma das últimas coisas que o Governo fez foi dispensar os funcionários públicos da instituição, ou seja, não tem um quadro estável, o que fragiliza muito - quanto para cumprir o papel de difusão de filmes, programação, atendimento a pesquisadores. Em 2013, ela era gerida pela Sociedade Amigos da Cinemateca e surgiu uma denúncia de má gestão, então ela ficou desde então sem saber como seria administrada, num vácuo administrativo.

OP - A promessa do cargo para Regina Duarte pode não ser cumprida porque a Cinemateca é gerida por uma OS, mas esse contrato está defasado. Tudo isso revela desconhecimento sobre a instituição e sua estrutura. É possível que o presidente escolha quem irá assumir a Cinemateca?

Lila - Isso só expressa a confusão do status da Cinemateca. Quando estava sob gestão da Secretaria do Audiovisual, existia um vínculo direto. Gerida por uma OS, a organização tem autonomia para escolher. Isso mostra um imbróglio administrativo, que é algo que as OSs propiciam. Está havendo uma dança das cadeiras, nem sabemos se e como a Regina Duarte vai ser nomeada. Foi criada uma instabilidade gigantesca. Além do desconhecimento da gestão, que existe, há um desinteresse de ter qualquer coisa que permaneça, qualquer construção de fato.

OP - Assumindo que a promessa se cumpra, o que esperar de uma gestão de Regina Duarte, que não seria técnica e que, enquanto secretária, não demonstrou capacidade de gestão e diálogo?

Lila - O ideal seria que, chegando lá, ela tivesse capacidade de escuta e interlocução. É fundamental que se tenha uma pessoa que entenda de gestão, dos meandros da administração pública, mas ainda mais que exista diálogo, especialmente com as pessoas que trabalham lá. As previsões não são as melhores, mas ao mesmo tempo a Cinemateca se tornou um espaço que as pessoas estão discutindo, lendo e entendendo sobre. Que sirva como um alerta para que a gente fortaleça a luta por ela e pela preservação no País. Que a gente perceba o trabalho que é feito pelas pessoas que permanecem lá, um quadro formado, competente e que tem conhecimento. É preciso valorizar o que tem resistido apesar de todas as mudanças e entender que a preservação tem parâmetros técnicos, estrutura, mas também precisa de pessoas bem formadas. Para além da sobrevivência, temos que pensar a Cinemateca em seu pleno potencial, em como a gente consegue, enquanto País, fazê-la funcionar com a força que tem.

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