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Governo e Supremo miram mudanças em transporte coletivo, individual e por aplicativo
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Governo e Supremo miram mudanças em transporte coletivo, individual e por aplicativo

Propostas como passe livre nos coletivos e fim da obrigatoriedade de autoescola estão em avaliação pelo governo, de olho em reeleição. No STF, debate envolve vínculos trabalhistas de trabalhadores por aplicativo
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Transporte coletivo e individual são objetos de estudos para possíveis e importantes mudanças que podem atingir ônibus, carros e motos (Foto: AURÉLIO ALVES)
Foto: AURÉLIO ALVES Transporte coletivo e individual são objetos de estudos para possíveis e importantes mudanças que podem atingir ônibus, carros e motos

A mobilidade urbana está na mira do Governo Federal e do Supremo Tribunal Federal (STF). Muitas vezes tratada como questão prioritariamente das prefeituras, a questão do transporte, tanto coletivo quanto individual, se torna alvo dos poderes em nível federal. Mudanças importantes estão em fase de estudo na esfera administrativa. Já no âmbito do Judiciário, definição crucial pode ocorrer até novembro.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) autorizou dois estudos sobre medidas de impacto para o transporte público e para o particular. Ao Ministério da Fazenda, foi solicitada avaliação da viabilidade de adotar tarifa zero nos ônibus e outros modais de transporte coletivo.

Além disso, também deu o aval para o Ministério dos Transportes levar adiante a discussão sobre o fim da obrigatoriedade de cursar autoescola para tirar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O objetivo é baratear o processo.

As duas medidas têm enorme apelo popular. Embora estejam ainda em estágio inicial e sem perspectiva de serem adotadas em curto prazo, as medidas são vistas como trunfo para turbinar a campanha de reeleição de Lula. Principalmente o passe livre nos ônibus.

O entorno do presidente considera que a medida viria na esteira da aprovação do projeto de isenção do pagamento de Imposto de Renda para os mais pobres, que passou pela Câmara dos Deputados e cuja aprovação no Senado também é dada como certa. O benefício é considerado no Palácio do Planalto um reforço ao argumento de campanha a ser construído para 2026 a respeito do que será feito em caso de um novo mandato.

"Se Lula prometeu isenção de imposto para quem ganha até R$ 5 mil e entregou, o eleitor sabe que, se ele prometer tarifa zero para ônibus em outro próximo mandato, também cumprirá", afirmou um integrante do governo. Assim, é possível que a mobilidade urbana tenha inédito protagonismo numa campanha eleitoral para presidente da República.

Na esfera do Judiciário, está em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento sobre o reconhecimento de vínculo empregatício entre entregadores e motoristas de aplicativos e as plataformas digitais. A controvérsia é conhecida como uberização das relações de trabalho.

A decisão a ser tomada pela Corte terá impacto em 10 mil processos que estão parados em todo o Brasil à espera do posicionamento do plenário.

Estão em julgamento duas ações que são relatadas pelos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes e chegaram ao Supremo a partir de recursos protocolados pelas plataformas Rappi e Uber.

Em conjunto, as medidas podem transformar praticamente todas as formas de transporte urbano motorizado: o público, o particular e o serviço individual para passageiros. Desde as formas de acesso e financiamento, a formação de condutores até as relações de trabalho. (Com Agência Estado e Agência Brasil)

FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 30-04-2025: Estações de ônibus da Avenida Bezerra de Menezes são interditadas devido às obras de recuperação do pavimento, passageiros estão embarcando pela calçada. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)
FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 30-04-2025: Estações de ônibus da Avenida Bezerra de Menezes são interditadas devido às obras de recuperação do pavimento, passageiros estão embarcando pela calçada. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)

O que está em análise sobre passe livre no transporte público

Os estudos realizados pelo governo não vislumbram hipótese de tarifa zero para transporte público até o próximo ano, antes das eleições.

O prazo para colocar o projeto de pé é exíguo antes de a lei eleitoral proibir a entrada em vigor de uma novidade dessa magnitude. E o esboço do que poderia ser o programa é tão preliminar no momento que não seria viável nem mesmo apresentar cenários à população por enquanto.

A análise sobre o custo da gratuidade do transporte público em todo o território nacional foi pedido por Lula ao Ministério da Fazenda em agosto.

A Confederação Nacional do Transporte (CNT) estima que a gratuidade do transporte público em todo o Brasil em ônibus, trem e metrô teria custo anual de aproximadamente R$ 90 bilhões.

Entre os diversos pontos a serem levantados no estudo do governo estão o custo do setor, o quanto o poder público está colocando de subsídio no sistema, o quanto as empresas, mediante o vale-transporte, estão aportando e o quanto sai do bolso do trabalhador. Além disso, o governo quer entender, segundo o ministro Fernando Haddad, quais são "os gargalos tecnológicos e as possibilidades tecnológicas".

