O Novo Ensino Médio (NEM) se tornou alvo de polêmica nos meios educacionais e também na política. Movimentações de estudantes, de educadores e de entidades ligadas à educação foram registradas nas últimas semanas acerca do modelo aprovado por lei em 2017, na gestão Michel Temer (MDB), e que começou a ser implementado gradualmente em 2022.
No último dia 15, estudantes foram às ruas protestar contra o NEM e pedir a revogação. Mais de 50 cidades do Brasil registraram manifestações. O modelo é criticado por entidades estudantis e grupos ligados a trabalhadores da educação que pedem a "revogação" e argumentam a falta de infraestrutura de escolas públicas, perda de espaço das disciplinas tradicionais e falta de discussão com os setores envolvidos.
Com o novo modelo, disciplinas tradicionais foram segmentadas em “áreas de conhecimento” (ciências humanas, ciências da natureza, linguagens, matemática e ensino técnico profissionalizante). Assim, 60% da carga horária dos três anos do Ensino Médio continua a ser comum e obrigatória, enquanto o restante é composto por matérias eletivas, dentro dessas áreas, que são escolhidas pelos próprios estudantes (itinerários formativos).
Na prática, o NEM flexibiliza o que os estudantes aprendem ao passo em que eleva a carga horária e muda a distribuição de disciplinas. O modelo eleva de 2.400 horas para de 3.000 horas a carga somada dos três anos (passando de 800 horas para 1.000 horas por ano). As disciplinas comuns a todos representarão um máximo de 1.800 horas, em três anos, enquanto os conteúdos eletivos devem totalizar as 1.200 horas restantes.
Os itinerários formativos são responsabilidade de cada rede de ensino, cabendo a elas determinar quais conteúdos são oferecidos. Portanto, o que é ensinado em um local, não necessariamente é ofertado em outro.
Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), diz que a medida foi impositiva e cobrou mais debates.
“Essa reforma tira a capacidade de formação humana, cidadã, crítica e reflexiva dos estudantes, ao reduzir disciplinas científicas e encher o currículo com coisas que não dialogam com o processo de formação humana que defendemos”, defendeu em entrevista ao programa O POVO News, no último dia 15 de março.
Entidades estudantis como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) têm organizado movimentos como os do dia 15 e discursado de modo contrário ao NEM.
“Lutamos pela revogação do Novo Ensino Médio e pela criação de uma Comissão Tripartite: que una sociedade civil, estudantes e governo que, juntos, elaborarão uma nova lei que regulamente o Ensino Médio”, aponta a Ubes.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reafirmou na última terça-feira, 21, que a construção do novo desenho do Ensino Médio será feito a partir de debates com alunos e professores e que o modelo passará por mudanças estruturais, embora não tenha dito quais.
Em entrevista ao Brasil 247, Lula disse ter conversado com o ministro da Educação, Camilo Santana, sobre o tema. "Ele (Camilo) vai fazer um debate, não vai ser do jeito que está. Vamos fazer de um jeito que seja agradável ao Governo, mas também aos estudantes", ressaltou.
Secretarias da educação e entidades privadas da área argumentam que o modelo garante mais tempo em sala de aula e torna o Ensino Médio mais atrativo para estudantes, o que pode reverberar na diminuição da evasão escolar nessa etapa. Além disso, gestores questionam a eventual revogação, que descartaria esforços alocados nos últimos anos para garantir a implementação do modelo.
Em nota, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) afirma que os novos currículos foram construídos coletivamente e as formações para professores e itinerários formativos de cada rede já estão em andamento.
“Não é sensato pensar em descartar todo esse esforço técnico e financeiro despendido pelas redes estaduais ao longo dos últimos anos. Além de inviável, essa opção, em nenhum momento, foi considerada pelos gestores estaduais, que são os responsáveis pela etapa de ensino na rede pública”, escreve.
O Consed aponta ainda que, aprimoramentos e ajustes podem e devem ser discutidos. No entanto, sinaliza que a revogação do Novo Ensino Médio “não é o caminho para tornar essa etapa mais atrativa ao estudante” e se posiciona contrário a qualquer medida nesse sentido.
Nesse contexto, o Ministério da Educação abriu consulta pública para “reavaliação” do Novo Ensino Médio. “Apostamos no diálogo para a reavaliação. Por isso, o MEC abriu uma consulta pública, com audiências, seminários e pesquisas junto a estudantes, professores e gestores para debater a pauta de forma democrática”, anunciou Camilo Santana. A medida dá prazo de 90 dias para as manifestações, com possibilidade de prorrogação.
