Embora o ex-ministro da Defesa, Aldo Rebelo, tenha ultrapassado os limites previstos para uma testemunha ao manifestar opiniões pessoais sobre a fala do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, a reação do ministro Alexandre de Moraes foi desproporcional. É o que diz o advogado criminalista e professor de Direito, Nestor Santiago.
O episódio ocorreu nesta sexta-feira, 23, durante o depoimento de Rebelo como testemunha de defesa do almirante Garnier, réu em ação penal sobre tentativa de golpe de Estado.
Rebelo tinha dito que a frase do ex-comandante Almir Garnier - sobre "deixar à disposição" do ex-presidente Jair Bolsonaro as tropas em caso de uma tentativa de golpe - "não pode ser tomada literalmente".
Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o repreendeu, pedindo que Rebelo se ativesse aos fatos. "A minha apreciação da língua portuguesa é minha e não admito censura", retrucou Rebelo. O ministro, então, ameaçou prender Rebelo.
Ao O POVO, Santiago destacou que Aldo Rebelo ultrapassou os limites legais ao apresentar opiniões pessoais, o que não é permitido pelo Código de Processo Penal. No entanto, Santiago destacou que caberia ao juiz apenas indeferir a resposta, não ameaçar com prisão.
“A testemunha erra ao dizer que não admite censura às suas respostas, porque o juiz tenha como função exatamente isso, indeferir perguntas impertinentes. Entretanto, penso que é um exagero de Moraes dizer que haveria desacato, e que por isso o ex-ministro poderia ser preso”, avaliou.
O jurista e mestre em Direito Penal Ronny Nunes também afirma que a ameaça de prisão foi exagerada, argumentando que uma testemunha pode relatar suas impressões, "como uma prova frágil que pode ser desmedida por outros".
"Não há problema nenhum da testemunha colocar uma impressão sobre uma frase que foi dita, ainda que ela não tenha presenciado a tal reunião, na qual o Almirante Garnier teria dito que colocaria as tropas à disposição do então presidente Bolsonaro", explica Ronny Nunes.
Segundo o professor Nunes, no caso de Rebelo, "nós temos que considerar que ele é um ex-ministro da Defesa, ele conhece esse meio, conhece o ambiente das Forças Armadas. Então, ainda que seja uma impressão, é uma impressão que merece consideração".
Por outro lado, Nestor Santiago diz que a testemunha é obrigada a falar a verdade. Ele cita o artigo 213 do Código de Processo Penal (CPP), que estabelece que o juiz não deve permitir que a testemunha manifeste apreciações pessoais, "salvo quando inseparáveis da narrativa do fato".