A Coca-Cola planeja lançar uma nova versão do principal produto adoçado com açúcar de cana como parte de sua linha de produtos nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, o time de futebol americano Washington Commanders corre o risco de não ter um novo estádio caso não retome o nome original, Washington “Redskins”. Fora das fronteiras americanas, países dos quatro hemisférios estão em negociação comercial por causa de políticas tarifárias exorbitantes impostas pelo governo, que rompeu acordos e alianças diplomáticas históricas.
Com essas e outras ações, o presidente dos Estados Unidos da América, Donald Trump, coloca as cartas na mesa e aposta alto para mostrar que está disposto a redesenhar as regras do jogo.
Em abril, Trump anunciou lista de países cujos produtos seriam submetidos a tarifas elevadas ao entrarem no mercado americano. A medida tinha como principal objetivo pressionar parceiros comerciais a renegociar acordos considerados desfavoráveis pelos Estados Unidos, fortalecendo a posição do país nas tratativas internacionais.
Poucos dias para a aplicação prática das tarifas, alguns países já fecharam acordos com os Estados Unidos, como Reino Unido, Japão, Vietnã, Indonésia, Filipinas e, em parte, a China. Enquanto isso, blocos como a União Europeia e países como o Brasil e o Canadá ainda estão em negociação e enfrentam pressão com o prazo final imposto por Washington.
Por trás da retórica agressiva, das rupturas com alianças tradicionais e dos frequentes ataques a instituições internas e externas, a política do presidente norte-americano Donald Trump revela mais do que apenas impulsos nacionalistas: ela expressa o projeto político alinhado à extrema-direita global.
Em entrevista ao O POVO, Benjamin R. Teitelbaum, pesquisador da extrema direita nos Estados Unidos e na Europa, afirma que os elementos característicos desse campo político estão evidentes tanto na linguagem quanto nas ações de Trump, especialmente quando se trata de pautas como imigração, protecionismo comercial e soberania nacional.
Para ele, se observado a partir do denominador comum — as políticas para fortalecer fronteiras — “fica fácil ver como a política externa dele, especialmente na economia, voltada a acabar com o livre comércio e controlar os bens e dinheiro que entram e saem dos EUA, se alinha com a política doméstica dele”.
O estilo confrontacional adotado por Trump, que inclui ataques a organismos como a Organização das Nações Unidas (ONU) e membros do Brics, além de sucessivos embates comerciais com a China e críticas a blocos como a União Europeia e o Mercosul, não é apenas reação a pressões eleitorais.
Teitelbaum concorda que há uma estratégia de fundo. “Acho que é pensado e sincero. É uma das poucas posições ideológicas consistentes de Donald Trump, ele não gosta de ceder autoridade americana para organismos internacionais”, explica. “Acredito que ele tem uma oposição semiconsistente ao internacionalismo e à cooperação multilateral como fenômeno. A narrativa que ele construiu, que não vem de nenhum outro lugar nos EUA, é que o multilateralismo tem sido uma ferramenta para enfraquecer o poder dos EUA, e que ele existe para derrubar a hegemonia singular, que seríamos nós, é claro”, afirma o professor.
O advogado e consultor e especialista em Direito Internacional, Luiz Philipe Ferreira de Oliveira, considera que, atualmente, o Executivo nos Estados Unidos trabalha contra órgãos internacionais. “Ou seja, você tem hoje os Estados Unidos se tornando um país cada vez mais isolado e se alinhando a países mais ditatoriais”.
No entanto, ao tornar a atenção à guerra comercial, Trump reúne um histórico de recuos em suas medidas econômicas internacionais, especialmente quando enfrenta pressão interna ou quando suas decisões começam a afetar negativamente a economia dos Estados Unidos. “Ele começa essa briga com os países e, em muitos casos, sempre volta atrás nas ameaças”, acrescenta o advogado.
Os recuos de Trump levaram a frase “Trump Always Chickens Out” (Trump sempre amarela, em tradução livre) viralizar nas redes sociais com a sigla TACO, utilizada pela primeira vez por um colunista do jornal Financial Times.
Porém, Luiz Philipe destaca que a posição do presidente americano e as ações não são nenhuma surpresa. “Ele busca parceiros focados nesse mesmo princípio que eles têm hoje de um ‘reacionarismo’, mas esse movimento mais reacionário do que conservador, de fazer o enfrentamento às políticas de inclusão, de direitos humanos, está no projeto 2025, é sempre muito clara essa posição da campanha do Trump nesse sentido”, afirma o advogado.