Além disso, o MEC recompôs, no último dia 17 de março o Fórum Nacional de Educação (FNE), reintegrando entidades e movimentos populares ao grupo e incluindo o FNE na coordenação do processo de consulta e avaliação do Ensino Médio. “O MEC está de portas abertas para ouvir, dialogar, aprender e construir conjuntamente”, reforçou Camilo.
"Do jeito que está não tem a menor condição", diz deputado cearense sobre projeto
O deputado federal cearense Idilvan Alencar (PDT), parlamentar com atuação ligada à área da educação, comentou ter recebido relatos, de professores e estudantes, acerca da implementação do Novo Ensino Médio (NEM) no Brasil. Segundo Alencar, há "rejeição por parte de professores e alunos" ao modelo.
"Não lembro da ultima vez que estudante foi para a rua protestar contra proposta pedagógica. Já vi protesto contra corte de orçamento, nomeação, para reforma de escolas, mas contra proposta pedagógica?", questiona o parlamentar. Para o pedetista, as principais preocupações giram em torno de certo "desprestígio" de algumas áreas do conhecimento.
"Me preocupa muito, um país preconceituoso com pessoas defendendo ditaduras, você abrir mão de qualquer segundo de aulas de Sociologia, Filosofia e de História. Deveríamos ter mais disso (...) Educação Física, tenho conhecimento de escola, que no 2° ano do Ensino Médio não tem uma aula. Espanhol está perdendo espaço para o Inglês. Por qual razão? Língua é projeto de poder", aponta.
O deputado Alencar defende que seu posicionamento espelha o que pensa a maioria dos educadores, especialmente do Ceará. "A minha posição é a deles, e eles estão majoritariamente contrários. Do jeito que está não tem a menor condição. Nos moldes atuais não tem condição (...) Vamos revisar ou revogar se for o caso? Sei que são questões delicadas e difíceis, já fui gestor e sei disso. Mas não podemos estar em um processo de insatisfação, com professores inseguros e pouco apoiados", sinaliza.
Alencar, que já foi presidente do Conselho de Secretários de Educação (Consed), diz que é natural que haja aflição por parte dos gestores sobre eventual revogação.
"Eles recebem essa rejeição (sobre o modelo), mas ficam sem saber o que fazer. Se revogar isso, o que fazer? É mais uma aflição e é natural porque é uma aflição de todos. Mas os atores principais desse projeto são professores e estudantes. Na educação, desconheço um projeto que deu certo sem apoio de professores e estudantes", finaliza. (Vítor Magalhães)
Comissão de Educação debaterá pedido do Psol para revogar Novo Ensino Médio
O deputado federal cearense, Moses Rodrigues (União Brasil), presidente da Comissão de Educação na Câmara dos Deputados, disse que o colegiado irá debater o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) protocolado por deputados do Psol para revogar a implementação do Novo Ensino Médio (NEM) no Brasil, assim que a mensagem chegar ao colegiado.
Moses confirmou que o projeto assinado por parlamentares do Psol foi oficializado no último dia 16 março e sinalizou abertura de canal para as conversas. "Vamos aguardar a Secretaria Geral da Mesa distribuir (o projeto), quando ele chegar à Comissão de Educação vamos debater. É nosso papel abrir o diálogo para o fortalecimento da educação", disse.
O cearense reforçou ainda que, se os parlamentares da comissão julgarem necessária a participação do ministro da Educação, Camilo Santana (PT), "vamos convidá-lo a participar do debate com os técnicos do Ministério da Educação". O MEC já anunciou consulta pública para revisão do Novo Ensino Médio, com prazo de 90 dias e possibilidade de revogação. A medida foi criticada por aqueles que defendem a revogação.
"Se você não revoga esse cronograma, na prática, você faz com que essa consulta anunciada pelo Ministério da Educação seja simplesmente uma forma de procrastinação", disse o deputado Glauber Braga (Psol-RJ).
No entendimento do parlamentar, é necessário primeiro um retorno ao modelo anterior para posteriormente ser feita a convocação de estudantes e professores para debater o que pode ser feito para melhorar. Além de Braga, o PDL é assinado pelos deputados Chico Alencar, Sâmia Bomfim, Luciene Cavalcante, Ivan Valente e Tarcísio Motta, todos do Psol. (Vítor Magalhães)