Candidato à Presidência da Câmara dos Deputados, o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) afirmou em entrevista ao O POVO que eventual abertura de processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) é um tema para o atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que segundo ele destaca "recebeu dezenas de pedidos e não deu andamento a nenhum deles."
O assunto da deposição do militar voltou a pautar o debate nas redes sociais em razão da postura do presidente no combate à pandemia, na maioria das vezes em desacordo com diretrizes divulgadas por órgãos de saúde e pela comunidade científica.
São exemplos disso o discurso contra o uso de máscaras, a oposição ao isolamento social e, mais recentemente, as falas contra a vacina elaborada pelo Instituto Butantan em parceria com a chinesa Sinovac.
"Caso eu seja eleito, o compromisso é tratar com independência e isenção qualquer assunto, levando sempre a decisão para o conjunto dos parlamentares da Casa", ele respondeu ao O POVO, via e-mail, sobre a questão. Ele tem como adversário na disputa Baleia Rossi (MDB-SP).
O emedebista é apoiado por Maia e por um conjunto de 11 partidos, entre os quais já é possível observar "deserções". O DEM, por exemplo, embora formalmente esteja no arco de Rossi, tem entre seus quadros parlamentares que já manifestaram preferência por Lira, apoiado por Bolsonaro.
Dos cinco deputados do DEM da Bahia, todos disseram que irão votar em Lira. Uma defecção foi registrada no PDT de Ciro Gomes, sigla que faz oposição a Bolsonaro. No PSDB também não há consenso pró-Baleia. Espera-se que esses movimentos de infidelidade sejam fiéis da balança, favorecendo a disputa para um dos lados.
"O bloco adversário não ouviu suas bases, tudo foi decidido nas cúpulas. Eu sou o candidato dos deputados e deputadas, vou terminar o mês de janeiro percorrendo todo o Brasil, ouvindo o que os parlamentares têm a dizer", afirmou Lira sobre a corrida à Presidência da Câmara.
E adicionou: "O candidato do Rodrigo Maia, enfatizo isso, pois o presidente atual fez questão de tutoriá-lo em todas as viagens e conversas, está fazendo uma campanha de cúpula de partidos. A situação se mostrou muito clara nesta semana com o PSL."
Houve disputa pelo antigo partido de Bolsonaro. A sigla que ostenta a segunda maior bancada da Câmara chegou a se somar à coalizão de Rossi, mas debate interno reverteu a situação, resultando em lista pró-Lira assinada pela maioria (19) da bancada de 36 deputados aptos.
O partido soma 53 parlamentares, mas 17 foram suspensos na esteira do racha entre o presidente e a legenda. Assim, Lira tem apoio oficial de 11 partidos: PL, PP, PSD, Podemos, Republicanos, PTB, Pros, PSC, Avante, Patriota e PSL. Baleia tem mesmo número de partidos no seu arco: MDB, PT, PSDB, DEM, PDT, SD, Cidadania, PV, PC do B, Rede e PSB.
Lira poupa Bolsonaro de críticas quanto à forma como o governo dele lidou com a pandemia da Covid-19. Nas palavras dele, "sabíamos muito pouco ou nada da Covid-19, no início do ano passado. Não é fácil tratar uma pandemia que afeta diretamente a economia."
Segundo o deputado, "devemos contribuir e não ficar presos às críticas ou mesmo vaidades políticas. A crise ainda não acabou. Temos o atendimento à saúde da população e, agora, iniciamos a vacinação, que tem que estar disponível para toda a população. Há um papel importante do Legislativo nesse apoio a fiscalização das ações."
Numa perspectiva lançada sobre os próximos meses, Lira considera a votação do Orçamento de 2021, em fevereiro, uma oportunidade de se verificar que tipo de ajuda pode ser dada aos que estão abaixo da linha da pobreza, se é ou não o caso de ampliar a duração do auxílio emergencial.
"Quase 20 milhões de brasileiros que nem faziam parte do Cadastro Único. Essa discussão tem que ser feita com responsabilidade. Cobramos isso há meses na Câmara e teremos essa oportunidade logo no início do ano, dando voz aos deputados e respeitando a decisão da maioria."
