As autoridades dos Estados Unidos estão em ofensiva para enquadrar o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil, na Lei Global Magnitsky, algo sem precedentes para um ministro de uma corte suprema de uma democracia.
A lei, diferentemente da decisão anunciada na semana passada, estende a punição para além da concessão de visto. Entre as punições estão a proibição de viagem aos EUA, o congelamento de bens no país e o veto a qualquer empresa ou pessoa no país de realizar transações econômicas com o indivíduo punido.
Levantamento com base em mais de 2.250 registros de sanções aplicadas pela lei entre 2022 e 2025 mostra que os alvos típicos da medida são autoridades de regimes autoritários, integrantes de grupos terroristas, criminosos ligados a esquemas de lavagem de dinheiro e agentes de segurança acusados de assassinatos em série. O caso brasileiro, se concretrizado, rompe com o padrão histórico.
Visto é sempre precário
O advogado Marcelo Godke, doutor em Direito pela USP e especialista em Direito Internacional, explica que, "em tese", a medida pode ser aplicada ao ministro Alexandre de Moraes e que "vai depender do alcance da medida em si". "Todo visto de visitante é um "privilégio" emitido pelo país de destino. O mesmo se aplica ao Brasil, não só aos Estados Unidos".
"O visto de visitante, e mesmo o de residência, é sempre "precário" e pode ser revogado a qualquer momento a critério do país emissor e de acordo com sua conveniência. O período de validade não garante que o visto não seja revogado antes do prazo expirar", explica.
Segundo Godke, a medida pode ser aplicada a qualquer autoridade brasileira, de acordo com os interesses da atual gestão americana.
"O visto de visitante pode ser revogado, se o Governo dos EUA entender que é de sua conveniência revogá-lo", diz.
O que é a lei Magnitsky?
A Lei Magnitsky é dispositivo da legislação americana que permite que os Estados Unidos impor sanções econômicas a acusados de corrupção ou graves violações de direitos humanos.
Aprovada durante o governo de Barack Obama, em 2012, a lei prevê sanções como o bloqueio de contas bancárias e de bens em solo norte-americano, além da proibição de entrada no país.
A legislação foi criada após a morte de Sergei Magnitsky, advogado russo que denunciou esquema de corrupção envolvendo autoridades de seu país e morreu em uma prisão de Moscou, em 2009. Inicialmente, a lei tinha como foco punir os responsáveis pela morte dele.
Porém, em 2016, uma emenda ampliou o alcance, permitindo que qualquer pessoa envolvida em corrupção ou abusos contra os direitos humanos pudesse ser incluída na lista de sanções.
Quem pode ser punido pela lei?
Para que sanções sejam aplicadas contra indivíduos estrangeiros, o presidente dos Estados Unidos deve apresentar provas confiáveis de infrações, incluindo execuções extrajudiciais, tortura e outras violações graves dos direitos humanos. Essas medidas podem ser impostas a agentes que reprimem denúncias de corrupção, cerceiam liberdades fundamentais ou atuam contra eleições democráticas.
Funcionários de governos e associados podem ser sancionados caso estejam envolvidos em esquemas de corrupção significativa, como desvio de recursos públicos, suborno e lavagem de dinheiro. A lei também prevê punições para quem financiar ou apoiar materialmente essas atividades ilícitas, garantindo que os responsáveis sejam impedidos de movimentar bens e acessar o sistema financeiro dos EUA.
Os alvos da Lei Magnitsky são incluídos na lista de Cidadãos Especialmente Designados e Pessoas Bloqueadas (SDN list) do Agência de Controle de Ativos Estrangeiros dos EUA (OFAC, na sigla em inglês).
Quais são as sanções previstas?
Quem entra na lista pode enfrentar bloqueio de bens e contas bancárias no país, além de ter o visto cancelado e ser proibido de entrar nos EUA. Essas medidas são usadas contra pessoas, empresas ou organizações envolvidas em crimes financeiros ou violações de direitos humanos.
Para sair da lista, é preciso provar que não teve ligação com as atividades ilegais que levaram à punição, que já respondeu na Justiça por isso ou que mudou de comportamento de forma significativa.
Em alguns casos, as sanções podem ser retiradas se o governo americano entender que isso é importante para a segurança do país. O presidente deve avisar o Congresso com pelo menos 15 dias de antecedência antes de tomar essa decisão.
Quem decide quem é punido?
A decisão é do presidente dos Estados Unidos. Segundo o texto da lei Magnistksy, Donald Trump precisaria apresentar provas ao Congresso americano das supostas violações de direitos humanos. Vale lembrar que o republicano tem maioria nas duas Casas legislativas americanas.