Sob crescente pressão desde a revelação de que possuem empresas em paraísos fiscais, o ministro Paulo Guedes (Economia) e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, terão que se explicar sobre o assunto ao Congresso Nacional. Na tarde de ontem, tanto a Câmara quanto o Senado aprovaram requerimentos cobrando a vinda dos dois às Casas.
Na Câmara dos Deputados, foi aprovada pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público uma convocação de Guedes para esclarecimentos sobre suas movimentações financeiras no exterior. Como se trata de uma convocação, a presença do ministro, que ainda terá data definida pelos deputados, será obrigatória.
A convocação foi proposta em requerimento dos deputados Kim Kataguiri (DEM-SP) e Paulo Ramos (PDT-RJ). Na justificativa do pedido, Kataguiri destacou "indícios fortes" de conflito de interesses e desrespeito de Guedes ao Código de Conduta da Alta Administração Federal. "O ministro deve explicações à sociedade", disse.
Já no Senado Federal, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) aprovou um convite - que pode, portanto, ser recusado - tanto para Guedes quanto para Campos Neto para falarem sobre o assunto. Caso os dois concordem com as audiências, eles serão questionados pelos integrantes da comissão em 19 de outubro.
Apesar de não ser obrigatória, a presença dos dois já foi confirmada pelo líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra (MDB-PE). O convite foi apresentado por Alessandro Vieira (Cidadania-SE) que questionou aplicações milionárias de Guedes e o papel do ministro no controle da política de câmbio nacional.
Segundo dados de um consórcio internacional de jornalistas publicados no Brasil pela revista piauí, Guedes é dono da Dreadnoughts, empresa com sede nas Ilhas Virgens Britânicas que permanece ativa mesmo após janeiro de 2019, quando o ministro assumiu a Economia. Campos Neto afirma ter fechado a Cor Assets, empresa sediada no Panamá, em 2020, 15 meses depois de assumir o BC. As companhias operavam em paraísos fiscais.
As informações fazem parte de uma apuração conjunta tocada por diversos órgãos de imprensa de todo o mundo, que analisaram um megavazamento de documentos de grandes executivos e líderes mundiais. Batizada de Pandora Papers, a investigação inclui desde Paulo Guedes até membros da alta cúpula do governo russo de Vladimir Putin.
Na última segunda-feira, o procurador-geral da República, Augusto Aras, determinou a abertura de um procedimento de investigação preliminar para apurar possível conflito de interesse no caso. O procedimento é uma "notícia de fato", uma espécie de pré-inquérito que pode levar à abertura de uma investigação contra os dois dirigentes.
Ao longo do dia de ontem, diversas entidades se manifestaram cobrando investigações do caso. A Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), por exemplo, lançou nota afirmando que as offshores de Guedes e Campos Neto "denotam conflito de interesse, ferem a moralidade pública e tornam escandalosa a permanência de ambos no governo".
"Guedes e Campos Neto lucraram no exterior com dólar alto enquanto a situação econômica do País se degrada", continua. "Se guardassem algum vestígio ético, ambos deveriam deixar imediatamente as funções públicas que exercem", diz a entidade, que reúne 32 sindicatos e mais de 37 mil servidores públicos da área de fiscalização tributária.