O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) viaja hoje, 14, para a cidade Sharm-El Sheikh, no Egito, onde participará da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 27. Embora ainda não tenha tomado posse, a ida de Lula ao principal evento sobre questões climáticas, sinaliza a intenção do próximo governo em retomar o protagonismo ambiental ao recolocar o Brasil no centro dessa pauta.
Na COP, Lula deve reforçar compromissos com o desenvolvimento sustentável, contra o desmatamento e ainda a defesa da soberania da Amazônia e dos povos indígenas. Convidado pelo anfitrião, o presidente egípcio Abdul Fatah Al-Sisi, o petista estará acompanhado da esposa Janja; do ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim e do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, derrotado no 2º turno na disputa pelo governo paulista. Ele cumpre agendas nos dias 16 e 17 e na sexta-feira, 18, viaja para Portugal, a convite do primeiro-ministro António Costa, para reunião com autoridades.
A viagem ao Egito é uma oportunidade para o petista. Embora não possa fechar acordos ou falar em nome do Estado, Lula deve se posicionar contra a recente imagem de pária internacional e garantir que ela ficará no passado. Nos últimos anos, sob a tutela do governo Bolsonaro, a Amazônia registrou desmatamento recorde.
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que o último mês de outubro registrou um desmatamento de 904 km² na floresta. O número é o maior para o mês desde o início da série histórica (2015). No acumulado do ano, já foram desmatados pelo menos 9.494 km². Neste ano, Bolsonaro não deve ir à COP, assim como fez na edição passada.
A comunidade internacional já parece entender que Lula pretende mudar essa situação. O presidente eleito recebeu pelo menos dez pedidos de reuniões bilaterais com representantes internacionais, segundo assessores. Por ora, estão acertados apenas encontros com o presidente do Egito e com o secretário-geral da ONU, António Guterres, além da participação em fóruns e um pronunciamento na área da ONU (Blue Zone).
Iago Caubi, pesquisador ligado ao Núcleo de Pesquisa de Geopolítica, Integração Regional e Sistema Mundial (GIS/UFRJ), avalia que a ida de Lula visa "solidificar seu retorno enquanto liderança, a partir do contraste com a gestão Bolsonaro". Isso se daria por meio de uma sinalização de mudança na política externa, que envolve questões ambientais.
O especialista projeta que a mudança de eixo visa ainda trazer investimentos. Um dos principais ganhos foi o anúncio feito por Alemanha e Noruega sobre o Fundo Amazônia, com ambas as nações sinalizando interesse em retomar o financiamento após a vitória de Lula. "Isso demonstra que Lula já é considerado, internacionalmente, a nossa principal liderança. Ao ampliar sua atuação multilateral, o Brasil poderá atrair investidores em áreas importantes, inclusive, para sustentar as promessas feitas durante a campanha", comenta.
Entre os que acompanham a Conferência, há expectativa de que Lula faça alguns gestos. Uma das possibilidades ventiladas é de que seja anunciado o nome do próximo ministro do Meio Ambiente. A deputada federal eleita Marina Silva (Rede-SP) e Izabella Teixeira, ex-ministras da pasta em gestões petistas, estão no Egito desde a semana passada.
Outra expectativa é de que Lula possa sugerir que o Brasil sedie uma das próximas edições, possivelmente a COP 30, em 2025. O que, novamente, serviria para aumentar o contraste com a gestão Bolsonaro, que no início do governo cancelou a organização da COP 25, à época marcada para Salvador, na Bahia.
Caubi aponta que qualquer um dos gestos reforçaria a estratégia de trazer o Brasil para o centro do debate. "Um dos pontos fortes da liderança brasileira no mundo foi a questão ambiental. Num encontro desse nível, é possível não apenas tratar de questões climáticas, mas fazer encontros bilaterais com representações importantes. É uma oportunidade enorme para o anfitrião. Não tenho dúvidas de que Lula tem interesse de trazer esse debate para cá", conclui.