Apesar das tensões, e da recente associação de Trump com o milionário Jeffrey Epstein, acusado de liderar uma rede de exploração e tráfico sexual de menores de idade, a base eleitoral do presidente é fiel. Benjamin R. Teitelbaum, que atualmente vive no Colorado, conta que as pautas tarifárias costumam ter apoio de boa parte da população.
“Quando você pergunta sobre tarifas em geral, geralmente há apoio. Quando se trata de confrontar a China, também costuma haver apoio. Mesmo com todas as mudanças recentes em sua política em relação à Rússia, confrontar a Rússia também tem apoio popular”, analisa Teitelbaum.
O professor americano conclui que há exemplos de um plano coerente do presidente, “mas eles se misturam com os caprichos e o ego de um presidente populista rebelde”.
Brigas na política interna
Universidades
Harvard e Columbia foram as primeiras universidades a serem atingidas pela nova Força-Tarefa de Combate ao Antissemitismo, medida do presidente dos EUA, que alega existir preconceito contra alunos judeus nas instituições. Columbia teve seu financiamento suspenso por conta de uma suposta falha da universidade em reprimir o antissemitismo no campus durante a guerra entre Israel e o Hamas e vem negociando um acordo com a Casa Branca. Já Harvard, negou as exigências de Trump e teve as verbas federais canceladas. Outras universidades foram afetadas com as medidas do governo americano
Washington Commands
Antes intitulados de Washington Redskins, os Commands foram ameaçados por Trump que disse que interferiria no planejamento de um novo estádio para o time caso eles não voltassem a se chamar "Redskins". A mudança do nome anterior para o atual foi resultado de constantes críticas alegando ser um termo pejorativo e racista contra os povos indígenas americanos. O time de beisebol, Cleveland Guardians também foi criticado por Trump por tirar o "Indians" do nome pelo mesmo motivo
Elon Musk
O empresário, que investiu milhões de dólares na campanha de Trump no ano passado, discutiu publicamente com o presidente dos EUA sobre o projeto de lei de política interna e tributária em junho, e o embate se alastrou por vários dias nas redes sociais. Trump chegou a ameaçar que haveriam "consequências sérias" se Elon Musk financiar candidatos democratas que concorram contra republicanos que votaram a favor de seu projeto de lei de corte de impostos.
Jeff Bezos
A Amazon, empresa de Bezos, avaliou detalhar o impacto das tarifas nos preços dos produtos que oferece aos clientes da Amazon Haul, plataforma de produtos de baixo custo da empresa. Em resposta, a Casa Branca classificou o planejamento como "hostil" e um "ato político", fazendo com que a Amazon voltasse atrás menos de uma semana depois. Trump elogiou o fundador da Amazon, Jeff Bezos, afirmando que ele "fez o correto" ao bloquear o plano
Coca-Cola
A gigante americana anunciou que planeja lançar uma nova versão de seu principal produto adoçado com açúcar de cana como parte de sua linha de produtos nos Estados Unidos, confirmando um plano apresentado pelo presidente Donald Trump na semana passada. A marca usa xarope de milho em seus produtos americanos, mas o secretário de Saúde de Trump, Robert F. Kennedy Jr., manifestou preocupação com os impactos do ingrediente na saúde
Nova York
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos entrou com um processo contra a cidade de Nova York, o prefeito Eric Adams e outros funcionários devido às suas leis de "cidade-santuário", que limitam a cooperação com agentes federais de imigração. A cidade permite à polícia se recusar a colaborar com agentes migratórios caso não apresentem um mandado judicial ou de prisão, e a compartilhar informações sobre imigrantes em situação irregular se há risco de deportação
