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Supremo derruba orçamento secreto, se alinha a Lula e reduz poder de Lira
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Supremo derruba orçamento secreto, se alinha a Lula e reduz poder de Lira

| Emendas do relator | Corte, por 6 votos a 5, considera inconstitucional prática que fortalecia o presidente da Câmara na barganha com o Executivo; líderes veem ação coordenada com futuro governo
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LIRA aceita comissões de MPs com mais deputados do que senadores (Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)
Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados LIRA aceita comissões de MPs com mais deputados do que senadores

Por seis votos a cinco, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ontem inconstitucional o orçamento secreto. O modelo que contemplava a distribuição de emendas parlamentares para redutos eleitorais de deputados e senadores aliados ao presidente Jair Bolsonaro (PL) se tornou, nos últimos anos, o símbolo da barganha entre o governo e o Congresso.

O veredicto final dos ministros do STF foi visto por líderes do Centrão como uma ação coordenada entre a Corte e o futuro governo para favorecer o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e tirar a força do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A constatação veio na esteira de uma liminar (decisão provisória) concedida anteontem à noite por Gilmar Mendes, menos de 24 horas antes do julgamento. Ao atender à solicitação da Rede - partido aliado de Lula -, o ministro do STF decidiu que o dinheiro necessário para bancar o Bolsa Família deve ficar fora da regra fiscal do teto de gastos.

Com isso, ele criou uma vacina contra o possível troco de Lira na direção de Lula quando a Câmara for votar, hoje, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição.

A PEC concede ao governo uma licença para aumentar o teto de gastos por dois anos e usar R$ 168 bilhões para pagar o Bolsa Família de R$ 600 e o aumento real do salário mínimo. Agora, caso o Centrão tente diminuir esse valor e o prazo de validade da PEC para um ano, Lula pode lançar mão do Plano B do crédito extraordinário autorizado por Gilmar.

Desde a semana passada, Lira já vinha dizendo que não havia os 308 votos necessários para aprovar a PEC. "Eu não sou pai de santo nem João de Deus", afirmou a líderes de partidos.

Na ocasião, o deputado observou que, a exemplo de um médico, precisava de "instrumentos" para garantir votos ao governo Lula. Petistas interpretaram a frase como uma "chantagem" para obter cargos em ministérios, como Minas e Energia e Saúde. "Não faço chantagem", rebateu ele.

Interferência

Em conversas reservadas, na tarde de ontem, o presidente da Câmara disse ter visto interferência de Lula no voto do ministro Ricardo Lewandowski. À noite, o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi ao encontro de Lira para evitar a implosão da PEC.

"O recurso vai continuar no orçamento e vai ser destinado pelos próprios parlamentares", disse Haddad. "Precisamos, neste momento, que o Congresso compreenda que aquilo que foi contratado com a sociedade tem de ser pago. Não me parece que na Câmara haja razões para (a votação) ser muito mais difícil que no Senado", completou. Lira pretende agora abrigar o orçamento secreto nas emendas de comissão.

Próximo de Lula, Lewandowski era tido como fiel da balança no julgamento, que havia sido interrompido a seu pedido, na quinta-feira, quando o placar estava em cinco a quatro. Ontem, só ele e Gilmar ainda precisavam votar.

"Apesar dos esforços, o Congresso não conseguiu se adequar às exigências da Suprema Corte", disse Lewandowski, ao acompanhar o voto de Rosa Weber. Na semana passada, Rosa definiu o orçamento secreto como um dispositivo "à margem da legalidade".

Além disso, ela cobrou os nomes dos parlamentares que enviaram quantias milionárias a redutos eleitorais e também dos beneficiados, além de critérios para a distribuição de recursos

O Supremo deu 90 dias para a publicação de dados relacionados a obras e compras feitas com o dinheiro, de 2020 até este ano. Votaram pela derrubada do orçamento secreto, além de Rosa e Lewandowski, os ministros Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso.

Nunes Marques, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar se posicionaram pela manutenção do mecanismo. Os três últimos magistrados, porém, assinalaram a necessidade de transparência no envio dos recursos.

Pressa

O Centrão foi surpreendido com o desfecho do julgamento do STF porque, na sexta-feira, Lewandowski havia dito, em reunião com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que as mudanças feitas pelo Congresso em um projeto de resolução para "disciplinar" a distribuição de emendas seriam consideradas na Corte.

Naquele dia, uma sessão do Congresso aprovou um texto às pressas, definindo critérios para repasses de emendas, na tentativa de mostrar uma solução aos ministros. A alteração, porém, foi considerada insatisfatória porque manteve a captura do dinheiro com as cúpulas da Câmara e do Senado.

Haddad: Emenda de relator continua no Orçamento será destinada aos parlamentares

O futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta segunda-feira, 19, que os recursos das emendas de relator permanecerão no Orçamento e serão destinados aos próprios parlamentares.

Segundo ele, o governo fará uma reunião com líderes partidários amanhã, 20, para explicar os conceitos da PEC da Transição e o que será feito com os R$ 19,4 bilhões do orçamento secreto. As declarações foram feitas após Haddad voltar de uma reunião com presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na residência oficial.

"Amanhã vamos falar com os líderes, explicar os conceitos que estão por trás da PEC e o que vamos fazer com a RP9. O recurso vai ficar no orçamento e vamos definir a destinação desse recurso para melhorar as obras de infraestrutura, concluir as obras que estão paradas, definir a destinação desses recursos", disse.

Haddad declarou que a votação da PEC da Transição deve ocorrer amanhã e que esteve com Lira em virtude das negociações para a votação da PEC da Transição.

"Como anunciei de manhã, nós íamos insistir em uma saída política, organizada e institucional para aprovar um orçamento transparente e de acordo com o desejo da população, além aprovar a PEC da Transição que vai dar sustentabilidade para o orçamento do próximo ano", afirmou.

O futuro ministro da Fazenda ainda disse que a maioria para a aprovação da PEC está sendo construída e o trabalho deve varar a madrugada.

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