A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira um requerimento de retirada de pauta da Medida Provisória (MP) 1.303, com alternativas à elevação do Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF). Na prática, a ação impede a votação do texto, que precisava ser apreciado pela Câmara e pelo Senado até 23h59 para não perder a validade.
Por ser uma MP, o texto é publicado pelo governo e entra em vigor imediatamente - porém, para continuar válida após seis meses, ele precisa ser aprovado nas duas Casas do Congresso. O prazo para a aprovação da MP 1303 acabava nesta quarta-feira, e a Câmara votou para tirá-la da pauta. Assim, o texto caducou e deixou de ser válido.
Bancadas contrárias à MP decidiram fazer um acordo para retirar a matéria da pauta na intenção de evitar a exposição de derrubar o mérito. Foram 251 votos a favor da retirada de pauta, e 193 contrários.
O governo contava com os recursos da MP para fechar o orçamento de 2026. A versão original da MP propunha a taxação de bilionários, bancos e bets como forma de aumentar a arrecadação. A ideia era taxar a receita bruta das bets com alíquota entre 12% e 18%, além da taxação de aplicações financeiras, como as Letras de Crédito Agrário (LCA), de Crédito Imobiliário (LCI) e de Desenvolvimento (LCD), bem como juros sobre capital próprio.
A previsão inicial era arrecadar cerca de R$ 10,5 bilhões em 2025 e R$ 21 bilhões, em 2026. Com as negociações, a projeção caiu para R$ 17 bilhões. Os recursos iriam para o Orçamento como forma de cumprimento da meta de superávit. A proposta de Orçamento de 2026 tem meta de superávit de R$ 34,3 bilhões.
Com a não aprovação da MP, o governo deve fazer um novo bloqueio nas despesas de 2025, incluindo emendas parlamentares. A perda na arrecadação estimada é de R$ 35 bilhões em 2026.
Haddad, ainda ontem, afirmou que "voltaria à mesa" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) caso a MP fosse rejeitada, com novas opções. Segundo o ministro, o governo vai continuar perseguindo os mesmos objetivos, inclusive a meta fiscal - que, no ano que vem, é de um superávit primário de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB).
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse nesta quarta-feira que, se a MP não fosse aprovada, haveria um corte linear no orçamento, atingindo a todos os setores, inclusive as emendas parlamentares. Ele afirmou que o governo teria alternativas para fechar o orçamento mesmo sem o texto.
Parlamentares alinhados ao governo criticaram o que consideraram uma quebra de acordo no processo da MP. O relator, Carlos Zarattini (PT-SP), disse na tarde ontem que o acordo em torno do seu relatório foi "sabotado." Ele chegou a voltar atrás na tributação de títulos incentivados, como LCA e LCI, e no aumento dos impostos sobre bets.
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), e outros parlamentares petistas acusaram o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de atuar contra a MP, de olho nas eleições de 2026. As bancadas do União Brasil, PP e Republicanos, que reúnem 154 deputados, tinham fechado questão contra a matéria. O PSD, com 45 deputados, não fechou questão, mas definiu orientação contrária à MP.
Ao longo do dia, o governo fez tentativas para a aprovação. Lula entrou de cabeça e primeiro se reuniu com os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann para traçar estratégias de aprovação. Depois, a reunião foi com os líderes do governo no Congresso - José Guimarães, Randolfe Rodrigues e Jaques Wagner. Mesmo assim, a derrota era eminente.
Antes da análise na Câmara, o líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), Havia afirmado que uma eventual derrota poderia resultar no bloqueio de até R$ 10 bilhões em emendas parlamentares.
Após o resultado, Lula firmou que a decisão da Câmara dos Deputados contra a MP "não é uma derrota imposta ao governo, mas ao povo brasileiro". "A decisão da Câmara de derrubar a medida provisória que corrigia injustiças no sistema tributário não é uma derrota imposta ao governo, mas ao povo brasileiro. Essa medida reduzia distorções ao cobrar a parte justa de quem ganha e lucra mais. Dos mais ricos", disse. (Com João Paulo Biage/Correspondente O POVO em Brasília)