Após passar 44 horas e 29 minutos em silêncio, o presidente Jair Bolsonaro (PL) fez ontem o primeiro pronunciamento sobre o resultado eleitoral. Na curta fala, de dois minutos e 21 segundos, ele prometeu respeitar as regras da Constituição. Apesar de não reconhecer explicitamente a derrota, Bolsonaro abriu caminho para o início do processo de transição.
O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, disse, depois do rápido pronunciamento do presidente, que, a partir de agora, o governo está pronto para o começo das conversas com a equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Nas poucas frases que disse, sem direito a perguntas no Palácio da Alvorada, Bolsonaro chamou de "movimentos populares" as manifestações organizadas nos últimas dois dias por apoiadores mais radicais que defendem intervenção militar por causa da vitória do candidato petista. O presidente indicou apoiar protestos, desde que não haja bloqueios das rodovias.
"Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral. As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir", disse.
Numa tarde chuvosa no Alvorada, residência oficial que a família Bolsonaro terá de deixar até o dia 31 de dezembro, o presidente agradeceu pelos 58 milhões de votos que recebeu no segundo turno e exaltou o que chamou de surgimento "de verdade" da direita no cenário político.
"Nossa robusta representação no Congresso mostra a força dos nossos valores." Bolsonaro sustentou que, "enquanto presidente da República e cidadão", continuará "cumprindo todos os mandamentos da nossa Constituição".
Encerrado o pronunciamento, foi a vez de Ciro Nogueira afastar qualquer dúvida sobre o destino político do País. "O presidente Jair Messias Bolsonaro autorizou a, quando formos provocados, com base na lei, nós iniciarmos o processo de transição" disse o ministro.
"A presidente do PT (Gleisi Hoffmann), segundo ela, em nome do presidente Lula, disse que na quinta-feira será formalizado o nome do vice-presidente Geraldo Alckmin. Aguardaremos que isso seja formalizado para cumprir a lei do nosso país."
O discurso abreviado de Bolsonaro não foi resultado de inspiração pessoal ou improvisos de última hora. Ele foi pressionado pelo Centrão e também por militares a não esticar a crise e dar o resultado da eleição como caso encerrado. A cúpula das Forças Armadas já havia decidido que "quem ganhar leva", sem embarcar no discurso de contestação do resultado.
Nas últimas horas, ministros e oficiais fizeram chegar ao presidente o risco de a situação do País se agravar com os bloqueios que chegaram a paralisar rodovias em 400 diferentes locais e de ele ser acusado de crime de responsabilidade por omissão.
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmou que diversos aliados participaram da construção da nota lida pelo presidente. O texto vinha sendo trabalhado desde ontem. Ciro Nogueira, Fábio Faria (Comunicações) e Célio Faria Júnior (Secretaria de Governo da Presidência) contribuíram para o texto
"Acho que está o suficiente para acalmar aqueles que estavam ansiosos pelo seu silêncio. O grande objetivo é esse. O presidente falou, autorizou a transição, vida que segue. Daqui a quatro anos tem eleição de novo", disse Barros.
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também vinham conversando com Bolsonaro sobre a necessidade de acelerar o reconhecimento do resultado das eleições. Mas recusaram um convite para conversar com ele na manhã de ontem. Só aceitariam o encontro após o presidente da República se pronunciar publicamente.
Tão logo Bolsonaro fez seu discurso, o tribunal tratou de emitir uma nota para dizer que reconhece a "importância do pronunciamento". Destacou o fato de o presidente ter falado em "garantir o direito de ir e vir em relação aos bloqueios e, ao determinar o início da transição, reconhecer o resultado final das eleições".
Ato contínuo, Bolsonaro seguiu para o STF acompanhado do ministro da Economia, Paulo Guedes. Eles se reuniram com sete dos 11 ministros da Corte por mais de uma hora.
Segundo o ministro Edson Fachin, Bolsonaro disse que considera o tema resultado das eleições encerrado. "O presidente da República usou o verbo acabar no passado. Acabou. Portanto, olhar para a frente", afirmou o ministro.
Duas horas após a primeira nota, o STF divulgou uma segunda manifestação em que os ministros reiteraram "a importância do reconhecimento pelo presidente da República do resultado final das eleições". A nota diz que todos destacaram a importância "da paz e da harmonia para o bem do Brasil".
As quase 45 horas do silêncio de Bolsonaro foram marcadas por queixas, xingamentos e inconformismo por parte do presidente e também por muitas negociações. Inconformado com a derrota no domingo e alegando perseguição do Judiciário para favorecer Lula, Bolsonaro se recusou várias vezes a desestimular as manifestações.
