Ao participar da tradicional missa de Santo Antônio, no domingo passado, 1º, na Igreja Matriz de Barbalha, a 548 quilômetros de Fortaleza, o ministro da Educação, Camilo Santana (PT), deu apenas uma certeza sobre 2026 no Ceará: "A única coisa que nós temos garantida hoje é a reeleição do governador Elmano, o resto ainda vamos discutir até a temporada das convenções", disse em relação às candidaturas de vice e senador na chapa de situação.
A metros do grupo estavam políticos de oposição, entre eles o ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, que dias antes havia se reunido com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Dois dias após compartilharem a cerimônia religiosa, RC anunciou a filiação ao União Brasil e, pelo menos no atual momento, é a mais provável alternativa de oposição para concorrer ao Governo do Ceará. Poderá ser a terceira vez que eles se enfrentam em disputas majoritátias na Capital ou no Estado.
Caso o confronto se confirme, irá configurar uma das maiores rivalidades da política estadual desde a redemocratização. Provavelmente o mais numeroso a alcançar abrangência estadual.
Eles se enfrentaram diretamente em eleições separadas por uma década, em 2012 e 2022, respectivamente, à Prefeitura de Fortaleza e ao Governo do Estado. No primeiro round, Elmano de Freitas (PT) era o candidato da então prefeita Luizianne Lins (PT) e Roberto, de Cid Gomes (PSB) e Ciro Gomes. O segundo levou a melhor.
Em 2022, Elmano era novamente o candidato de situação, reapaldado por Camilo e pela então governadora Izolda Cela. RC, com apoio de Ciro, mas não mais de Cid, ficou em terceiro lugar.
Nesse entremeio, ambos se enfrentaram ainda em 2016, quando Elmano foi candidato a vice-prefeito na chapa encabeçada por Luizianne. Na ocasião, Roberto Cláudio foi reeleito prefeito.
Para 2026, eles se tornaram os principais concorrentes, pelo capital político acumulado, analisa Paula Vieira, pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia, da Universidade Federal do Ceará (Lepem-UFC). "Eles tendem a ser competitivos um contra o outro", resume.
Com o alinhamento de RC à direita, a cientista política aponta que a polarização nacional tende a corroborar com essa rivalidade no Estado. "A gente tem visto no Brasil duas posições centrais: uma mais conservadora, de um partido mais conservador; e, de outro lado, o Partido dos Trabalhadores e seus aliados", contextualiza Paula.
Apesar disso, a candidatura do ex-prefeito ainda não é consenso dentro da oposição. Eduardo Girão (Novo) adiantou a largada antes de qualquer outro concorrente desta ala e tem sido crítico da postulação do ex-prefeito. Até Ciro Gomes (PDT) se colocou à disposição, mas já se recolheu. No PL, também há resistências localizadas.
Ainda pedetista e ligado a RC, o deputado estadual Cláudio Pinho diz que o ex-ministro "não se furtará ao chamamento da população para que ele seja candidato". "Pelo que eu escutei, a única definição que tem é que o PL já teria indicado o deputado Alcides Fernandes como pré-candidato ao Senado", acrescenta Pinho.
Elmano, por sua vez, endereça as discussões sobre a disputa eleitoral para o ano que vem, tentando direcionar o foco para entregas do Executivo estadual. Aliado do governador, o deputado estadual De Assis Diniz (PT) é enfático nesse aspecto.
"O que os cearenses esperam é que ele governe e não caia nessa armadilha de fazer a antecipação das eleições. Nós vamos discutir eleição em eleição", defende o petista. Pesquisa do Instituto Paraná, divulgada no fim de maio, apontou o governador com 42,8% das intenções de voto, seguido por Roberto Cláudio com 25%.
As eleições no Ceará são marcadas por confrontos que se repetem. Porém, não é comum que haja reedição de disputas no plano estadual. Em 40 anos de reabertura política, a única vez em que os mesmos candidatos se enfrentaram em duas ocasiões, estando entre os dois ou três mais competitivos, foi nas eleições de 2006 e 2010, quando Cid Gomes foi eleito e reeleito contra Lúcio Alcântara, segundo colocado em uma, terceiro na outra.
A se confirmar o cenário de momento, Elmano e Roberto Cláudio podem igualar as duas disputas estaduais, tendo ainda um confronto direto pela Prefeitura, e outro no qual um era cabeça de chapa e o outro concorria a vice-prefeito.
