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A casa no isolamento: dicas para redescobrir o conforto no lar
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A casa no isolamento: dicas para redescobrir o conforto no lar

Em meio ao desalento de uma pandemia, a redescoberta do aconchego tem guiado as diversas formas de ser e estar no mundo, especialmente em casa
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Objetos que traduzem nossa essência pela casa promovem sensação de bem-estar. No registro cedido pela arquiteta Liana Feingold: plantas, quadrinho, velas, pedras e cristais (Foto: Acervo Pessoal/Liana Feingold)
Foto: Acervo Pessoal/Liana Feingold Objetos que traduzem nossa essência pela casa promovem sensação de bem-estar. No registro cedido pela arquiteta Liana Feingold: plantas, quadrinho, velas, pedras e cristais

"Se puder, fique em casa"— é o que se ouve há pouco mais de um ano, quando a pandemia da Covid-19 chegou ao Brasil. Nesta reconfiguração da rotina, diversas pessoas descobriram o quanto a experiência do morar pode traduzir histórias e essências. A busca pelo aconchego, percebida de diferentes formas, torna-se cada vez mais urgente. Esse reencontro com o conforto acha-se nas sutilezas do íntimo, com o olhar para si e para o que te faz feliz e seguro no próprio abrigo.

Isso está relacionado a elementos de luz, cheiros, sons, cores, texturas e significados. Para tornar o ambiente mais aconchegante, cada detalhe contribui para o bem-estar. Apesar de ser algo bastante pessoal, favorecem o conforto no lar: iluminação natural, abertura de novos espaços para ventilação, conexão com a natureza, texturas orgânicas, menos ruído e objetos com memória afetiva ou simbólicos, que abraçam a identidade do morador.

Quando realiza um projeto, a arquiteta Lara Holanda, do Estúdio Lar, levanta a questão: "como eu posso tornar esse ambiente mais humano?". Para ela, o lar deve ser identificável ao morador, um lugar onde há prazer de estar. "Cada pessoa é singular", acrescenta. Com o isolamento social, devido à pandemia, ela afirma: "Não demorou muito para que fosse percebida a necessidade de ter um lar verdadeiramente confortável".

Segundo Lara, é possível pensar em três tipos de conforto: o térmico, que está voltado para as questões naturais; o psicológico, que tem a ver com a utilização de cores, plantas e elementos da natureza; e o acústico, que envolve materiais como tapetes. Para quem deseja adicionar conforto em casa, a arquiteta indica: "Escolha bem os materiais, de acordo com a necessidade. Também é possível procurar cortinas com filtro solar, por exemplo. Outra dica é ter um leiaute organizado", explica. A organização e o entendimento sobre aquilo que se deve manter em casa também deve ser pensado. Com a prática, até mesmo os pensamentos podem se reorganizar.

Para a arquiteta Liana Feingold, idealizadora do Estar Urbano - Ateliê de Arquitetura e Urbanismo, "é tempo de ressignificar e buscar o essencialismo". Neste momento tão conturbado, o "novo conforto" está nas miudezas, como os pés descalços na grama, o banho no jardim, o porta-retrato da família ou o descanso na rede. "O grande aprendizado é esse olhar afetivo para algo que, muitas vezes, passava despercebido", contempla. De acordo com a arquiteta, "pode ser um palácio, uma quitinete ou um quarto, pode ser próprio ou alugado" — os rótulos não devem importar, pois, " é lá o nosso descanso".

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"Essa relação de conforto varia de cada pessoa, já que somos seres únicos e temos demandas específicas. Existe a subjetividade e ela está cada vez mais intensa, porque nós estamos percebendo tudo o que nos desconforta. Então, estamos buscando o que nos conforta", reflete Liana. Ressignificar objetos e cantos que já estão na casa também pode ser uma alternativa viável para explorar o aconchego, como deslocar um móvel para outro cômodo e originar novos rituais para o uso. "A gente vai criando novos movimentos internos e, consequentemente, traduzindo o conforto".

Assim como seus moradores, as casas também abrigam imperfeições. "Às vezes, pode ser uma pintura, uma parede que não terminou de montar ou um móvel para arrumar", comenta Liana. Tais imperfeições são comuns, já que o lar reflete o sujeito que reside. Aqui, fala-se sobre valorizar o processo para encontrar o aconchego. "O mais legal é você perceber, acolher as imperfeições e entender que não somos perfeitos, mas podemos ser melhores. Como o nosso lar, pode ser melhor. Ele não precisa ser perfeito, ele pode ser melhor".


