O papel do conselheiro tutelar é defender e garantir os direitos das crianças e dos adolescentes. Uma definição que pode parecer simples diante de todas as atribuições do cargo, mas também desconhecida para boa parte da sociedade.
A cada quatro anos uma nova turma de conselheiros tutelares é escolhida, em uma votação que muitos comparecem em apoio a um conhecido, seja da comunidade, da família, da igreja ou mesmo da política.
Fortaleza, que conta com oito unidades do Conselho Tutelar e aguarda a entrega de mais quatro, elegeu 60 conselheiros tutelares e 60 suplentes neste mês de outubro. Entre os eleitos, 30 são mulheres e 30 homens, dentre o total, 24 foram reeleitos ao cargo.
Irene Lima, a primeira colocada, também foi a mais votada na eleição de 2019. A conselheira, eleita com quase 5 mil votos, é inusualmente discreta nas redes sociais, com perfil fechado e poucos seguidores e publicações. Ela é integrante da Igreja Universal do Reino de Deus e tem ligação com o vereador Ronaldo Martins (Republicanos), este o que recebeu mais votos para a Câmara Municipal de Fortaleza nas eleições 2020.
O papel das igrejas evangélicas foi destaque nas eleições para o Conselho Tutelar da capital cearense, com oito candidatos ligados aos templos religiosos. Uma delas é a candidata Tia Chinot, que também faz parte da Igreja Universal. Diferentemente de Irene, Tia Chinot fez campanha nas redes sociais, apesar de discreta.
Outra denominação forte entre os eleitos é a Assembleia de Deus. Pelo menos três dos eleitos informam vínculo com diferentes sedes da igreja.
Edilene Pessoa, frequentadora da Assembleia de Deus Montese, é esposa do pastor da sede, Osires Junior. Outras instituições religiosas que tiveram integrantes eleitos foram a Igreja Cristã Evangélica Betel e a Igreja Batista El Betel Parque Santa Rosa.
Pelo menos 16 eleitos possuem vínculos político-partidários. São os casos de Danilo Ribeiro, suplente de vereador do Cidadania, que chegou a assumir o mandato, ou Adrielly Teixeira, candidata a deputada federal nas eleições de 2022, pelo PDT. Ou ainda Paulinho Liderança, que foi suplente de vereador pelo PSD.
Há as ligações familiares, como de Robério Filho, filho da vereadora Valdenice Lima (Cidadania), e de Germana Mesquita, esposa do vereador Bruno Mesquita (PL).
Um importante debate presente no período de campanha eleitoral do Conselho Tutelar foi a descriminalização do aborto. Uma pauta que cresceu com a votação no Supremo Tribunal Federal (STF) e impacta diretamente crianças e adolescentes.
Segundo dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), do SUS, 1.043 adolescentes se tornam mães no Brasil por dia. Seguindo essa discussão, o eleito Nill Souza se declarou contrário a descriminalização do aborto, enquanto Alison Gadelha se descreveu como "pró-vida".
Saindo da pauta de saúde pública, mas permanecendo no âmbito dos costumes, três eleitos utilizaram o termo "conservador" para se descreverem. Uma delas é Tia Chinot, que foi a quarta mais votada da eleição; assim como Isabel Mesquita, 20º colocada; e Jorge Aragão, 27º colocado.
Na parte de projetos sociais, três eleitos se destacam por serem fundadores de organizações para crianças e adolescentes. Jaydson Almeida é o idealizador do Instituto Francisco de Assis (IFA), na Vila Manoel Sátiro, que oferece aulas de balé, judô e ritmo.
George Marconi fundou a Associação Sociocultural do Bom Jardim (ASCBJ), que, além de aulas de dança clássica, contemporânea e popular, também oferece serviços de qualidade de vida, letramento, leitura e produção textual. E Fabricio Matias fundou a Associação Crer, que realiza atendimento assistencial para moradores da região do Pirambu, Carlito Pamplona e adjacências.
Ainda nos segmentos culturais, dois eleitos possuem ligação com festas juninas. Getúlio Mendes, eleito em 5º lugar, é produtor cultural e responsável por organizar eventos juninos no bairro Passaré. Rafaele Gurgel recebeu apoio da quadrilha Paixão Nordeste e do grupo Maracatu Nação Palmares.
Entre as profissões dos eleitos, destacam-se pelo menos seis professores: Célia Alves, Tia Chinot, Robério Filho, Lorena Moura, Roberta Valonha e Prof. Alison BDL. Há dois nutricionistas, pelo menos: Flauber Dutra e Edilene Pessoa. E duas assistentes sociais identificadas pela reportagem: Wellen Monte e Leide Diane.
A eleição para o Conselho Tutelar ocorreu no dia 1º de outubro, e teve alto comparecimento da população. O resultado foi divulgado na mesma noite, mas revogado na quinta-feira, 5, após a Prefeitura de Fortaleza e o Ministério Público (MPCE) detectarem incompatibilidade no sistema de apuração.
A recontagem foi realizada no sábado, 7, na Academia do Professor, no Centro, utilizando um sistema de leitura dos boletins do Ministério Público do Tocantins (MPTO). Representantes do MPCE e do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Fortaleza (Comdica), estiveram presentes na ocasião.