Mensagens de áudio sobre um plano de golpe de Estado trocadas entre Mauro Cid, tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), e o advogado e militar da reserva Ailton Barros estão sendo investigadas pela Polícia Federal (PF). Presos na última quarta-feira, 3, pela operação Venire, os dois são investigados por fraudar cartões de vacina contra a Covid-19 do ex-presidente e de sua filha.
A PF iniciou a investigação das mensagens após encontrar na conversa entre os dois militares "tratativas para a execução de um golpe de Estado e possível tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito". Com os novos indícios nos diálogos, a PF pediu o compartilhamento de informações com o inquérito dos atos antidemocráticos ocorridos em 8 de janeiro contra as sedes dos Três Poderes em Brasília.
"Apesar de não terem obtido êxito na tentativa de golpe de Estado, sua atuação, possivelmente, foi um dos elementos que contribuíram para os atos criminosos ocorridos no dia 8 de janeiro de 2023, fato que demonstra a necessidade da pertinente autorização judicial para compartilhamento dos elementos informativos ora identificados com os autos do Inquérito 4923/DF", ressaltou a corporação na representação levada ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O texto está incluído na representação do órgão para iniciar a operação na quarta-feira. Ainda segundo o documento da PF, arquivos de áudio e capturas de tela de mensagens trocadas no WhatsApp "evidenciaram a arquitetura do plano criminoso pelo grupo investigado".
Na próxima semana, o ex-candidato a vereador pelo Rio de Janeiro, Aílton Barros, dará depoimento no inquérito que investiga a morte de Marielle Franco. Ailton não é considerado suspeito no assassinato da vereadora, porém é citado na investigação.
Na Operação Venire, Ailton é apontado como "intermediário" do esquema na prefeitura de Duque de Caxias (RJ). Após ajudar Cid, segundo a PF, Ailton pediu uma "contrapartida": que o tenente-coronel intermediasse um encontro cujo tema seria o assassinato de Marielle Franco, ocorrido em 2018.
A solicitação se deu em razão de Ailton ter tido ajuda do ex-vereador Marcello Siciliano na fraude. Em troca, pediu que o ex-ajudante de ordens conseguisse um encontro entre Siciliano e o cônsul dos EUA. O objetivo seria resolver um problema relacionado ao visto do ex-vereador decorrente do envolvimento do nome de Siciliano no caso Marielle.
A PF também investiga conversas telefônicas que expõem o ajudante de Jair Bolsoanro, Mauro Cid, pedindo ajuda à Ailton Barros para forjar cartão de vacina para esposa, Gabriela Santiago Cid, um ano antes de conseguir o de Jair Bolsonaro.
Cartões de imunização das filhas do ex-ajudante de ordens da Presidência da República Mauro Cid sob suspeita de fraudes registraram a aplicação de uma vacina contra a covid-19 que não estava autorizada para crianças e adolescentes. Na data da suposta imunização, as filhas menores de 18 anos do tenente-coronel não poderiam ter tomado a vacina da Janssen, como consta no sistema do Ministério da Saúde, uma vez que a aplicação do imunizante só é permitida para maiores.
Braço direito do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Cid está preso preventivamente e é apontado pela Polícia Federal como articulador do esquema investigado por falsificação de certificados de vacinação. Os cartões fraudados teriam sido emitidos para o tenente-coronel e sua família e também em nome de Bolsonaro e da filha do ex-presidente, Laura, de 12 anos. Procurada, a defesa de Cid não se manifestou. O ex-chefe do Executivo afirma que não se vacinou e nega participação no esquema.
Segundo a investigação da PF, Cid e as filhas teriam tomado três doses de vacina no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Pelo registro, a imunização ocorreu em 2021, nas seguintes datas: 22 de junho e 8 de setembro (Pfizer) e 19 de novembro (Janssen).
Ainda de acordo com os investigadores, os dados foram inseridos no sistema do Ministério da Saúde mais de um ano depois da suposta aplicação em Duque de Caxias. As informações foram incluídas na plataforma da pasta em 17 de dezembro do ano passado. A PF afirma que, naquela data, as filhas do militar tinham 5 anos, 14 anos e 18 anos.
No período da suposta imunização, em 2021, as filhas do ex-ajudante de ordens, portanto, eram menores de idade e não poderiam ter recebido doses da Janssen. O imunizante é autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apenas para população acima de 18 anos e não pode ser usado no Brasil nem como dose de reforço em menores.
A filha mais nova de Cid não poderia nem mesmo ter tomado a vacina da Pfizer, porque, nas datas registradas da imunização, a criança não se encaixava em nenhuma faixa etária autorizada pela Anvisa. A agência aprovou em 16 de dezembro de 2021 a aplicação da vacina em crianças de 5 a 11 anos. Em 16 de setembro do ano passado, a Anvisa autorizou o imunizante para a população de 6 meses a 4 anos.
A PF afirma que o objetivo era emitir certificados de vacinação em nome de pessoas que não haviam sido efetivamente imunizadas. Mensagens de WhatsApp analisadas pelos investigadores mostram que, meses antes da suposta imunização em Duque de Caxias, Cid criticava a vacina contra a covid-19. Em 29 de abril de 2021, o militar escreveu para a mulher: "Eu não vou tomar... nem as crianças".
O inquérito aponta que o objetivo dos investigados era burlar a exigência do comprovante para viagens internacionais, driblando restrições sanitárias impostas pelo Brasil e pelos Estados Unidos em meio à pandemia. As fraudes teriam ocorrido a partir de Duque de Caxias e do município de Cabeceiras, no interior de Goiás.
Os certificados de vacinação de Bolsonaro e de Laura teriam sido adulterados às vésperas de viagens da família para os Estados Unidos, em dezembro do ano passado, conforme a PF. O inquérito sustenta ainda que o ex-presidente e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro tinham "plena ciência" das fraudes. (com Agência Estado)