Aos interlocutores com quem conversou antes, ele disse que era vítima de "perseguição" por parte do Supremo e do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes.
Bolsonaro chegou a chamar mais de uma vez Moraes de "canalha", de acordo com relatos de três interlocutores. Ontem, o ministro estava presente na reunião do presidente no STF numa tentativa de apaziguar os ânimos.
Bolsonaro diz que atos em rodovias são "fruto de indignação", mas critica bloqueios
Ao romper o silêncio de quase dois dias desde que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) confirmou o resultado das eleições 2022, Jair Bolsonaro (PL) avaliou que os movimentos golpistas de seus apoiadores no bloqueio de estradas "são fruto de indignação". No entanto, o chefe do Planalto criticou as ações praticados por seus seguidores que seguissem "métodos de esquerda".
"Os atuais movimentos populares são frutos de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral. As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades", disse o presidente, durante pronunciamento breve no Palácio do Planalto.
Na última segunda-feira, 31 de outubro, grupos golpistas realizaram o bloqueio de várias rodovias pelo Brasil. Os atos contestam o resultado da eleição, que deu vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Ontem, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, autorizou o uso das policias militares na desobstrução das rodovias estaduais e federais. O magistrado também autorizou a corporação a identificar os caminhões utilizados no bloqueio das estradas e aplicar multa de R$ 100 mil por hora e prisão em flagrante.
Também nessa terça-feira, representantes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) realizaram uma coletiva de imprensa para negar a omissão contra os atos realizados. Segundo o diretor de operações, Inspetor Djairlon, a corporação montou um gabinete de crise para agir rapidamente contra as ocupações de rodovias.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) condenou os bloqueios realizados em rodovias pelo Brasil por grupos golpistas após a derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno. Para o órgão, as ações em estradas são "inaceitáveis".
"Vão sentir saudades da gente", diz Bolsonaro antes de iniciar pronunciamento
Antes de iniciar a leitura do primeiro pronunciamento após a proclamação do resultado das eleições, nesta terça-feira, 1º de novembro, o presidente Jair Bolsonaro (PL) comentou com o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira. "Vão sentir saudades da gente", cochichou com o aliado.
O presidente, no entanto, não especifica a quem a mensagem se destina. A declaração informal, em clima de despedida, foi dita logo após o presidente chegar ao saguão do Palácio da Alvorada para conversar com a imprensa.
Em fala breve, de dois minutos, Bolsonaro agradeceu a votação recebida no segundo turno das eleições e disse que seguirá cumprindo a Constituição. Quebrando uma tradição de regimes democráticos, o atual mandatário evitou cumprimentar o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Sobre os protestos de grupos golpistas em rodovias federais, Bolsonaro declarou que "manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas", mas condenou "destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir", atos classificados por ele como "métodos da esquerda".
Sem fazer críticas diretas a instituições, o presidente disse que continuará cumprindo "os mandamentos da Constituição" e acenou aos seus eleitores: "Os nossos sonhos seguem mais vivos do que nunca".
Quero começar agradecendo aos 58 milhões de brasileiros que votaram em mim no último dia 30 de outubro. Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral.
As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir.
A direita surgiu de verdade em nosso País. Nossa robusta representação no Congresso mostra a força dos nossos valores: Deus, Pátria, família e liberdade. Formamos diversas lideranças pelo Brasil. Os nossos sonhos seguem mais vivos do que nunca. Somos pela ordem e pelo progresso.
Mesmo enfrentando todo o sistema, superamos uma pandemia e as consequências de uma guerra.
Sempre fui rotulado como antidemocrático e, ao contrário dos meus acusadores, sempre joguei dentro das quatro linhas da Constituição. Nunca falei em controlar ou censurar a mídia e as redes sociais.
Enquanto presidente da República e cidadão, continuarei cumprindo todos os mandamentos da nossa Constituição. É uma honra ser o líder de milhões de brasileiros que, como eu, defendem a liberdade econômica, a liberdade religiosa, a liberdade de opinião, a honestidade e as cores verde e amarela da nossa bandeira. Muito obrigado.
Mourão: 'Tenho quase certeza de que o Presidente vai passar faixa (presidencial)'
O vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos), e agora senador eleito pelo Rio Grande do Sul, avaliou ontem que o presidente Jair Bolsonaro (PL) reconheceu "implicitamente" a derrota para o petista Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições ao agradecer pelos votos recebidos no segundo turno.
Em pronunciamento no Palácio da Alvorada ontem, o chefe do Executivo disse que cumprirá a Constituição, mas não mencionou a vitória de Lula.
