Menos de um ano depois das últimas eleições, o condomínio governista ganhou mais inquilinos no Ceará. Aos nove partidos que apoiaram Elmano de Freitas (PT) na briga pelo Governo do Estado em 2022, somaram-se outros dois: PSD e PSB, ambos egressos de uma das chapas adversárias do candidato petista no ano passado.
A preço de hoje, compõem a base do Abolição, além das duas legendas recém-chegadas, PT/PCdoB/PV – que formam uma federação –, PP, MDB, PRTB, Psol/Rede e Solidariedade.
Mas qual o peso de cada uma dessas siglas na matemática eleitoral? À medida que o pleito de 2024 se aproxima, lideranças tentam ganhar espaço no bloco aliancista, de modo a influenciar na definição do time que vai para as urnas.
Nessa dança de cadeiras, alguns critérios começam a ser delineados para preenchimento das vagas na chapa que concorrerá à Prefeitura de Fortaleza, tais como titular e vice.
Para dirigentes ouvidos em reserva, a fidelidade inicial ao grupo comandado por Elmano, Camilo Santana (PT) e Cid Gomes (PDT) funciona como uma espécie de nota de corte, ou seja, quem estava primeiro no barco que aportou no Governo deve ter prioridade – ou mais ascendência – na escolha de nomes para pleitear a sucessão do prefeito José Sarto (PDT), em Fortaleza.
Publicamente, Elmano e seu entorno vêm enfatizando que o/a representante das forças governistas tem de se submeter ao conjunto de aliados, aos quais cabe a tarefa de ajudar na costura de um quadro de consenso.
Essa metodologia já foi exposta pelo deputado federal e líder do Planalto na Câmara, José Guimarães (PT). Um dos dirigentes de destaque nessa nova conjuntura política cearense, o parlamentar, em conversa com O POVO, cogitou inclusive que o potencial candidato não fosse do PT, mas de outra agremiação pertencente ao arco “camilo-cidista”.
Internamente, porém, o PT bateu o martelo: vai ter postulante ao Paço, seja com um filiado de primeira viagem, a exemplo de Evandro Leitão (ainda no PDT, mas acenando ao petismo), seja com um perfil mais experimentado, como a deputada federal e ex-prefeita Luizianne Lins.
Por um conjunto de fatores que incluem mais capilaridade, representação parlamentar (tempo de TV e recursos) e presença tanto na gestão local quanto na Presidência, o PT é um dos aliados que reúnem mais capital no grupo que dá sustentação a Elmano, do qual vai sair o candidato.
Há outras forças, contudo, interessadas no posto e com poder de mando no jogo. É o caso do PSB, hoje sob condução do ex-deputado Eudoro Santana, pai de Camilo. Exatamente porque se apresenta como uma alternativa para descontentes no PDT, a sigla socialista pode chegar com mais musculatura para as disputas de 2024.
Em entrevista à reportagem, Eudoro afirmou recentemente que o propósito é robustecer o PSB com vistas ao ano que vem. Para tanto, o pessebista avança em duas frentes: filiando prefeitos, tais como Vitor Valim (Caucaia), e articulando a entrada de Leitão.
Partidos como PP, MDB e PSD, no entanto, também exercem grande pressão por espaços dentro da aliança. Respectivamente chefiadas por Antônio José (AJ) Albuquerque, Eunício Oliveira e Domingos Filho, as três legendas costumam se dedicar mais a fazer grandes bancadas legislativas do que a aspirar ao Executivo (estadual ou municipal).
Do trio, Domingos é o mais recente morador do ninho governista – e também aquele cujos projetos se aproximam mais das cadeiras de governador ou prefeito – já foi vice na gestão de Cid Gomes.
Em 2022, o dirigente estava do outro lado balcão, tentando se eleger vice-governador tendo Roberto Cláudio (PDT) como candidato. Não deu certo, e agora o pessedista é parte oficialmente da base de Elmano.
O mesmo movimento foi feito pelo PSB, outro ex-aliado de RC que agora compõe o campo governista, numa mudança de chave que é reflexo do atual arranjo de poder no estado.
Cientista político e colunista do O POVO, Cleyton Monte considera que o peso de cada legenda aliada deve ser estimado a partir de alguns elementos, entre os quais “recursos, principalmente tempo de TV e fundo eleitoral, e militância”.
“Com relação às eleições de 2024, temos que ver o tamanho do partido na Câmara de Vereadores, porque a disputa legislativa está sempre atrelada também à do Executivo”, aponta.
Monte observa, porém, o protagonismo de três estruturas partidárias que se sobressaem na esfera governista para a eleição que se avizinha: “O PP, além do PT e do PSD”.