Além disso, o cálculo pretende projetar quanto dos recursos que seriam destinados ao deslocamento acabará sendo reinjetado na economia por meio de consumo de bens e serviços. Ou seja, qual o impacto econômico da movimentação do dinheiro do orçamento das famílias que é hoje usado para pagar transporte público e poderia ser usado de outras maneiras. E quanto de arrecadação decorrente disso também pode proporcionar. Cálculos sempre complicados de incluir em modelos do tipo.

"Nesse momento, estamos fazendo uma radiografia do setor, a pedido do presidente. Tem vários estudos que estão sendo recuperados pela Fazenda, para verificar se existem outras formas mais adequadas de financiar o setor", afirmou o ministro Fernando Haddad.

Alguns trabalhos recentes nessa direção (um de 2023 e outro de 2024) já foram feitos pelo setor privado, com retornos positivos. O próprio ministro Fernando Haddad já se deparou com uma proposta nesse sentido e sem impacto no resultado primário, há 13 anos, quando o reajuste de 20 centavos das passagens promoveu um levante popular que foi ampliado para várias outras áreas e culminou no impeachment da então presidente Dilma Rousseff.

Além de certamente ser bem recebido pela população, o fim da cobrança nos transportes teria impacto também no controle da inflação, diminuindo — ainda que em pequena parte — o esforço do Banco Central de buscar a meta de 3% estipulada até 2027.

O transporte público não tem um peso próprio diretamente como o grupo "Transportes" no cálculo do IPCA, mas é um subitem da categoria. A influência no índice depende do reajuste de tarifas locais e é mais visível quando há aumento de passagens de ônibus urbano em grandes cidades.

O modelo de transporte gratuito é adotado integralmente em 136 municípios, a maioria de pequeno e médio porte. O maior município do Brasil com gratuidade integral é Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza, onde a manutenção do programa tem sido um desafio orçamentário.

Em algumas capitais, como Brasília e São Paulo, a gratuidade ocorre apenas aos domingos e feriados.

No começo do mês, movimentos sociais se reuniram em Brasília para pressionar o governo e o Congresso Nacional na discussão desse tema. A Caravana pela Tarifa Zero foi uma ação nacional articulada pelo Movimento Passe Livre (MPL) e promoveu aulas e audiências públicas, panfletagem e reuniões com parlamentares e representantes do Poder Executivo para discutir as alternativas de implantação da gratuidade no transporte. (Agência Estado e Agência Brasil)

Matrículas já podem ser feitas desde segunda, 22, mas sindicato ainda aguarda Departamento Estadual de Trânsito (Detran-Ce) regularizar aulas técnico-teóricas.
Matrículas já podem ser feitas desde segunda, 22, mas sindicato ainda aguarda Departamento Estadual de Trânsito (Detran-Ce) regularizar aulas técnico-teóricas.

Como seria para tirar habilitação sem autoescola obrigatória

O Ministério dos Transportes teve aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para levar adiante a discussão sobre o fim da obrigatoriedade de aulas em autoescola para tirar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Está aberta até 2 de novembro consulta pública sobre o tema. Na primeira quinzena, o número de contribuições passou de 20 mil.

A autorização dada pelo presidente não foi para que o governo já leve adiante a partir de agora a proposta de acabar com a obrigatoriedade das autoescolas, mas para que o ministério abra o processo de debate.

Pela proposta em discussão, na parte teórica, deixará de ser obrigatório realizar curso e cumprir 45 horas de aula. Será possível seguir com curso presencial ou então ter aulas online, ou ainda em formato híbrido. Haveria opções de autoescolas tradicionais ou com aulas a distância. Seria ainda possível optar pela realização de curso online a ser oferecido pelo Ministério dos Transportes ou de escolas de trânsito de instituições como Detran ou autarquias municipais ou ainda instituições credenciadas. A prova teórica, ainda obrigatória, poderia ser feita de forma presencial ou online.

A principal mudança é o fim de aulas práticas, atualmente com carga horária mínima de 20 horas. Continuará havendo oferta de autoescolas, mas a proposta é de haver opção de contratar instrutores credenciados pelo Detran. Poderão ser usado veículo disponibilizado pelo instrutor ou do próprio candidato.

Seguem obrigatórias etapas como avaliação psicológica e exame de aptidão física, em clínicas credenciadas. O exame prático de direção também segue obrigatório.

O ministro Renan Filho tem defendido o fim da obrigatoriedade das aulas. O principal argumento é econômico. Hoje, o custo médio para a habilitação é de mais de R$ 3 mil. O ministério estima que o custo possa cair até 80% com a proposta. A estimativa é que o valor fique em torno de R$ 700 reais. Por outro lado, quem oferece o serviço diz que milhares de empregos serão perdidos.

