O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebeu em suas contas bancárias um volume total de R$ 30 milhões no período entre março de 2023 e fevereiro de 2024, de acordo com relatório de análise da Polícia Federal. As transações foram consideradas atípicas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que repassou as informações à PF. O documento aponta que essas movimentações indicam suspeitas de "lavagem de dinheiro e outros ilícitos".
O relatório da PF faz parte da investigação sobre tentativa de obstruir o julgamento da ação penal do golpe de Estado no Supremo Tribunal Federal. Nessa investigação, Bolsonaro e seu filho Eduardo foram indiciados pelos crimes de coação no curso de processo e abolição do estado democrático de direito. Procurada nesta quinta-feira, 21, a defesa do ex-presidente não havia se pronunciado sobre a movimentação financeira destacada pelo Coaf até a publicação deste texto.
O relatório relata cerca de 50 comunicações de movimentações atípicas envolvendo o ex-presidente e pessoas ligadas a ele, como o filho, Eduardo, e a esposa, Michele Bolsonaro. Das 50 comunicações, quatro informaram operações suspeitas em contas de Bolsonaro e outras quatro nas contas de Eduardo. Outras 42 operações foram feitas em contas de terceiros.
Segundo o relatório, a maior parte dos depósitos veio de transferências por Pix. O documento registra que Bolsonaro recebeu 1.214.254 depósitos via essa modalidade de transação.
No total, ele arrecadou R$ 19 milhões mediante Pix. O valor representa 64% do dinheiro que entrou nas contas de Bolsonaro. Os depósitos foram feitos por doações voluntárias de seguidores do ex-presidente principalmente em 2023. Na época, Bolsonaro agradeceu publicamente a ajuda financeira, mencionando a cifra de R$ 17 milhões.
A maior parte dessa movimentação foi destinada a pagamentos de advogados e depósitos em aplicações financeiras. "No período de 1/3/2023 a 7/2/2024, foram movimentados R$ 30.576.801,36 em créditos e R$ 30.595.430,71 em débitos", escreveu a Polícia Federal.
"As operações financeiras suspeitas de configurarem indícios de lavagem de dinheiro e outros ilícitos penais, tendo como principais envolvidos JAIR MESSIAS BOLSONARO e EDUARDO NANTES BOLSONARO", destacam os investigadores.
A PF também identificou um grande volume de transações no período de dezembro de 2024 a junho de 2025: R$ 22 milhões em movimentações. Foi nessa época que Bolsonaro transferiu R$ 2,1 milhões para seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e outros R$ 2 milhões para sua esposa Michelle.
Para a PF, os repasses a Eduardo serviram para financiar suas ações nos Estados Unidos contra o governo brasileiro, enquanto a transferência para Michelle tinha o objetivo de driblar um eventual bloqueio de suas contas bancárias. "O conjunto de elementos probatórios arrecadados indica, portanto, que o ex-presidente atuou deliberadamente, de forma livre e consciente[...]com a finalidade de se desfazer dos recursos financeiros que tinha em sua posse imediata", cita o texto.
Com base nos dados do Coaf, a PF também identificou movimentações atípicas de dois filhos do ex-presidente, Eduardo e Carlos, além de Michelle.
No caso da ex-primeira-dama, ela recebeu créditos de R$ 2,9 milhões entre setembro de 2023 e agosto de 2024, além de ter gastado R$ 3,3 milhões no mesmo período. A maior parte dos recebimentos foi proveniente de uma empresa da qual ela é sócia, a MPB Business, que creditou para ela R$ 1,9 milhão.
As transações de Eduardo Bolsonaro que foram consideradas atípicas incluem o recebimento de R$ 2,1 milhões transferidos por seu pai e uma operação de câmbio de R$ 1,6 milhão
Algumas das transações
Resumo de lançamentos
a crédito
Pix- R$ 19 milhões
CDB/RDB- R$ 8,7 milhões
Cambio - R$ 1,4 milhões
Proventos - R$ 373 mil
Transferências - R$ 304 mil
Resgates de aplicação - R$ 166 mil
Previdência privada - R$ 99 mil
DOC/TED - R$ 60 mil
Resumo de
lançamento
a débito
CDB/RDB -
R$ 18 milhões
DOC/TED - R$ 7 milhões
Pagamento título -
R$ 1,5 milhões
Pix - R$ 1,19 milhões
Previdência privada - R$ 749 mil
Estornos - R$ 733 mil
Saques - R$ 198 mil
Defesa de Bolsonaro se diz surpreendida com indiciamento
A defesa de Jair Bolsonaro disse ter sido surpreendida com o indiciamento de seu cliente por crime de coação no curso do processo e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.
Jair e Eduardo Bolsonaro, segundo a decisão, teriam atuado junto ao governo dos Estados Unidos com a finalidade de submeter o funcionamento da Suprema Corte brasileira "ao crivo de outro Estado estrangeiro".
"Os elementos apontados na decisão serão devidamente esclarecidos dentro do prazo assinado pelo ministro relator, observando-se, desde logo, que jamais houve o descumprimento de qualquer medida cautelar previamente imposta", diz a nota dos advogados de Bolsonaro.
O indiciamento foi anunciado pela Polícia Federal na noite da quarta-feira, 20, em meio à divulgação de uma série de mensagens e áudios do ex-presidente, em conversas com o pastor Silas Malafaia e com
Eduardo Bolsonaro.
O advogado e ex-secretário de Comunicação de Jair Bolsonaro, Fábio Wajngarten, afirmou que o ex-presidente "nunca cogitou sair do Brasil" e negou a existência de um plano de fuga para a Argentina.
A PF encontrou, no celular do ex-presidente, uma minuta de pedido de asilo político a Javier Milei, presidente do país vizinho. O documento foi editado pela última vez em fevereiro de 2024.
"O presidente Jair Bolsonaro NUNCA cogitou deixar o Brasil. Como ele mesmo sempre disse, o telefone dele, bem como do seu ajudante de ordens, sempre foram "aeroportos de mensagens" e ou "muros de lamentações" sem nenhuma opinião muito menos adjetivação. Essa é a verdade o resto é vazamento criminoso para dividir e constranger", escreveu Wajngarten em uma de suas redes sociais. (Agência Estado e Agência Brasil)