O POVO: Como têm sido as viagens pelo País e que resultados espera obter com as conversas que teve aqui no Ceará?
Arthur Lira: Eu tenho tido muita receptividade. Esses encontros com deputados, governadores e prefeitos são muito bons para conhecer de perto os problemas locais e as dificuldades das bancadas dos estados em terem suas demandas atendidas de maneira efetiva no Congresso Nacional. O objetivo é abrir caminho e consolidar o diálogo permanente com líderes, políticos e parlamentares locais para criar um ambiente favorável, que permita a eficiência na aprovação de projetos importantes para a agenda regional e estruturantes para o país. Essas bancadas têm que ter oportunidade na Câmara de fazer aparecer seu trabalho, a sua atuação, a defesa dos temas de suas localidades. Isso nos foi tirado. Não há muito tempo, mas nos últimos dois anos. Queremos trazer mudanças para a Câmara. A primeira é dar voz a todos. Vamos respeitar a proporcionalidade e discutir, com produtividade, diversos temas que estão parados no Brasil.
OP: O senhor afirmou no Twitter que há pressão de governadores e repressão de cúpulas partidárias. O senhor teve algum tipo de diálogo com o governador do Ceará Camilo Santana sobre esse tema?
Lira: Nós tivemos nas viagens ótimos encontros no Nordeste, quando pudemos discutir temas amplos e necessidades para a região. Sou daqui, sei da importância e potencial contribuição que as bancadas podem dar à Câmara dos Deputados e nós vamos tratar com muita harmonia a relação com outros poderes
OP: Baleia Rossi liderava o bloco em legendas e deputados dentro dos partidos. Como está esse cenário hoje na sua avaliação?
Lira: Até sexta-feira (último dia 22), só havia um bloco formalizado na Câmara, o nosso. O restante é bloco formado por opinião de dirigente de partido. Recebo muitas declarações de incômodos sobre como o processo de adesão ao outro bloco foi construído sem ouvir suas bases. O bloco adversário não ouviu suas bases, tudo foi decidido nas cúpulas. Eu sou o candidato dos deputados e deputadas, vou terminar o mês de janeiro percorrendo todo o Brasil, ouvindo o que os parlamentares têm a dizer. O candidato do Rodrigo Maia, enfatizo isso, pois o presidente atual fez questão de tutoriá-lo em todas as viagens e conversas, está fazendo uma campanha de cúpula de partidos. A situação se mostrou muito clara nesta semana com o PSL. A vontade dos parlamentares levou o partido para o nosso bloco. A eleição para presidente da Câmara é uma eleição interna, que impacta principalmente na maneira do gestor conduzir a Casa. Eu tenho mais de 10 anos no plenário da Câmara dos Deputados com a mesma postura: cumprindo meus compromissos, honrando minha palavra, aceitando e respeitando a decisão construída internamente entre os parlamentares. A minha principal proposta de gestão é o diálogo amplo.
OP: Como o senhor projeta a relação com o governo Bolsonaro?
Lira: Na minha gestão, a Câmara jamais será puxadinho de qualquer outro Poder. Autonomia é princípio básico, o plenário é soberano e não se sujeitaria a essa interferência. A pauta é interna e será avaliada pelo colégio de líderes, com previsibilidade, transparência e respeitando a decisão da maioria dos representantes dos parlamentares. Mas é preciso ser a favor do Brasil – pautando tudo que for necessário, independente de lado – e discutindo o que está errado para que seja modificado ou mesmo rejeitado pelos deputados e deputadas. Qualquer um que sente naquela cadeira tem a obrigação de trabalhar pela altivez e independência da Câmara, em harmonia com os outros poderes. Não é como este ou aquele governo. Os partidos de centro, no qual estou inserido, tem essa atitude ao longo da história. O mesmo aconteceu com Lula, Dilma e Temer. Estão para auxiliar em temas importantes para o Brasil.
OP: Na campanha do seu adversário, a palavra mote é independência. O senhor consegue garantir o mesmo, próximo que é do presidente?
