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Estado conversa com família de Castello Branco para retirar restos mortais do mausoléu
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Estado conversa com família de Castello Branco para retirar restos mortais do mausoléu

A estrutura arquitetônica não sofrerá alteração. Haverá apenas a retirada das urnas mortuárias
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Mausoléu Castello Branco, no complexo do Palácio da Abolição (Foto: Yuri Allen/Especial para O Povo)
Foto: Yuri Allen/Especial para O Povo Mausoléu Castello Branco, no complexo do Palácio da Abolição

O Mausoléu construído para abrigar os restos mortais do ex-presidente Castello Branco é objeto de polêmica quase 60 anos após a morte do primeiro presidente militar do período da ditadura (1964-1985). Situado numa parte do complexo arquitetônico do Palácio da Abolição (sede do governo do Ceará), o monumento voltou a pauta recentemente, na gestão do governador Elmano de Freitas (PT).

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Elmano manifestou publicamente a intenção de retirada do monumento, que serve de abrigo aos restos mortais do ditador, do terreno do Abolição, o que abriu uma série de divergências e críticas acerca do tema. A intenção é transformar o espaço num memorial aos abolicionistas do Ceará. No entanto, a estrutura do espaço será preservada, sem sofrer grandes alterações na arquitetura.

"A decisão está tomada. A Secretaria da Cultura (Secult), junto à Secretaria de Direitos Humanos, tem a missão de garantir que no Palácio da Abolição não ficará mais o Mausoléu de quem apoiou a ditadura", disse Elmano no ano passado, durante cerimônia que homenageou os 44 anos da Lei da Anistia. Como a estrutura reverencia o militar e ex-presidente do início do período ditatorial, a atual gestão publicizou a iniciativa de mudanças no local.

O ditador

Humberto de Alencar Castello Branco foi presidente no início da ditadura militar no Brasil, entre os anos de 1964 a 1967. Anos depois da sua morte (julho de 1967) o então governador cearense Plácido Castelo decidiu incluir a estrutura no conjunto de edificações do Palácio da Abolição, como homenagem a Castello, que era natural de Fortaleza.

Em 2006, o Mausoléu foi restaurado. De acordo com o atual governador, a decisão de mudanças “honra a história daqueles que lutaram e dedicaram suas vidas pela democracia, pelo bem e dever do povo cearense”.

Conversas com a família

A Secult informou ao O POVO que está em processo de diálogo com familiares para dar andamento às tratativas para retirar do Mausoléu Castello Branco as urnas mortuárias do ex-presidente e da ex-primeira-dama Argentina Vianna Castello Branco.

“Por meio da Secretaria da Cultura do Ceará e da Casa Militar, foi estabelecido contato com a família para tratativas sobre as urnas mortuárias. Assim que findadas as tratativas, o Governo do Ceará deverá fazer o anúncio do projeto que será implementado”, destacou.

A Secult reforçou ainda que a estrutura arquitetônica permanecerá no local e que o diálogo é apenas sobre a retirada das urnas mortuárias. O reforço na informação é para evitar eventuais confusões de interpretação que possam surgir sobre mudanças na estrutura do local, o que não ocorreu e nem está previsto nas articulações que estão em andamento.

Filme

O POVO lança, no próximo dia 18 o documentário "Castello, o ditador". A obra conta como o cearense, tido como moderado, foi responsável por instalar a ditadura militar no Brasil e possibilitar a continuidade do regime por mais de duas décadas.

No ano em que o golpe militar completa 60 anos, o filme traz de volta a memória da ditadura e mostra como Castello Branco influenciou o destino do país e a vida de cearenses que resistiram ao regime.

FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL 01-09-2023: fotos Mausoléu (Foto: Yuri Allen/Especial para  O Povo)
FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL 01-09-2023: fotos Mausoléu (Foto: Yuri Allen/Especial para O Povo)

Terreno do Palácio da Abolição e Mausoléu Castello Branco pertenceu à família Gracie, do jiu-jitsu

Casa de 11 dos últimos 17 governadores cearenses desde a sua inauguração, na gestão Plácido Castelo, em 1970, o imponente Palácio da Abolição chama a atenção de quem passa entre a Avenida Barão de Studart e as ruas Tenente Benévolo, Silva Paulet e Deputado Moreira da Rocha. O terreno, que hoje abriga a sede do governo do Ceará, complexo arquitetônico no qual está, por enquanto, o Mausoléu do ex-presidente Castello Branco, já pertenceu a um mestre mundialmente famoso no mundo das artes marciais: Carlos Gracie

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A história do Abolição começou uma década antes da inauguração, quando o então governador do Ceará, Parsifal Barroso (1959-1963), definiu o projeto para criação de uma nova sede do Poder Executivo. Para isso, foi desapropriado um terreno, no início da década de 1960, pertencente a Carlos Gracie, membro da família que tornou o jiu-jitsu uma das artes marciais mais famosas no Brasil e no mundo.

A família Gracie é conhecida mundialmente pela difusão do Brazilian Jiu-Jitsu, adaptação da arte marcial que, em tese, permite que lutadores em condição de desvantagem física possam competir em pé de igualdade com lutadores mais fortes.