Mourão disse que considerou o pronunciamento de Bolsonaro "muito bom, excelente" e confirmou que não foi convidado para estar ao lado do chefe no Executivo, que deu as declarações no Alvorada acompanhado por ministros do governo.
"Implicitamente, quando ele agradece os votos, ele reconhece a vitória de Lula", afirmou o vice-presidente a jornalistas, na saída do Palácio do Planalto. "Aí é uma questão de foro íntimo de cada um", respondeu Mourão sobre o fato de o presidente não ter parabenizado o adversário por vencer as eleições.
Mourão também disse que tem "quase certeza" de que Bolsonaro vai passar a faixa presidencial para Lula, um ato tradicional e simbólico na posse presidencial.
"Isso é uma situação hipotética. Vamos aguardar o momento. Ele pode determinar que eu faça, ele pode dar outra determinação. Vamos aguardar. Mas eu tenho quase certeza de que o presidente vai passar a faixa. O que ele falou hoje? Que cumprirá as tarefas dele como presidente e o que está previsto na Constituição. Não está previsto que ele entregue a faixa para o outro?", declarou Mourão a jornalistas, na saída do Palácio do Planalto.
Na mesma ocasião, Mourão confirmou que fez uma "comunicação institucional" ao vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) sobre o processo de transição de governo e uma eventual visita do futuro ocupante de seu cargo ao Palácio do Jaburu, residência oficial da Vice-Presidência.
"Não marquei nada. Eu fiz uma comunicação institucional do atual vice-presidente para o futuro dizendo que estamos em condições de apresentar estrutura e os trabalhos em andamento, assim como a minha esposa está em condições de mostrar o Palácio do Jaburu para a esposa dele. Algo institucional", contou Mourão a jornalistas, na saída do Palácio do Planalto.
Sobre os bloqueios promovidos por apoiadores do Presidente em diversas rodovias do País por não concordarem com o resultado da eleição, Mourão disse que todo protesto que "cerceie o ir e vir" de pessoas e bens "não é válido".
"Ele Bolsonaro disse que os protestos não podem interferir na vida das pessoas, que é a forma como eu penso. E serem feitos dentro da ordem, ou seja, não impedir o direito de ir e vir das pessoas. Você pode fazer protesto, ali, o caminhão na beira da estrada, mas não bloqueia a estrada", declarou Mourão a jornalistas, na saída do Palácio do Planalto.
"O presidente deixou claro, e eu também deixo claro, que todo e qualquer protesto que cerceie o ir e vir, seja de pessoas ou de bens, não é válido. Isso é uma forma que o pessoal da esquerda faz muitas vezes, e o presidente se referiu a isso. Então, nós, que somos da direita, não podemos repetir essa forma de protestar", acrescentou o vice-presidente.
Em pronunciamento no Palácio do Alvorada hoje, Bolsonaro disse que o fechamento de estradas federais por seus apoiadores são "fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral". Ele ponderou, no entanto, que os métodos de manifestação devem ser outros. "As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir", afirmou Bolsonaro.
Após o chefe do Executivo terminar o discurso, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, afirmou que o presidente o havia autorizado a iniciar o processo de transição de governo. Em nota o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que o chefe do Executivo reconheceu o resultado das eleições ao determinar o início da transição.
Jornais no exterior destacam que Bolsonaro evita reconhecer derrota para Lula
Diferentes jornais ao redor do globo seguem repercutindo as eleições brasileiras encerradas no último domingo, 30 de outubro. Depois de 45 horas de silêncio por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL), é a falta do reconhecimento explícito da derrota ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e da menção a um processo eleitoral transparente e confiável que ganha a atenção no exterior. Os veículos também notam que, mesmo assim, a transição de governo ocorrerá.
O New York Times afirma que o discurso serviu para aliviar os temores de que o líder de extrema-direita iria contestar o resultado das eleições, "depois de alertar por meses que a única forma em que perderia seria se os votos fossem roubados".
Entre os britânicos, o The Guardian também destacou a recusa em parabenizar ou reconhecer a vitória de Lula, após dois dias de silêncio. "Mas Bolsonaro não disse nada, com reportagens da mídia local sugerindo que o populista de direita errático estava escondido em sua residência presidencial consumido pela raiva, desânimo e descrença", afirma o texto.
Já o Financial Times disse que Bolsonaro "pareceu aceitar" a derrota, ainda que não o tenha dito explicitamente. A Associated Press, Europapress e o argentino El Clarín trazem pontos semelhantes.
Já a Reuters destacou que o derrotado na corrida eleitoral afirmou que os protestos desde o anúncio do resultado foram fruto de "indignação e sentimento de injustiça" sobre a votação