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Onde mora o coração
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Onde mora o coração

Parte vital para a vida humana, o coração, em sua forma anatômica, chama atenção em trabalhos que versam emoções e inquietudes humanas, na (re)descoberta de sua essência
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O nome Savoy Club - na bag, presa como pochete - faz menção ao antigo hotel onde trabalhou, de porteiro, antes de criar sua Gucci, marca inicialmente de malas, o dono da gigante italiana, hoje, dirigida por Alessandro Michele, Guccio Gucci (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação O nome Savoy Club - na bag, presa como pochete - faz menção ao antigo hotel onde trabalhou, de porteiro, antes de criar sua Gucci, marca inicialmente de malas, o dono da gigante italiana, hoje, dirigida por Alessandro Michele, Guccio Gucci

Um coração, no sentido figurado, pode ser mil estados emocionais. A alguns, é o formato que aguça sonhar, imaginar, porque enraizou-se nele, há milhares de anos, com mitos e fatos históricos de diferentes culturas, a representação do amor e alma humana. Onde se mora o amor como as paixões ao que se é, na vida, entregue, à arte, ao trabalho, à dedicação a... Nessa mesma direção, também é a visão e o verbo. Você lê "I New York" com alguma dificuldade? A palavra "love" substituída pelo símbolo de coração passou a ser universal, assim como a popularização do ícone que a representa. Mas não foi sempre assim. Apesar da proporção que tomou, sendo, talvez, a silhueta mais lembrada, o modelo anatômico repercute com força semelhante. Com ele fala-se também de amor como é, por outro lado, completa oposição. Está no cerne do realismo - como das dores mais viscerais - manifestadas, atualmente, pelo campo estético, com esse tipo de escopo, como órgão muscular.

Há poucos dias, fez a Gucci. A forma literal de coração ressurgiu no desfile de 100 anos da grife, uma das mais provocativas do mundo, dirigida pelo então sucessor do sucesso italiano, Guccio Gucci, Alessandro Michele. Inicialmente, o senhor Gucci, porteiro em um hotel chamado Savoy, por isso a "Savoy Club", escrita em uma versão azul da bolsa, pensou a marca como fabricante de malas. Um século após a ideia original, Michele, um amante da casa que ajuda a preservar seu DNA, retorna ao coração de onde tudo partiu, dando vida à it-bag, que não é mala, mas nem precisa, para dizer o recado. É onde mora a essência da maison, a memória e paixão de seu fundador, nos mínimos detalhes.

Esse pensamento, que dá direção ao valorizar local, e, literalmente, às paixões e inquietudes, algumas vezes, leva ao encontro de uma série de esculturas, com o mesmo motivo, ao menos na forma: de coração anatômico, novamente à cena, como escolha de arte. Quem a faz é a artista Azuhli. "A série se chama Empty Man, uma forma de dar forma ao meu coração tão frágil como um objeto de barro, mas tão lindo e sensível como o resultado final depois do processo de produção que envolve a queima e esmaltação", explica, indo além do processo técnico. A ligação com o coração era de verdade.

"Para a minha última exposição individual que aconteceu no MAUC (Museu de artes da UFC), resolvi criar uma instalação com nove corações que representasse cada namorada que eu tive", comenta a artista. "A ideia era brincar com a assimetria de cada um, visto que não existia um molde preexistente", segundo Azhuli, "tudo foi feito a mão, com as minhas mãos", revela, refletindo hoje. "Em tempos como esse, é raro ver alguém tirando um tempo para criar algo tão sensível como um coração para dividir com o mundo. Esses corações com cicatrizes em alto relevo falam das nossas experiências até agora, o tanto que sofremos ao perder pessoas queridas por uma doença que já existe vacina", lembra ao transversalizar sua linguagem, como também fizeram artistas que admira e usaram o coração como forma de expressão, Frida Kahlo e Adriana Varejão, por exemplo, por meio da arte.

 

"Perto do coração selvagem" (Edição comemorativa) por Clarice Lispector

Decifra-me ou te devoro

A obra da ucraniana, naturalizada brasileira, Clarice Lispector ganhou reedição em comemoração ao centenário da autora, marcado em dezembro de 2020, véspera da virada de década. O fator psicológico, característico da escritora de Clarice, é reforçado nesta publicação pela palavra "coração", presente em outros trabalhos, não só dela, mas da arte e literatura no geral. As emoções à solta e à flor sempre tiveram um lugar cativo, no curso das culturas ao longo do tempo.

Heart Cone Chair by Verner Panton - Design do final dos anos 1950
Heart Cone Chair by Verner Panton - Design do final dos anos 1950

Milimétrico e futurista

Nos relatos sobre a história da forma de coração - aquele que encontra no teclado de emojis -, aparece uma planta, "silphium", que servia para temperar alimentos, embora mais tarde também fosse usada como anticoncepcional. Também há registros sobre ter sido uma inspiração, 3000 a.C., baseada em hera ou folhas de figueira.

Olhar na cultura - Amuleto em forma de vaso cardíaco produzido pelos egípcios
Olhar na cultura - Amuleto em forma de vaso cardíaco produzido pelos egípcios

Olhar na cultura

A ideia de coração como símbolo precede a do ideograma visto em mensagens de texto via celular. O ícone de coração perfeito romântico, que até ganhou atalho (Alt pressionado a tecla 3) para ser reproduzido rápido e fácil no teclado do computador ou laptop, acumula uma série de explicações desde a sua existência. Em relatos de culturas antigas, como a egípcia, o coração remete a significados além. É a parte "que assegurava a manutenção da vida", relaciona estudo do Centro de História da Universidade de Lisboa, sobre o simbolismo dos amuletos cardíacos no Antigo Egito. Este da imagem, na representação de vaso, da época.

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