Brigas na política externa
China
A relação entre Trump e a China deteriorou-se desde o primeiro mandato, com a guerra comercial iniciada em 2018, quando Trump impôs tarifas significativas sobre a China, que foram mantidas e ampliadas pelo sucessor, Joe Biden. Em 2024, a população dos EUA tiveram mais importações vindas da China do que os chineses importaram dos americanos. Trump implantou a política tarifária com o objetivo de diminuir a diferença entre o que os EUA importam e exportam de países como a China
Irã
Em 2018, Trump rompeu unilateralmente o Acordo Nuclear que tinha com Irã desde 2015, acusando o país de ser "patrocinador do terrorismo". Sanções econômicas severas foram reimpostas. Desde o começo da guerra de Israel contra o movimento islamita Hamas em outubro, os Estados Unidos vem intensificando o apoio militar a Israel. Em junho, os Estados Unidos atacaram diretamente alvos no Irã com a justificativa de que seria para impedir que o Irã produzisse armamentos nucleares
México
México é símbolo da política anti-imigração de Trump. O presidente ordenou a construção do muro na fronteira e também colocou o país no alvo da guerra comercial, anunciando tarifas de 25% a todos os produtos mexicanos importados, argumentando que o México não conseguiu controlar a entrada de imigrantes e da substância fentanil na fronteira com os EUA. A porcentagem das tarifas deve aumentar para 30% a partir de agosto de 2025
Canadá
Em 2018, EUA, Canadá e México assinaram o Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA) para reduzir os déficits comerciais dos EUA impondo tarifas significativas sobre a China. Apesar da relação histórica entre os países, Trump anunciou tarifas de 35% para produtos canadenses com a justificativa de que o Canadá estaria sendo "injusto" nas relações comerciais com os EUA e que o país canadense estaria permitindo a entrada de fentanil no território estadunidense
Brasil
Com argumentos políticos e comerciais, Trump definiu a aplicação de tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros importados pelos Estados Unidos. A medida do presidente dos EUA é uma resposta ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), réu por tentativa de golpe
União Europeia
Na mesma carta endereçada ao governo do México, Trump também anunciou a imposição de tarifas de 30% sobre as importações de produtos dos 27 países da União Europeia alegando que a relação entre EUA e UE não é recíproca e destacando os déficits comerciais do país americano. No início de 2025, o presidente americano ameaçou, inclusive, impor tarifas alfandegárias de 50%, justificando que os países "não estão tratando bem" os Estados Unidos.
Popularidade de Trump nos Estados Unidos
21/1: 51,6%
22/1: 51,6%
23/1: 52,4%
24/1: 51,9%
25/1: 51,9%
26/1: 51,6%
27/1: 50,8%
28/1: 50,6%
29/1: 50,5%
30/1: 50,6%
31/1: 49,9%
1º/2: 49,8%
2/2: 49,6%
3/2: 49,1%
4/2: 48,8%
5/2: 48,6%
6/2: 48,6%
7/2: 48,9%
8/2: 48,9%
9/2: 49,2%
10/2: 49,3%
11/2: 49,0%
12/2: 49,1%
13/2: 49,5%
14/2: 49,8%
15/2: 49,8%
16/2: 49,8%
17/2: 49,0%
18/2: 48,8%
19/2: 48,8%
20/2: 48,6%
21/2: 48,7%
22/2: 48,7%
23/2: 48,5%
24/2: 48,6%
25/2: 48,2%
26/2: 47,7%
27/2: 48,2%
28/2: 48,3%
1º/3: 48,3%
2/3: 48,2%
3/3: 48,2%
4/3: 48,1%
5/3: 48,0%
6/3: 48,0%
7/3: 48,1%
8/3: 48,1%
9/3: 48,1%
10/3: 47,9%
11/3: 48,0%
12/3: 47,8%
13/3: 47,3%
14/3: 47,5%
15/3: 47,7%
16/3: 47,7%
