Israel informou, nesta quinta-feira, 9, que todas as partes assinaram a versão final da primeira fase do acordo com o Hamas para um cessar-fogo em Gaza e a libertação dos reféns israelenses, com o objetivo de pôr fim a dois anos de guerra.
Nas primeiras horas desta sexta-feira, 10, hora local, o governo israelense ratificou o acordo para garantir a libertação de todos os reféns retidos em Gaza, vivos e mortos, informou o gabinete do primeiro-ministro em comunicado.
"O governo acaba de aprovar o quadro para a libertação de todos os reféns, tanto os vivos quanto os mortos", diz o texto. Israel informou que o cessar-fogo começará nas 24 horas seguintes a essa aprovação.
Esse acordo entre Israel e o Hamas foi elaborado a partir de um plano de 20 pontos proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e prevê a libertação dos reféns israelenses que continuam vivos em troca da libertação de cerca de dois mil palestinos.
A libertação dos reféns "deveria pôr fim à guerra", disse o chanceler israelense, Gideon Saar, e o negociador-chefe do Hamas, Khalil al Hayya, afirmou ter obtido "garantias dos mediadores irmãos e da administração dos Estados Unidos confirmando que a guerra chegou ao fim".
A porta-voz do governo israelense, Shosh Bedrosian, informou que todas as partes assinaram, no Egito, a versão final desse acordo para a primeira fase do plano, após negociações indiretas na cidade turística de Sharm el-Sheikh, com a mediação de Estados Unidos, Catar e Turquia.
Em Khan Yunis, no sul da devastada Faixa de Gaza, palestinos aplaudiram e gritaram de alegria quando o acordo foi anunciado. "Apesar de todos os mortos e da perda de entes queridos, hoje estamos felizes após o cessar-fogo. Apesar da tristeza e de tudo, estamos felizes", afirmou Aiman al Najar.
Na Praça dos Reféns, em Tel Aviv, as pessoas também se abraçavam e se felicitavam com a esperança do retorno dos cerca de 20 sequestrados que ainda estão vivos.
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu celebrou "um grande dia para Israel" e declarou que Trump deveria receber o Prêmio Nobel da Paz.
Ainda persiste a incerteza sobre outros pontos levantados por Trump, como o desarmamento do Hamas e o fato de Gaza ser governada por uma autoridade de transição liderada por ele próprio.
O dirigente republicano detalhou que haverá um "desarmamento" na próxima fase do acordo e que a prioridade, por enquanto, é o retorno dos reféns.
O Hamas, por sua vez, rejeitou a ideia de uma autoridade de transição chefiada pelo próprio Trump. "Nenhum palestino poderá aceitar isso. Todas as facções, inclusive a Autoridade Palestina [que governa parcialmente a Cisjordânia ocupada], rejeitam", afirmou Osama Hamdan, dirigente do grupo islamista.
Trump anunciou que tentará viajar ao Egito para a assinatura do acordo de cessar-fogo, após ser convidado por seu homólogo Abdel Fatah al-Sisi.
O pacto busca encerrar dois anos de guerra em Gaza, um conflito que começou com o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023 em território israelense, que deixou 1.219 mortos, em sua maioria civis, segundo um balanço baseado em dados oficiais.
Em resposta, Israel lançou uma ofensiva que já deixou pelo menos 67.194 mortos em Gaza, de acordo com os números do Ministério da Saúde do governo do Hamas, considerados confiáveis pela ONU.
A porta-voz do governo israelense declarou que o proeminente prisioneiro palestino Marwan Barghuti, membro do Fatah, a facção palestina rival do Hamas, não fará parte da troca.
Após o anúncio, a Defesa Civil de Gaza informou sobre novos bombardeios israelenses.
Para que a troca seja concretizada, o Exército israelense anunciou que prepara a retirada de suas tropas do território palestino, do qual controla aproximadamente 75%.
