Com apreensão de aparelho celular e até ameaça de prisão, a CPI da Covid teve nesta quinta-feira, 1º, uma de suas mais tumultuadas sessões de depoimento, marcada pelo surgimento de mais dúvidas que respostas sobre investigações em curso.
Autor de denúncia que aponta cobrança de propinas sobre a compra de vacinas contra a Covid, o policial militar Luiz Paulo Dominguetti Pereira tentou implicar em depoimento o deputado Luis Miranda (DEM-DF) - que denuncia o governo Bolsonaro em outra acusação alvo da CPI, envolvendo supostas fraudes na compra em R$ 1,6 bilhão da vacina Covaxin.
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Segundo Dominguetti, Miranda procurou a Davati Medical Supply, empresa que negociava a compra da vacina AstraZeneca com o governo, para tentar intermediar o acordo. Durante a inquirição de ontem, que durou mais de sete horas, o policial chegou até a mostrar áudio de uma negociação com a voz do deputado. A palavra "vacina", no entanto, não é mencionada.
Logo após a divulgação do áudio, o próprio Miranda foi ao Senado e pediu a prisão do depoente. Segundo ele, a gravação teria ocorrido em outubro de 2020 e tratava da compra não de vacinas, mas sim de luvas. O negócio seria intermediado por uma empresa do deputado nos Estados Unidos e visaria a comercialização de luvas no Exterior.
Depois de longo bate-boca sobre a acusação, senadores determinaram a apreensão do celular do depoente, que foi acusado de ser uma "testemunha plantada" com o objetivo de descredibilizar acusações de Miranda no caso Covaxin.
"Com todo respeito, essa testemunha foi plantada aqui. Ela foi plantada. Ela está em estado flagrancial do artigo 342", disse o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que pedia a prisão do depoente.
O próprio Luis Miranda reforçou a tese: "Ele [Dominguetti] blefou e, para o azar dele, eu tenho toda a conversa aqui. Eu nunca tratei de vacina com eles", disse. "Precisamos saber quem plantou esse senhor aqui para mentir. Ele é um cavalo de troia. Se não prendemos ele, será uma vergonha. Confio nos senadores para que não passemos em branco".
No centro da polêmica, estão duas acusações diferentes de corrupção na compra de vacinas pelo governo Bolsonaro. A primeira, denunciada por Miranda na semana passada, aponta que o irmão do deputado, o servidor concursado da Saúde Luis Ricardo Miranda, teria sido pressionado para aprovar contrato em R$ 1,6 bilhão para a compra da Covaxin - em negociação que estaria, segundo ele, repleta de indícios de fraude.
Miranda diz ainda que comunicou as pressões pessoalmente ao presidente, que teria relacionado o caso ao líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e prometido acionar a Polícia Federal sobre o caso. Até agora, no entanto, não há nenhuma informação de qualquer ação de Bolsonaro para iniciar uma investigação sobre a denúncia.
A segunda acusação contra o governo Bolsonaro remete a reportagem publicada pelo jornal Folha de São Paulo na noite da última terça-feira, 29. Em entrevista, Dominguetti disse ter recebido pedido de propina de US$ 1 por dose em uma negociação entre a Davati e o Governo Federal para a compra de 400 milhões de doses da Astrazeneca.
Ainda segundo o que o policial militar disse à Folha, o pedido de propina teria sido feito por Roberto Ferreira Dias, diretor de Logística do Ministério da Saúde, em um jantar realizado em Brasília no dia 25 de fevereiro. Também teria participado da reunião o tenente-coronel de Exército Marcelo Blanco, ex-assessor de Dias na Logística da pasta.
Planos
Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), "síntese" da sessão de ontem foi a "confirmação por parte do depoente da existência de achacamento de propina no valor de um dólar"