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Conheça a primeira mesária totalmente cega do Ceará
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Conheça a primeira mesária totalmente cega do Ceará

A servidora pública Alana Larisse foi a primeira pessoa totalmente cega a ser mesária nas eleições no Ceará
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FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 27-10-2022: Dois dedos de prosa com Alanne Larisse, primeira mesária totalmente cega do Ceará. (Foto: Samuel Setubal/ Especial para O Povo) (Foto: Samuel Setubal/Especial para O Povo)
Foto: Samuel Setubal/Especial para O Povo FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 27-10-2022: Dois dedos de prosa com Alanne Larisse, primeira mesária totalmente cega do Ceará. (Foto: Samuel Setubal/ Especial para O Povo)

Mãe, esposa, bacharel em Direito e servidora pública, Alanna Larisse já desempenhou diversas atividades, mas, em 2022, foi a primeira vez, em seus 31 anos, que ela foi mesária nas eleições. Sua participação ficou marcada também como a primeira vez que uma pessoa com deficiência visual total atuou como mesária no Ceará.

A servidora foi convocada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) para atuar na seção 795 no Colégio CEI São Carlos, no bairro Quintino Cunha. Ela conta que já tinha pensando em se inscrever voluntariamente e tinha curiosidade se seria possível.

Com o chamado, que ela acreditou só quando chegou o documento oficial da Justiça Eleitoral, foi uma grata surpresa que se tornou mais um experiência de sua caminhada por autonomia. 

O POVO - Ser uma mulher cega te impediu de alguma forma de fazer algo?

Alana Larisse - A cegueira acaba sim influenciando na forma como vivemos. Não há como trabalhar com uma realidade que negue esse contexto. Podemos sim fazer quase tudo, às vezes de uma forma diferente, mas nunca será como se nós enxergássemos. Acredito que o processo de identificação como pessoa com alguma deficiência tem como premissa o reconhecimento pelo indivíduo de que ele tem limitações, do contrário ele está fadado a se frustrar ou frustrar aos que vivem no seu entorno, ou de sucumbir e ser atropelado pela realidade de que o céu não é o limite. Considerando esses aspectos e, talvez por ser cega desde 1 ano e meio de idade, eu fui educada para sonhar e lutar para realizar tudo que me fosse possível. Assim sendo, estudei em escola especial e no ensino regular praticamente dentro da faixa etária padrão, fiz faculdade de Direito, especialização, passei no concurso da Unilab e em seguida no concurso da UFC, onde trabalho até a presente data. Tive uma filha, casei, conquistei uma autonomia satisfatória no tocante à mobilidade. Assim, entendo que a cegueira nunca me impediu de conquistar o que tenho e sou hoje, embora ela tenha influenciado de alguma forma na minha caminhada.

OP - Como foi sua reação em ser chamada para ser mesária?

Alana - Fiquei bastante surpresa, especialmente porque não havia me cadastrado. Pra ser sincera, fiquei até achando que era algum tipo de trote. Só me convenci quando recebi o PDF com a convocação.

OP - Você tinha o desejo de participar desse momento das eleições?

Alana - Eu já havia pensado sobre e tinha curiosidade de saber se daria certo, até porque todos os meus colegas de trabalho sempre trabalhavam nas eleições, em diversas funções e eu ficava tentada a me inscrever e participar também.

OP - Foi preciso alguma adaptação no sistema do TRE ou na sala para que você fosse mesária?

Alana - O único ajuste que precisamos fazer foi a disponibilização dos cadernos físicos de votação da seção em que ficaria em arquivos digitais. Foram criados dois arquivos nos formatos pdf e txt, o que possibilitaria que eu tivesse acesso ao conteúdo da versão física que seria entregue ao restante da equipe. Dessa forma, tive acesso ao nome e número dos títulos dos eleitores que votariam na seção em que eu trabalharia. No mais, participei do treinamento geral de mesários, onde recebi todas as orientações e informações transmitidas a todos os que trabalhariam nas eleições de 2022.

OP - Quais foram as funções que você desempenhou no dia da eleição?

Alana - Eu era a segunda mesária e fiquei incumbida de procurar na lista digital a pessoa que chegava para votar. Após identificá-la, eu ditava o número do título do eleitor (para o presidente) e sua sequência no caderno de votação (para que o outro mesário localizasse o eleitor no caderno físico. Assim, enquanto o presidente da seção liberava o eleitor para acesso à cabine de votação, o outro mesário já ia verificando se o eleitor que estava votando já tinha biometria cadastrada ou se precisaria assinar o caderno. Dessa forma, conseguimos definir uma dinâmica de atendimento bastante sincronizada e o fluxo de votação se desenvolveu normalmente.

OP - Como foi sua relação com os eleitores no dia da eleição?

Alana - Tudo fluiu naturalmente. Não senti neles nenhum tipo de estranhamento ou desconfiança. Foi tudo tão rápido e dinâmico que nem sei se todos realmente perceberam que eu não enxergava, já que o programa de voz estava ativo somente no fone e eu estava sentada juntamente com um dos mesários e o presidente da seção. 

OP - Pretende ser mesária em outras eleições?

Alana - Sim, estarei atuando na mesma seção do 1º turno, provavelmente com a mesma equipe. Espero que essa seja a primeira de muitas outras eleições em que poderei participar como eleitora e de forma mais ativa no processo eleitoral, exercendo alguma função que me permita contribuir efetivamente de alguma forma.

#PraTodoMundoVer

O título aparece em fundo preto com letras brancas. A entrevista está em uma fundo branco com letras cinzas. Fotografia retangular registrada na sala de uma casa. Na imagem, aparece a mesária Alanna Larisse em frente a uma parede de cor verde. Ela tem cabelos pretos e lisos. Alanna usa um vestido laranja com estampa de poá com círculos brancos. Ela tem as mãos sobre sua guia de cor preta e rosa.

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