Trump anunciou na rede social Truth Social que "TODOS os reféns serão libertados em breve e Israel retirará suas tropas para uma linha acordada, como primeiros passos rumo a uma paz forte, duradoura e eterna".
Das 251 pessoas sequestradas pelo movimento islamista em seu ataque de 2023, 47 ainda estão em Gaza, 25 das quais já morreram, segundo o Exército israelense.
Com o cessar-fogo, está previsto que pelo menos 400 caminhões de ajuda entrem diariamente na Faixa durante os primeiros cinco dias, informou uma fonte do Hamas.
O Crescente Vermelho egípcio afirmou que 153 caminhões já estavam a caminho.
Quase uma em cada seis crianças sofre de desnutrição aguda em Gaza devido à guerra, concluiu um estudo publicado na revista The Lancet e financiado pela Agência da ONU para os Refugiados Palestinos (UNRWA). (AFP)
Brasil comemora acordo e elogia esforço dos EUA
O governo brasileiro comemorou nessa quinta-feira, 9, o anúncio do acordo entre Israel e o Hamas para novo cessar-fogo na Faixa de Gaza. Em nota divulgada pelo Ministério das Relações Exteriores, o governo brasileiro também ressalta a dimensão humanitária do acordo e incentiva as partes a cumprirem todos os termos do tratado.
Mais cedo, o Hamas confirmou o fim da guerra, marcando o início de um cessar-fogo permanente. O governo brasileiro reconheceu o importante papel desempenhado pelos Estados Unidos e valoriza a atuação dos demais países mediadores: Catar, Egito e Turquia.
"O Brasil exorta as partes a cumprirem todos os termos do acordo e a engajarem-se de boa-fé em negociações para assegurar a efetivação da retirada completa das forças israelenses de Gaza, o início do urgente processo de reconstrução da Faixa, sob coordenação e supervisão palestina, e a restauração da unidade político-geográfica da Palestina sob seu legítimo governo, em consonância com o direito inalienável de autodeterminação do povo palestino", diz o comunicado do MRE.
Segundo o Itamaraty, o acordo, se for efetivamente implementado, deverá interromper os ataques israelenses contra Gaza.
O Itamaraty disse que o cessar-fogo deverá resultar em alívio efetivo para a população civil e reiterou a necessidade de "assegurar acesso pleno, imediato, seguro e desimpedido da assistência humanitária e das equipes das Nações Unidas que atuam no terreno".
Segundo o MRE, uma paz justa, estável e duradoura no Oriente Médio passa pela implementação da solução de dois Estados. "Com um Estado da Palestina independente e viável, vivendo lado a lado com Israel, em paz e segurança, dentro das fronteiras de 1967, incluindo a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, tendo Jerusalém Oriental como sua capital", diz a nota do governo. (Agência Brasil)
O que se sabe sobre o acordo para cessar-fogo em Gaza
O que contempla o acordo?
Está prevista a libertação de 20 reféns israelenses que estão vivos em troca da soltura de dois mil palestinos presos em prisões israelenses: 250 condenados à prisão perpétua e outros 1,7 mil detidos por Israel desde 7 de outubro de 2023.
A troca deverá ocorrer nas primeiras 72 horas de implementação do cessar-fogo, aprovado por outras organizações palestinas. Trump apontou a segunda-feira como data para a libertação dos reféns.
O acordo também prevê a "retirada programada das tropas israelenses", junto com a entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza, que segundo a ONU enfrenta uma situação de fome.
Estima-se que pelo menos 400 caminhões de ajuda humanitária entrarão diariamente na Faixa de Gaza nos primeiros cinco dias após o cessar-fogo, e que esse número aumentará com o passar dos dias, disse uma fonte do movimento islamista.
Também prevê o "retorno das pessoas deslocadas" do sul da Faixa de Gaza à Cidade de Gaza e outras localidades do norte do território palestino, acrescentou este dirigente.