O embate mais frequente dos últimos anos, em eleições estaduais ou em Fortaleza, é entre o ex-senador Inácio Arruda (PCdoB) e o ex-deputado federal Moroni Torgan (hoje no Cidadania). Foi uma rivalidade principalmente municipal. Eles se enfrentaram quatro vezes em disputas majoritárias: em 2000, 2004 e 2012, pela Prefeitura de Fortaleza, e em 2006, pelo Senado. Em todas essas eleições, ambos figuraram entre os principais nomes. Mas só na única disputa estadual entre eles um dos dois saiu vencedor: quando Inácio se elegeu senador.
Inácio já tivera rivalidade marcante contra Juraci Magalhães. Enfrentaram-se em 1996 e 2000 — Juraci ganhou as duas.
Quatro vezes candidata, Luizianne travou algumas disputas recorrentes. Contra dois adversários, houve rivalidade entre os candidatos que estavam nas primeiras colocações. ContraMoroni Torgan, em 2004 e 2008, ela se elegeu e reelegei prefeita, tendo o oponente conservador como segundo colocado.
Em 2016 e 2020, ela foi adversária de Capitão Wagner (União Brasil). Em ambas ele foi segundo colocado e ela, a terceira.
A cientista política Paula Vieira explica que é comum haver duas figuras mais competitivas. "Às vezes aparece uma terceira figura que tenta entrar como uma terceira via, mas normalmente a gente tem dois nomes mais competitivos. Isso acontece desde a década de 1990 no Brasil e é parte, também, desse ciclo natural de alternância de poder", pondera.
Capitão Wagner já esteve em diferentes lados na rivalidade Elmano-RC
Na rivalidade entre Elmano de Freitas (PT) e Roberto Cláudio, Capitão Wagner (União Brasil) é personagem interessante. Presidente estadual do União Brasil, ele é uma das lideranças que defendem a unificação das forças conservadoras.
Nessa mobilização, na semana passada, o dirigente partidário recebeu o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio a caminho de se filiar ao União Brasil após deixar o PDT.
Ainda que hoje figure como adversário do governador Elmano de Freitas (PT), Wagner já esteve ao lado do petista. Em 2012, apoiou a candidatura do petista à Prefeitura de Fortaleza, contra o próprio Roberto Cláudio.
Em 2016, com Roberto em busca da reeleição e Elmano candidato a vice de Luizianne Lins (PT), Wagner era adversário de ambos. Foi ao segundo turno contra Roberto Cláudio, ainda no PDT, e perdeu.
Em 2020, foi novamente derrotado no segundo turno, desta vez por José Sarto (PDT), candidato de RC e dos irmãos Cid (hoje no PSB) e Ciro Gomes (PDT). Já em 2022, Wagner disputou o Governo do Estado tanto contra Elmano quanto contra Roberto. Ficou em segundo na disputa vencida por Elmano ainda no primeiro turno.
Para a cientista política Paula Vieira, pesquisadora do Laboratório de Estudos em Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará (Lepem-UFC), a movimentação atual se dá em torno da construção de uma "frente ampla conservadora", liderada por Roberto Cláudio, com o apoio de Wagner e outros nomes da oposição.
"Wagner já teve essa aproximação de apoio com algumas figuras da esquerda, mas ele não volta por esse caminho. Ele vai trazer um apoio forte para o RC, vai agregar o capital político nessa ideia da frente ampla do Estado. O papel dele vai ser esse", analisa a cientista política.
Essa postura, conforme explica Vieira, servirá para tornar mais competitiva a candidatura de RC. "O intuito é dizer e reforçar o que Roberto Cláudio representa. Representa, também, a pauta que está vinculada a ele; assim como André Fernandes vai apoiar o RC nesse mesmo sentido de: 'Olha, eu o apoio porque as pautas são afins, elas são próximas'".
Nesse cenário, o presidente do União Brasil tende a disputar uma vaga no Congresso Nacional — como deputado federal ou senador —, enquanto o ex-pedetista desponta como possível cabeça de chapa da oposição para o Governo do Estado.
Por ora, o único nome colocado publicamente pela direita para o Senado é o do deputado estadual Alcides Fernandes, pai do deputado federal André Fernandes, aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro.