Um dia após a presidente da Câmara Municipal de Caucaia, Natécia Campos (PMB), ter sido afastada por 180 dias, os trabalhos legislativos na cidade foram retomados, ontem, sem o assunto entrar em pauta na tribuna da Casa durante a sessão.

No Centro de Caucaia, onde fica a Câmara, o dia transcorreu sem o acirramento inicialmente previsto e com a presença do público, que se apertou nas dependências da Casa para acompanhar a sessão.

Natécia, a mais votada vereadora na última eleição, com 6.037 votos, foi afastada após ter empossado neste ano, em duas ocasiões, o 1º suplente Helber Vieira (PL) - pela coligação PSC-PR. Ainda em 2016, ano da última disputa municipal, ele teve contas desaprovadas pela 37ª Zona Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE). A ação de improbidade administrativa foi protocolada pelo PSL de Caucaia, levada adiante pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) e acatada pela Justiça Eleitoral, em decisão proferida no último dia 2 pela juíza Maria Valdileny Sombra Franklin.

Num dos argumentos da decisão de 11 páginas, a magistrada, mais de uma vez, ressalta que Vieira não foi diplomado - impossibilitado, portanto, exercer o cargo. Segundo a decisão, ele deveria ter apresentado o documento antes de ter sido empossado. Ao O POVO, contrariando o veredito de Maria Valdileny, Helber Vieira sustenta que a decisão se apega a "mera formalidade."

Ele admite que não apresentou o diploma nas duas posses, que ocorreram neste ano. No entanto, com base em documentos encaminhados à reportagem, ele afirma que o processo que afastou Natécia é político, já que a próxima eleição para Mesa Diretora do Parlamento de Caucaia ocorre no próximo dia 26 e a vereadora afastada é, desde o início do ano, opositora do prefeito Naumi Amorim (PSD).

Ao O POVO, Vieira apresentou o próprio diploma, que o mostra como 1º suplente. Noutro documento, assinado por Natécia e endereçado à 37ª Zona Eleitoral, há uma consulta dela sobre quem deveria assumir o assento deixado pelo vereador Evandro Maracujá (PL) - quando Vieira foi empossado pela primeira vez.

Na resposta à pergunta, com o número do ofício citado no documento de Natércia - 40/2019 - o juiz Edison Ponte Bandeira de Melo anexa o resultado votação, mostrando Vieira na primeira posição entre os suplentes.

A presidência da Casa está com o vereador Mersinho (PSD), um dos homens de confiança de Naumi Amorim. Questionado se assumirá outra vez em caso de algum membro da coligação PSC-PL se licenciar, Vieira afirma que sim. Para ele, se for novamente empossado, "não tem nem perigo" de o mesmo processo ser instaurado contra Mersinho.

Durante a sessão de ontem, o novo presidente da Câmara não conversou com a imprensa. A 2ª vice-presidente, Emilia Pessoa (PSDB), que é opositora da atual gestão, afirma que os vereadores vieram a tomar conhecimento do processo envolvendo a presidente do parlamento e o 1º suplente muito recentemente.

Para a tucana, que é pré-candidata à Prefeitura do município, a autoria da ação ser do PSL é uma "coisa que precisaria ser esclarecida", já que a legenda não tem vereadores na Casa e, num primeiro momento, não teria interesse direto no assunto. "É fato, não é boato, que existiu uma negociação com o prefeito para que a Secretaria de Infraestrutura ficasse nas mãos do PSL." Ponderou, contudo, que é cedo para qualquer conclusão.

Na gestão municipal daquele município, a Secretaria da Infraestrutura acomoda duas indicações do partido. O titular da pasta é Eudes Costa e o subsecretário Júlio Rocha Aquino, este presidente da legenda em Caucaia.

Indagado sobre eventual relação entre a autoria da ação por improbidade administrativa contra a opositora de Naumi, Natécia, e a participação na gestão do prefeito, o deputado federal Heitor Freire (PSL), que preside o partido a nível estadual, alega que o pedido de afastamento surgiu da identificação de irregularidades cometidas pela presidente da Câmara Municipal de Caucaia.

"Essa iniciativa não tem qualquer relação com apoio ou aproximação política. Importante ressaltar que o PSL estadual dá autonomia para as comissões municipais fiscalizarem o que acharem pertinente no que diz respeito aos poderes legislativo e executivo de seus municípios", descartou.

Da base do prefeito, formada por cerca de 16 parlamentares, Enéas Goes (PTC) avalia que a irregularidade está clara. Segundo ele, não se trata de concordar ou não, já que o afastamento é negativo para a imagem da Câmara. "Mas, sou daquela política, se errou, tem que pagar." Pelo que está nos autos, ele diz, Natécia "errou". "Mas ela vai se defender sem dúvida."

Uma das oportunidades na qual Vieira foi empossado, a segunda, foi no lugar do correligionário Mickauê Franklin (PL). Entende a medida como totalmente absurda. Na linha do que Vieira apresentou ao O POVO, ele destaca que foi enviado um ofício pela presidente à 37ª Zona Eleitoral, questionando quem era o primeiro suplente. "Mandaram a relação, inclusive, grifando o nome do vereador Helber, como sendo o primeiro suplente a assumir."

A presidente da Câmara Municipal de Caucaia foi buscada por meio de ligação telefônica, por volta de 16 horas dessa terça-feira. Ela atendeu, mas disse estar ocupada, conversando com um advogado, assegurando que retornaria à ligação. Procurada novamente, não atendeu.