O Hamas pediu a Trump que pressione Israel para aplicar plenamente o acordo no que lhe diz respeito.
Lista de presos palestinos
Um tema-chave nas negociações é a lista de presos palestinos que o Hamas deseja incluir na troca.
Marwan Barghuti, um membro proeminente do Fatah, a facção palestina rival do Hamas, está na lista, informaram meios de comunicação egípcios ligados ao governo.
Barghuti está preso em Israel há mais de vinte anos e cumpre prisão perpétua por seu papel em atentados anti-israelenses. No entanto, ele goza de grande popularidade nas pesquisas sobre lideranças palestinas.
Questões pendentes
O recente plano de 20 pontos estabelecido por Trump, que serviu de base para as negociações, estipula o desarmamento do Hamas e que Gaza seja governada após a guerra por uma autoridade de transição liderada por ele mesmo.
Essas questões ainda não foram abordadas.
O presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, expressou nessa quinta-feira a esperança de que o acordo possa levar ao estabelecimento de um Estado palestino independente.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e os membros de sua coalizão de governo são contra a solução de dois Estados.
O plano da ONU para os 60 primeiros dias após o cessar-fogo em Gaza
A ONU afirmou que está pronta para lançar, em seguida à entrada em vigor de um cessar-fogo na Faixa de Gaza, um plano de 60 dias, para o qual dispõe de 170 mil toneladas de ajuda.
Centenas de caminhões por dia serão mobilizados para implementar o plano de ajuda a uma população à qual Israel não permite há meses o acesso a alimentos e medicamentos, entre outros itens de primeira necessidade.
"Nosso plano, detalhado e testado, está em andamento. Nossos suprimentos — 170 mil toneladas de alimentos, medicamentos e outros bens — estão disponíveis. Nossas equipes corajosas, experientes e decididas estão preparadas", disse Tom Fletcher, chefe humanitário da ONU, na Arábia Saudita.
Água e alimentos
"A fome deve ser revertida nos lugares em que se enraizou, e prevenida nos demais", acrescentou Fletcher.
O plano vai oferecer ajuda alimentar a 2,1 milhões de pessoas, e assistência nutricional mais específica a 500 mil que sofrem de desnutrição severa. Ele inclui o apoio a padarias e cozinhas comunitárias, e dinheiro em espécie para que 200 mil famílias comprem os alimentos que desejarem.
A ONU também pretende fornecer serviço de água e esgoto a 1,4 milhão de pessoas. "Vamos ajudar a reparar a rede de distribuição de água e os vazamentos de esgoto. Vamos retirar os resíduos das áreas residenciais e oferecer produtos de higiene", informou o funcionário da ONU.
Saúde, educação, abrigos
A ONU vai trabalhar para restaurar o sistema de saúde, que foi "dizimado", fornecer mais equipamentos e medicamentos, aumentar as evacuações médicas, mobilizar mais equipes de emergência e fortalecer o atendimento básico e a saúde mental.
Está prevista a distribuição de milhares de barracas de campanha por semana. O plano também inclui a reabertura de centros de ensino temporários para 700 mil crianças.
Dinheiro necessário
"Para que tudo isso seja possível, precisamos de dez coisas", disse Fletcher, que mencionou, entre essas condições, a entrada de "ao menos 1,9 milhão de litros de combustível por semana", o restabelecimento do gás de cozinha e a abertura de todos os postos de fronteira com mais scanners, para agilizar a autorização dos envios e a segurança. E também que a população assistida possa ter livre acesso à ajuda enviada, assim como fundos para o plano.
"Até o momento, apenas 28% do plano humanitário de US$ 4 bilhões (R$ 21 bilhões) para 2025 nos territórios palestinos foi financiado", lamentou o funcionário.
A ONU vai precisar de fundos para superar as 170 mil toneladas de ajuda - principalmente em Israel, Jordânia, Egito e Chipre -, que não serão suficientes para cobrir os primeiros 60 dias. "Sejamos claros: este problema não vai desaparecer em dois meses", ressaltou Fletcher.