17/3: 47,5%
18/3: 47,6%
19/3: 47,5%
20/3: 47,4%
21/3: 47,5%
22/3: 47,5%
23/3: 47,5%
24/3: 47,5%
25/3: 47,5%
26/3: 47,7%
27/3: 47,4%
28/3: 47,4%
29/3: 47,4%
30/3: 47,6%
31/3: 47,2%
1º/4: 47,2%
2/4: 47,0%
3/4: 46,6%
4/4: 46,7%
5/4: 46,8%
6/4: 46,8%
7/4: 46,6%
8/4: 46,4%
9/4: 45,7%
10/4: 45,5%
11/4: 45,5%
12/4: 45,5%
13/4: 45,7%
14/4: 45,5%
15/4: 45,8%
16/4: 45,6%
17/4: 45,5%
18/4: 45,6%
19/4: 45,6%
20/4: 45,6%
21/4: 45,6%
22/4: 45,4%
23/4: 44,8%
24/4: 44,7%
25/4: 44,4%
26/4: 44,4%
27/4: 44,1%
28/4: 44,1%
29/4: 43,6%
30/4: 43,8%
1º/5: 43,9%
2/5: 44,2%
3/5: 44,2%
4/5: 44,2%
5/5: 44,2%
6/5: 44,2%
7/5: 44,2%
8/5: 44,3%
9/5: 44,4%
10/5: 44,4%
11/5: 44,4%
12/5: 44,6%
13/5: 44,7%
14/5: 45,0%
15/5: 45,0%
16/5: 45,3%
17/5: 45,4%
18/5: 45,4%
19/5: 45,6%
20/5: 46,2%
21/5: 46,1%
22/5: 46%
23/5: 46%
24/5: 46%
25/5: 46%
26/5: 46,1%
27/5: 46,1%
28/5: 46,2%
29/5: 46%
30/5: 45,9%
31/5: 45,9%
1º/6: 45,9%
2/6: 45,8%
3/6: 46,5%
4/6: 46,6%
5/6: 46,5%
6/6: 46,6%
7/6: 46,6%
8/6: 46,6%
9/6: 46,6%
10/6: 46,5%
11/6: 45,8%
12/6: 45,2%
13/6: 45,4%
14/6: 45,4%
15/6: 45,3%
16/6: 44,9%
17/6: 44,5%
18/6: 45,3%
19/6: 45,7%
20/6: 46,1%
21/6: 46,1%
22/6: 46,8%
23/6: 45,9%
24/6: 45,3%
25/6: 45,3%
26/6: 45,3%
27/6: 45,4%
28/6: 45,4%
29/6: 45,4%
30/6: 45,5%
1º/7: 45,2%
2/7: 44,9%
3/7: 44,9%
4/7: 44,9%
5/7: 44,9%
6/7: 44,9%
7/7: 44,9%
8/7: 44,8%
9/7: 44,8%
10/7: 44,8%
11/7: 44,7%
12/7: 44,7%
13/7: 44,7%
14/7: 44,5%
15/7: 44,4%
16/7: 44,1%
17/7: 43,8%
18/7: 44,1%
19/7: 44,1%
20/7: 44,0%
21/7: 43,7%
22/7: 43,5%
23/7: 43,8%
24/7: 43,9%
Fonte: Silver Bulletin
Guerra cultural marca segundo mandato
Além da guerra comercial, o segundo mandato do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, consolida agenda política marcada por embates culturais e ideológicos. A chamada "guerra cultural" nos EUA tem se manifestado em diferentes frentes: universidades, grandes marcas, imprensa, esportes, acordos internacionais e política externa.
Uma das trincheiras mais visíveis é o confronto com a imprensa. No mês passado, a relação entre Trump e apoiadores foi colocada à prova após o Wall Street Journal informar que o nome do presidente constava em documentos do Departamento de Justiça relacionados ao caso do magnata financeiro
Jeffrey Epstein.
A Casa Branca reagiu chamando a reportagem de "notícia falsa" e impediu um jornalista do veículo de participar da coletiva de imprensa sobre a viagem de Trump à Escócia. A Associated Press também entrou em confronto direto com o governo ao processá-lo por limitar o acesso de seus repórteres e fotógrafos ao Salão Oval. Em outro episódio, a Casa Branca atacou os criadores da série South Park após um episódio satirizar o presidente com o uso de inteligência artificial.
Segundo o pesquisador Benjamin R. Teitelbaum, Trump costuma agir com base nas próprias convicções, não em argumentos legais: "Ele diz que vai punir o país com base em algo no qual, na visão dele, o sistema legal está fazendo de errado. Isso é extrema direita no sentido de que as intuições do líder carismático são mais importantes que o processo legal."
Benjamin reitera que a ideia de Trump é fortalecer as fronteiras, podendo se expressar em termos de imigração, ou em tarifas e protecionismo econômico. Também pode se expressar em oposição à política cultural progressista, como o feminismo, pautas LGBTQIA e afins.
"Para ele, é criar um mundo onde as fronteiras nacionais têm valor tanto no que diz respeito às pessoas que entram e saem, quanto ao dinheiro e produtos que circulam. Ele quer que essas fronteiras signifiquem algo", conclui o pesquisador.