FORTALEZA, CE, 24-03-2021: A pauta trata sobre o redescobrir o conforto e trazer o aconchego na pandemia para dentro de casa. Luis Sergio Junior ergue sua residencia atraves da
FORTALEZA, CE, 24-03-2021: A pauta trata sobre o redescobrir o conforto e trazer o aconchego na pandemia para dentro de casa. Luis Sergio Junior ergue sua residencia atraves da "arte construcao" e traz para sua casa uma construcao fora do padrao. (BARBARA MOIRA/ O POVO)

Conexão com arte e vida

O geógrafo Luis Sérgio Júniorergue sua morada por meio de uma construção que une arte, jardinagem e reaproveitamento de materiais. Na estrutura, utiliza cimento, garrafas, arames e bambus. Há plantas, cores, espelhos reaproveitados e pedras de rio. O projeto é como um "um paraíso" em meio ao contexto urbano. Em reforma, a casa passa por adaptações, como a abertura de janelas para oferecer luminosidade, melhora da ventilação e conforto térmico.

O ideal de conforto de Luis Sérgio está traduzido na conexão com a arte e a natureza. No reduto, tenta reproduzir as paisagens que o acolhe e alegra — como as que contemplou ao viajar de bicicleta pela América do Sul, em 2012. Após as andanças, sentiu o impacto de "sair do meio natural e voltar para o urbano". Desde então, cria constantes espaços com vegetação e cores.

"É necessário ter o mínimo de conexão com a natureza, que é o nosso conforto com nossa mãe Gaia (Mãe-Terra, na mitologia grega). Entender que é necessário ter plantas, cores… Essa é a minha terapia", conta. Luis Sérgio compartilha mudanças na casa por meio do perfil no Instagram @resistenciaartetattoo. Em breve, outras pessoas poderão sentir um tanto desse aconchego: o lugar deve se tornar um espaço de resistência artística e estúdio de tatuagem.

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Pedro Franco, designer brasileiro
Pedro Franco, designer brasileiro

"O maior conforto é a verdade"

Expoente do design brasileiro contemporâneo, Pedro Franco repercute a ideia de conforto ao O POVO. O designer é fundador e diretor de arte da A Lot of Brasil, indústria de peças assinadas por nomes de destaque do design global.

O POVO - Como você pensa o conforto em suas peças?

Pedro Franco - Começo sempre com um olhar mais formalista. Adoro os dizeres do poeta, "Os feios que me desculpem, mas a beleza é fundamental". A beleza está traduzida em vários componentes, obviamente. Tal qual a beleza do ser humano. A estética interior e, também, a exterior. E o que é um produto bonito por dentro e por fora? Primeiramente, a aparência formal. Posteriormente, a beleza dialética, as emoções e histórias que nele são contidos. Num terceiro ponto, obviamente, dou vida à essa beleza, trabalho até que esteja pronta para atender sua função de uso.

OP - A Poltrona Kaos (foto) lança convite ao aconchego por várias perspectivas. O título também reflete sobre o momento atual. Você pode falar um pouco sobre essa relação?

PF - Sempre procuro fugir do estático, do excessivo valor da forma e função. Acho que o produto deve nos acompanhar nessa jornada da vida, deve oferecer e possibilitar várias composições e se adequar a cada momento. A Poltrona Kaos traz esses valores. Se quero deitar de "través" num dia de um maior relaxamento, ela me possibilita. Se quero me sentar retiliamente, também. Se quero deixá-la no meio de minha sala como uma obra de arte, ela me possibilita. Se quero deixá-la comportadamente num canto da sala, também. Acho que esses valores a mais, inseridos no produto, são fundamentais para se falar de sustentabilidade. Ser sustentável é ir além da forma e da função. A poltrona Kaos emociona, incomoda, se transforma em meio ao decór.

OP - Em meio à pandemia, quais as características desse conforto?

PF - A pandemia nos traz que o maior conforto é a verdade. Aquele produto, em nosso ninho, nossa casa, faz sentido para nós? Ou se trata apenas de atender um fetiche de modismo? Esses tempos nos mostraram a necessidade de memória e verdade em nossos lares. Um artesanato de minhas raízes, a cadeira de minha avó, uma poltrona que me emociona... A pandemia nos mostrou que os produtos conversam conosco em todos os instantes e estâncias, mostrou que nossos lares vão muito além de postos "dormitório". Isso tudo se estende à questão da filosofia humana. Quem somos nós no momento? O que nos alimenta? A verdade em nossas casas e em nossa vida com certeza passou a ser necessidade básica. Como viver um lockdown, em uma casa fria? Em uma casa de revista que não traduza nossas essências? Em uma casa sem nossas memórias?

 

Para acompanhar

Estúdio Lar

Mais info: @estudiolar

Estar Urbano

Mais info: @estarurbano

Resistência Arte Tatto

Mais info: @resistenciaartetattoo

Lot Of Brasil

Mais info: https://alotofbrasil.com.br

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