Habitantes de Gaza celebram com euforia anúncio de acordo para encerrar a guerra
Com gritos de alegria, aplausos e danças, os palestinos do sul de Gaza receberam com euforia o anúncio de um acordo de cessar-fogo entre Israel e Hamas, para levar ao fim de uma guerra que deixou o território em ruínas.
Um grupo de mais de dez jovens celebrou entoando "Allahu akbar" — Alá é o maior — em frente ao hospital Nasser de Khan Yunis, pouco depois de ouvir a notícia.
"Agradecemos a Deus por este cessar-fogo, agradecemos pelo fim do derramamento de sangue", disse Abdelmajid Abedrabbo, um morador do sul de Gaza.
"Toda a Faixa de Gaza está alegre, todo o mundo árabe está contente com o cessar-fogo", adicionou, agradecendo também a "todos aqueles que nos apoiaram e desempenharam seu papel na hora de pôr fim ao derramamento de sangue".
Segundo Khaled al-Namnam, um deslocado no campo de Al Maghazi, no centro de Gaza, "é um sentimento estranho e indecifrável depois de dois anos de bombardeios, medo, terror e fome. É como se nascêssemos de novo", comentou o homem de 26 anos.
"Acordei esta manhã com essa linda notícia (...) todo mundo estava falando do fim da guerra, que entrará a ajuda humanitária e abrirão os postos fronteiriços. Sinto uma enorme alegria", declarou por telefone à AFP.
"Apesar de tantos feridos e tantas mortes, e da perda de entes queridos e familiares, hoje estamos felizes com o cessar-fogo", disse Ayman al-Najjar, em Khan Yunis.
"Perdi meus primos e vários amigos, e há uma semana, meu querido avô, que descanse em paz. Mas, apesar de tudo isso, hoje estamos felizes", afirmou.
"Graças a Deus, o presidente Trump anunciou que a guerra acabou. Estamos muito felizes", diz Wael Radwan. (AFP)
"Eles estão voltando", comemoram israelenses em Tel Aviv após anúncio
Milhares de israelenses se reuniram nessa quinta-feira, 9, em uma praça de Tel Aviv que reúne as famílias dos reféns retidos em Gaza há dois anos, na esperança do retorno dos sequestrados após dois anos de suspense.
Muitos carregavam adesivos com o slogan "Eles estão voltando para casa", bandeiras israelenses e americanas e cartazes com os rostos dos reféns, após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciar um acordo entre negociadores israelenses e o Hamas para a libertação dos reféns e um cessar-fogo em Gaza.
Um grupo de israelenses radiantes cantava e dançava danças tradicionais, enquanto outros pulavam de alegria em uma praça central de Tel Aviv, conhecida como "Praça dos Reféns" desde o início da guerra em Gaza após o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023.
Nesse ataque, 1.219 pessoas morreram, a maioria civis, segundo uma contagem baseada em dados oficiais. Naquele dia, comandos islamistas sequestraram 251 pessoas, 47 das quais permanecem reféns em Gaza e dentre elas 25 morreram, segundo o exército israelense.
Há dois anos, esta praça é palco de manifestações exigindo a devolução dos reféns. "Esperamos por este dia há 734 dias. Não conseguimos imaginar estar em outro lugar esta manhã", disse Laurence Ytzhak, de 54 anos.
"Nós amamos Trump", dizia uma placa em inglês erguida por uma mulher vestida de Tio Sam, a personificação dos Estados Unidos, usando um chapéu azul com estrelas brancas e um vestido listrado de vermelho e branco.
Ao lado dela, um homem de terno usava uma máscara de Donald Trump com as bandeiras dos Estados Unidos e de Israel.
O Fórum das Famílias de Reféns, a principal organização de familiares dos reféns, convidou o presidente dos EUA para se encontrar com seus representantes quando ele viajar a Israel. (AFP)