À época da desapropriação do terreno, Carlos Gracie residia com a esposa, Geny, no Rio de Janeiro. Por meio de decreto 4.449 de 29 de maio de 1961, o então governador cearense, Parsifal Barroso, publicou no Diário Oficial, tema de utilidade pública, para efeito de desapropriação, envolvendo o imóvel em questão, incluindo benfeitorias que no local existissem. Ficou definido que o preço da indenização a ser paga à família Gracie ficaria a cargo de uma Comissão de engenheiros designada pelo então chefe do Executivo.

Decreto cita desapropriação do terreno de Carlos Gracie, que daria lugar ao atual Palácio da Abolição(Foto: Reprodução / Diario Oficial do Ceará)
Foto: Reprodução / Diario Oficial do Ceará Decreto cita desapropriação do terreno de Carlos Gracie, que daria lugar ao atual Palácio da Abolição

Arquivos em publicação na Revista do Instituto do Ceará dão conta do momento em que a ação foi registrada em cartório pelos Gracie em acordo com o governo do Ceará.

O mesmo documento mostra que inicialmente, a família Gracie não aceitou um valor proposto pela comissão de engenheiros, referente à avaliação realizada em julho de 1961. Uma reavaliação do terreno, feita em fevereiro de 1962, modificou o valor considerando particularidades como: custo em ascensão dos bens; novos níveis salariais da época e conveniência de entendimento entre as partes, sem prejuízo para o interesse público, evitando uma questão prejudicial ao inicio das obras do Palácio.

Segundo a Casa Civil do Governo do Estado, o valor fixado para a desapropriação foi de 7.558.398,00 cruzeiros. Em valores corrigidos, o montante corresponde a R$ 337.606,94, em atualização monetária pelo Índice de Preços do Consumidor (IPC-SP Fipe), feita por meio da Calculadora do Cidadão, ferramenta disponível no site do Banco Central.

Valor acordado entre o governo e a família Gracie foi de mais de 7 milhões de cruzeiros (Foto: Reprodução / Publicação Revista Instituto do Ceará)
Foto: Reprodução / Publicação Revista Instituto do Ceará Valor acordado entre o governo e a família Gracie foi de mais de 7 milhões de cruzeiros

O projeto arquitetônico do Abolição e do Mausoléu é do arquiteto Sérgio Bernardes, com jardins projetados pelo paisagista Fernando Chacel. Embora tenha sido encomendado em 1960, a pedra fundamental só foi lançada em novembro de 1962. As obras físicas foram iniciadas em 1965, na gestão do então governador Virgílio Távora (1979-1982) e já depois do golpe que levou Castello Branco ao poder.

Antes da inauguração, o Executivo era sediado no Palácio da Luz, no Centro. De lá para cá, o Abolição foi a casa de onze governadores.

Governadores que passaram pelo Abolição

  1. Plácido Castelo (1966-1971)
  2. César Cals (1971-1975)
  3. Adauto Bezerra (1975-1978)
  4. Waldemar Alcântara (1978-1979)
  5. Virgílio Távora (1979-1982)
  6. Manuel de Castro Filho (1982-1983)
  7. Gonzaga Mota (1983-1987)
  8. Cid Gomes (2007-2014)
  9. Camilo Santana (2015-2022)
  10. Izolda Cela (abril a dezembro de 2022)
  11. Elmano de Freitas (2023 - atualidade)

Outros governadores da história recente do Ceará não chegaram a despachar no local. Em 1987, o recém-empossado governador Tasso Jereissati transferiu a sede do Abolição para o Centro Administrativo Governador Virgílio Távora, no Cambeba, local onde ficaria por 16 anos, até outro governador, Lúcio Alcântara (2003-2006), transferiria novamente a sede, desta vez para o Palácio Iracema, antiga sede administrativa do Banco do Estado do Ceará (BEC).

O Abolição só voltaria a ser sede do governo em 2011, na segunda gestão Cid Gomes (2007-2014). Entre 2009 e 2010 o local passou por reformas e foi reinaugurado em março de 2011. De lá para cá, quatro governadores passaram pelo Abolição: o próprio Cid, o sucessor Camilo Santana (2015-2022), Izolda Cela (2022), vice de Camilo que assumiu após desincompatibilização, e Elmano de Freitas (2023-atualidade).

O terreno tem uma área de quase 4 mil metros quadrados e é formado por quatro edificações, sendo eles: o palácio em si; o gabinete de despacho (anexo); a capela (em uma das esquinas do terreno) e o Mausoléu e monumento em alusão ao ex-presidente Castello Branco, que ocupa quase um quarto do terreno segundo informações do governo.

Documentário

Humberto de Alencar Castello Branco foi o primeiro militar a comandar o Brasil após o golpe de 1964. O POVO lança, no próximo dia 18 o documentário: "Castello, o ditador". A obra conta como o cearense, tido como moderado, foi responsável por instalar a ditadura militar no país e possibilitar a continuidade do regime por mais de duas décadas.

No ano em que o golpe militar completa 60 anos, o filme traz de volta a memória da ditadura e mostra como Castello Branco influenciou o destino do país e a vida de cearenses que resistiram ao regime.

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