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Fake news e disparos em massa na eleição poderão render multa, prisão e cassação
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Fake news e disparos em massa na eleição poderão render multa, prisão e cassação

| TSE | Novos entendimentos e o aprendizado com eleições passadas criam conjunto de normas que tenta impedir interferências capazes de manipular o resultado das eleições. Mas, é difícil se antecipar à criatividade do submundo digital
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TSE - Tribunal Superior Eleitoral
Urna eletrônica (Foto: Antonio Augusto/Ascom/TSE)
Foto: Antonio Augusto/Ascom/TSE TSE - Tribunal Superior Eleitoral Urna eletrônica

Uma corrida é travada, de um lado, pelas autoridades que organizam e fiscalizam as eleições. Do outro, equipes digitais envolvidas com as candidaturas. Enquanto essas últimas avançam em tecnologias, canais e métodos para influenciar as campanhas, a Justiça Eleitoral e o Ministério Público buscam meios para acompanhar as transformações e separar o que é lícito daquilo que distorce o processo democrático. Para as próximas eleições, a esperança é de que os preparativos evitem que a proliferação de conteúdos falsos e os disparos de mensagem em massa alcancem a mesma proporção de quatro anos atrás. As punições previstas incluem multa de R$ 5 mil a R$ 30 mil, prisão e pode chegar à cassação da candidatura.

"Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado. E as pessoas irão para a cadeia por atentar contra as eleições e a democracia no Brasil", disse em outubro o ministro Alexandre de Moraes, que assume este ano a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele se manifestou durante o julgamento que rejeitou por unanimidade o pedido de cassação da chapa Jair Bolsonaro-Hamilton Mourão.

"O lapso temporal pode ser impeditivo de uma condenação, mas não é impeditivo da absorção, pela Justiça Eleitoral, do modus operandi que foi realizado, e que vai ser combatido nas eleições 2022", afirmou ele na ocasião sobre não punir o que houve no passado, mas sinalizar outra postura de agora em diante.

O presidente do Comitê de Enfrentamento à Desinformação e Divulgação da Segurança do Processo Eleitoral no Ceará, Rommel Moreira Conrado, aponta que a difusão de informações falsas pode custar o mandato de quem pratica. "Se a conduta for suficientemente grave pode ocorrer, inclusive, a cassação", apontou o juiz auxiliar da presidência do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE).

Conrado cita como exemplo julgamento ocorrido em 28 de outubro, mesmo dia da manifestação de Alexandre de Moraes, citada há dois parágrafos. Naquela data, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato do deputado estadual do Paraná delegado Fernando Francischini (PSL). Delegado Francischini havia sido o deputado mais votado da história do Paraná, com 427.749 votos. Ele ficará inelegível por oito anos.

"Ele foi cassado por abuso de poder econômico, que é uma figura relativamente ampla. Ele fez postagem nas vésperas da eleição falando que as urnas eletrônicas não eram seguras e estariam programadas para fraudar a eleição presidencial", explicou o procurador regional eleitoral do Ceará, Samuel Arruda, sobre o caso de Francischini. "Essa postagem teve uma repercussão enorme. O TSE considerou isso elemento caracterizados do abuso."

O procurador considera que essa decisão foi um recado aos candidatos. "O que o político mais tem medo é de perder o mandato. Ele foi cassado e ficou inelegível oito anos."

A resolução nº 23.671 do TSE, de 14 de dezembro de 2021, estabelece critérios e punições sobre as chamadas fake news, milícias virtuais, telemarketing, disparos em massa, publicações com identidade falsa e mesmo apresentações artísticas presenciais ou virtuais.

Rommel Conrado considera que a maior dificuldade para quem organiza e fiscaliza a eleição está nas próprias plataformas. "Notadamente a criptografia de ponta a ponta, o que muitas vezes obsta uma quebra de sigilo telemático." Outra dificuldade é o grande volume de dados transmitido pelos aplicativos. O juiz aponta que têm sido feitas parcerias com empresas como Twitter, Facebook e Google, que possuem meios de detectar o envio em massa de mensagens e têm possibilidade de impedir preventivamente.

Samuel Arruda salienta que o envio massivo de mensagens já estava proibido há algum tempo. "O disparo em massa já vem criminalizado, quando tem aquela coisa organizada, contratação de grupos de pessoas para fazer comentários ofensivos. É a milícia virtual. Na época em que o crime foi previsto, a coisa nem estava tão organizada."

Embora ressalte a bagagem já acumulada e o arcabouço normativo construído, o procurador regional eleitoral do Ceará reconhece a dificuldade que é se antecipar às estratégias que podem surgir. "É muito difícil a gente se antecipar. Sempre temos posição mais reativa. A gente não sabe o que estão tramando, o que vão usar. Depois que a gente ocorre a gente diz: ocorreu dessa maneira."

A fiscalização dos crimes eleitorais é sempre desafiadora, porque é pulverizada. Samuel Arruda salienta, nesse sentido, a importância das denúncias que partem da população. "A gente conta com a fiscalização do próprio eleitor. Se há postagem ofensiva, ou descabida, ou inverídica, o próprio eleitor traz pra gente. A gente conta com esse controle social."

 

Saiba mais

Ainda neste semestre, o TRE-CE publicará resolução sobre propaganda e poder de polícia no Estado para as eleições 2022. O documento replicará a previsão do TSE sobre o combate à desin- formação. E destinará um juízo especifico para cuidar da propaganda na internet.

 

Equilíbrio entre fiscalizações e liberdades nas eleições

Tanto o presidente do Comitê de Enfrentamento à Desinformação e Divulgação da Segurança do Processo Eleitoral no Ceará, Rommel Moreira Conrado, quanto o procurador regional eleitoral do Ceará, Samuel Arruda, salientam que disseminar conteúdos falsos nas eleições não é novidade. "Nas eleições, em qualquer época, sempre existiram 'fake news', 'desinformação', ainda que chamados por outros nomes como mentiras ou fofocas.... A internet e as redes sociais apenas propiciaram um alcance maior e mais rápido para a propagação das notícias falsas", disse Conrado. Arruda reforça que a diferença é de fato a dimensão alcançada. "Com pouca gente se faz um estrago grande."

O procurador aponta que há certa cautela em agir, porque o princípio norteador é a liberdade de expressão. Há cuidados até pelo histórico de ditadura no Brasil. "A Justiça tem dificuldade de agir com força, mas isso vem tomando uma proporção que eu acho que precisa dessa ação. Nessa eleição, acho que vai ser necessária uma ação mais severa. E a gente está vendo que isso está acontecendo."

Arruda reconhece o temor de que haja intervenção muito grande, a ponto de coibir a manifestação do eleitor. "É um tema sensível. Tenho um pouco de medo de uma hiperjudicialização de tudo isso e acabar com o juiz sendo chamado a exercer um papel de censor. Justiça eleitoral não tem nem estrutura para entrar nesse varejo da expressão individual de cada um."

É diferente, ele pondera, dos disparos em massa e da difusão organizada de conteúdos falsos, esses já tipificados. Ele se preocupa com iniciativas como o chamado inquérito das fake news. "É uma coisa que eu acho um pouco complicada. É um ministro individualmente, e não tem um objeto assim muito claro. Me preocupa em termos até do devido processo legal." E reflete sobre a causa: "Parece reação do Supremo a uma coisa que estava sem controle." (EF)

 

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