Lira: Acho curioso pregar independência e sair vendendo e travando a pauta da Câmara em troca de apoio, como está sendo feito. O que está sendo prometido, na verdade, é a paralisia da Câmara. Todos falam em independência, mas temos que ver qual a interpretação que está sendo dada para essa palavra. Eu considero que a Câmara somente será independente de fato se pudermos discutir abertamente todos os temas e pautas. A nossa proposta está baseada na previsibilidade, com reuniões todas as quintas-feiras com o colégio de líderes para sabermos o que vai ser votado na semana seguinte. Na proporcionalidade, o que significa respeitar o tamanho dos partidos nas atribuições internas, o que representa a voz da população que elegeu aqueles parlamentares. No compromisso com os acordos e no diálogo permanente, sem engavetar temas conforme o sabor do meu humor, como tem sido feito. Independência é permitir uma participação ativa de todos os deputados, das menores bancadas e minorias. Temos espaço para isso e assim conseguiremos dar eficiência às votações da Câmara.
OP: Como avalia a condução da crise da Covid-19 pelo governo Bolsonaro?
Lira: Nós sabíamos muito pouco ou nada da Covid-19, no início do ano passado. Não é fácil tratar uma pandemia que afeta diretamente a economia. São extremos que andaram juntos: as vidas perdidas pela doença e as consequências da epidemia que afetaram diretamente a vulnerabilidade social de milhares de pessoas. Hoje, todo esse aprendizado nos deu mais conhecimento e podemos contribuir com as soluções. Houve muita responsabilidade envolvida dos governos federais, estaduais e municipais e dos deputados e senadores. São ações e contrapesos do mesmo problema. A minha visão é que devemos contribuir e não ficar presos às críticas ou mesmo vaidades políticas. A crise ainda não acabou. Temos o atendimento à saúde da população e, agora, iniciarmos a vacinação, que tem que estar disponível para toda a população. Há um papel importante do Legislativo nesse apoio a fiscalização das ações.
OP: Como o deputado Arthur Lira enxerga as discussões sobre impeachment do presidente Jair Bolsonaro?
Lira: Tenho repetido sempre que impeachment não é assunto de candidato a presidência da Câmara. Esse é um tema de responsabilidade do presidente Rodrigo Maia, e não quero usurpar nem um dia do mandato dele, que recebeu dezenas de pedidos e não deu andamento a nenhum deles. Caso eu seja eleito, o compromisso é tratar com independência e isenção qualquer assunto, levando sempre a decisão para o conjunto dos parlamentares da Casa.
OP: O senhor defende a continuidade do auxílio emergencial? Pretende colocar em pauta o tema?
Lira: Como políticos, nosso dever é definir como aplicar melhor o recurso disponível, em um espaço de diálogo. Nós vamos ter que votar o orçamento de 2021 agora em fevereiro. Esse será o momento de ver como podemos apoiar nossos irmãos que estão abaixo da linha da pobreza. Quase 20 milhões de brasileiros que nem faziam parte do Cadastro Único. Essa discussão tem que ser feita com responsabilidade. Cobramos isso há meses na Câmara e teremos essa oportunidade logo no início do ano, dando voz aos deputados e respeitando a decisão da maioria.
OP: Numa perspectiva de vitória, qual é a prioridade número 1 da sua gestão?
Lira: O primeiro assunto que estará à mesa para o Legislativo é o orçamento. Ele não foi aprovado no ano passado e deve iniciar os trabalhos do Congresso. Será preciso instalar a Comissão Mista do Orçamento, que vai nos dar as diretrizes de como aplicar os recursos ao longo de 2021, quando precisaremos apoiar os afetados pelo coronavírus e olhar para a retomada do crescimento do Brasil. Como sugestão, o colégio de líderes, na sequência, deveria analisar a PEC Emergencial, pois também é um problema orçamentário. Avançar logo sobre essa pauta ajudará a olharmos com maior cuidado e atenção as despesas da União, estados e municípios. Sobre os demais assuntos, tudo o que estiver maduro para votação e for uma decisão da maioria do colégio de líderes será levado para votação. Há temas como a reforma tributária, que aguarda há dois anos um relatório, e a reforma administrativa, na qual precisamos avaliar os diretos adquiridos e a oferta de serviços à população. São assuntos que podemos analisar ainda no primeiro semestre.