Vagas para o Senado também devem entrar em cálculo de aliados
Embora a eleição mais próxima seja apenas em 2024, a de 2026 também já está no radar das forças governistas.
Com cadeiras no Senado sendo disputadas naquele ano, partidos que eventualmente não sejam contemplados agora podem ter prerrogativa para indicar ou influir na escolha dos nomes para a senatorial.
Em 2026, duas vagas estarão abertas entre candidatos ao Senado no Ceará: as de Cid Gomes (PDT) e Eduardo Girão (Novo). A terceira, hoje ocupada por Augusta Brito (PT), eleita suplente de Camilo Santana (PT), tem mandato até 2030.
Girão e Cid chegaram ao Senado em 2018. Eunício Oliveira (MDB), então presidente do Congresso, acabaria ficando de fora na corrida de cinco anos atrás.
Mesmo com o racha no PDT em 2022, Cid permaneceu aliado de Elmano de Freitas e de Camilo. Logo, não deve ter dificuldades de convencimento se quiser postular recondução no Legislativo.
Nesse cenário, restaria uma vaga para candidato a senador ou senadora. Dentro do governismo, a concorrência por essa cadeira já tem nomes de peso.
É o caso dos deputados federais José Guimarães e Luizianne Lins, ambos do PT. O parlamentar, por sinal, já abriu mão do posto noutra eleição, cedendo espaço para que aliados fossem acomodados na composição governista.
Dentro do PT, fontes dizem em reserva que a promessa de apoio a Luizianne para o Senado seria um dos trunfos para dissuadir a petista de manter a candidatura à Prefeitura de Fortaleza neste ano, abrindo o caminho para outro representante do bloco aliado. (Henrique Araújo)
Para professor, "o peso do PT é o do governo e do Camilo"
Cientista político e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Emanuel Freitas calcula que a influência que o PT deve exercer na formação da chapa para a Prefeitura de Fortaleza ano que vem se deve menos à própria legenda e mais às figuras de Elmano de Freitas e Camilo Santana.
“O peso do PT é o peso do Governo e do Camilo. Se fosse apenas do PT, já teria candidatura e não precisaria da migração do Evandro Leitão. Antes de tudo, é a força do governo estadual, que por acaso está com o PT”, avalia o pesquisador.
Atual chefe do Executivo, Elmano terá voz decisiva para a escolha do representante do partido na corrida de 2024, seja com um quadro já filiado à sigla, seja com outro nome.
Camilo, por sua vez, é hoje a principal liderança da legenda. Não apenas porque comanda o Ministério da Educação (MEC), mas porque foi o grande fiador da vitória de Elmano nas urnas em 2022.
O processo de indicação do postulante do bloco, portanto, passa necessariamente pelas costuras da dupla e das tratativas com agremiações aliadas.
Além deles, o deputado federal José Guimarães é outro com ascendência local e capacidade de influir nos caminhos que o partido venha a seguir.
O PT, contudo, organiza-se internamente segundo uma cultura de divergências, levadas a voto em forma de teses para serem aprovadas ou descartadas.
Mesmo com força, Elmano e Camilo teriam de construir uma maioria no diretório municipal caso pretendam emplacar algum potencial candidato com mais facilidade. (Henrique Araújo)
"É uma candidatura que inicia forte", diz analista
Colunista do O POVO, o cientista político Cleyton Monte pondera que, independentemente do potencial de influência de cada partido isoladamente, interessa entender que, ao final, o representante do bloco governista deve chegar à disputa com muita força.
“É uma candidatura que inicia forte, competitiva, são partidos grandes e que vão oferecer uma estrutura de campanha, e isso faz diferença”, avalia o especialista.
Como exemplo dessa capacidade da aliança governista, Monte cita legendas como o “MDB e o PSB, estruturas menores e que estão se recompondo”, mas que ajudam a consolidar um campo mais amplo até do que aquele que deu sustentação a Elmano de Freitas em 2022.
Caso todas as siglas que hoje gravitam o Abolição se mantenham unidas para 2024, o candidato apoiado pelo grupo teria um arco que deixaria de fora apenas PDT, Cidadania, PSDB, União Brasil e PL.
Ainda o maior partido do estado, o PDT vive um impasse. Legenda do atual prefeito de Fortaleza, José Sarto, que caminha para tentar a reeleição, ele está rachado desde o ano passado, quando uma fração expressiva da agremiação já nem apoiou o candidato pedetista ao Abolição, Roberto Cláudio.
Isso significa que, para a próxima corrida eleitoral, o nome chancelado por Elmano, Camilo Santana e Cid Gomes ainda contaria com parte significativa do PDT, mesmo que a sigla apresente uma candidatura própria, que é o cenário mais provável. (Henrique Araújo)