De acordo com o Ministério dos Transportes, o custo impede que parte da população tenha acesso à CNH. Entre os proprietários de motocicletas e outros veículos de duas rodas, 45% pilotam sem ter carteira; na categoria B, de veículos de passeio, 39% dirigem sem habilitação.

"O Brasil tem, ao mesmo tempo, uma CNH cara e muitos acidentes de trânsito. Então, qual é o problema: a formação está ruim, apesar de cara, ou muita gente está dirigindo sem carteira porque não pode pagar?", questiona o ministro Renan Filho.

Em uma nota pública, a Federação Nacional das Autoescolas do Brasil (Feneauto) apontou o risco de fechamento de 15 mil empresas, com a extinção de 300 mil postos de trabalho. Apontou, ainda, um retrocesso na educação para o trânsito. (Agência Estado, Agência Brasil e Agência Câmara)

FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 10-02-2024: Circulação de moto uber nas ruas da capital cearense. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)
FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 10-02-2024: Circulação de moto uber nas ruas da capital cearense. (Foto: Samuel Setubal/ O Povo)

STF decide futuro do transporte por aplicativo e dos trabalhadores do setor

Está em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento sobre o reconhecimento de vínculo empregatício de entregadores e motoristas que trabalham por aplicativos de plataformas digitais.

O presidente do STF, ministro Edson Fachin, informou que a votação deve ocorrer no início de novembro. A previsão foi anunciada após a Corte ouvir novas sustentações orais das defesas das empresas que operam os aplicativos e entidades que defendem o reconhecimento do vínculo.

As empresas contestam decisões da Justiça do Trabalho que reconheceram o vínculo empregatício com os motoristas e entregadores.

A Rappi sustentou que a empresa é uma plataforma digital que faz a "união digital" entre quem quer vender um serviço e quem quer comprar. A empresa alegou que as decisões trabalhistas que reconheceram o vínculo de emprego com a empresa desrespeitaram posição da própria Corte que entende não haver relação de emprego formal com os entregadores.

A Uber também aponta que é uma empresa de tecnologia, e não do ramo de transportes, e que o reconhecimento de vínculo trabalhista altera a finalidade do negócio da plataforma, violando o princípio constitucional da livre iniciativa de atividade econômica.

A empresa argumenta que o que faz é uma "intermediação tecnológica" com os motoristas, que são responsáveis pelas corridas. Segundo a plataforma, o reconhecimento do vínculo poderia reduzir o ganho dos motoristas.

Além das defesas das plataformas, os ministros escutam durante o julgamento as sustentações orais de entidades que defendem o reconhecimento do vínculo trabalhista de motoristas e entregadores.

A Associação dos Trabalhadores por Aplicativo Motociclistas do Distrito Federal e Entorno (Atam-DF) destacou que a modalidade de trabalho é precarizada e disse que não pode ser criada uma "casta" de trabalhadores sem direitos.

O advogado-geral da União, Jorge Messias, também se manifestou durante o julgamento, e defendeu que os trabalhadores devem ter direitos básicos assegurados. (Agência Brasil)

Quais as mudanças em vista

Transporte coletivo

Fase: em estudo

Ministério da Fazenda faz os cálculos sobre quanto custaria a gratuidade do transporte público em todo o território nacional em ônibus, trem e metrô.

Análise contabiliza os custos do setor e quanto o poder público já paga em subsídios, quanto as empresas aportam em vale-transporte e quanto o trabalhador paga.

Também é contabilizado quanto retornaria para movimentar a economia, na forma de consumo, com o dinheiro que as famílias deixariam de gastar com as tarifas

Transporte já é gratuito em 136 municípios, a maioria de pequeno e médio porte. Caucaia, segundo maior município do Ceará, é o maior do Brasil com passe livre de graça, mas a Prefeitura enfrenta dificuldades para manter o serviço. Capitais como Brasília e São Paulo têm transporte grátis apenas aos domingos.

Transporte particular

Fase: em discussão

Ministério dos Transportes realiza consulta pública sobre o fim da obrigatoriedade de aulas em autoescola para tirar habilitação

A proposta é que deixem de ser obrigatórias tanta as aulas teóricas quanto práticas em autoescolas

Na parte teórica, seria possível optar entre curso presencial, aulas online ou ainda em formato híbrido

Na parte prática, seria possível escolher entre autoescolas ou a contratação de instrutores credenciados pelo Detran

Seguem obrigatórias prova teórica e prática, além de avaliação psicológica e exame de saúde, em clínicas credenciadas

Transporte por aplicativo

Fase: em julgamento

Supremo Tribunal Federal (STF) julga até o começo de novembro o reconhecimento de vínculo empregatício de entregadores e motoristas que trabalham por aplicativos de plataformas digitais como Uber, Rappi e 99

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