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Em empate inédito no TRE-CE, prefeito de Iguatu escapa de cassação
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Em empate inédito no TRE-CE, prefeito de Iguatu escapa de cassação

Placar em 3 a 3. Justiça Eleitora manteve cargos
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Roberto Filho e Francisco das Frutas, respectivamente, prefeito e vice de Iguatu (Foto: Reprodução/Instagram)
Foto: Reprodução/Instagram Roberto Filho e Francisco das Frutas, respectivamente, prefeito e vice de Iguatu

Após empate nos votos da corte, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) considerou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) que pedia a cassação do prefeito de IguatuRoberto Filho (PSDB), e do vice-prefeito do município Francisco das Frutas (PSDB), sob acusação de abuso de poder e captação ilícita de sufrágio (compra de votos).

A ação poderia gerar, além da cassação do diploma da chapa, a perda dos mandatos e realização de novas eleições no Município, distante 325 quilômetros de Fortaleza. 

Após novo pedido de vista, na sessão de 11 de novembro, o julgamento foi retomado na manhã desta sexta-feira, 14, com o único voto restante, o da desembargadora eleitoral Maria Iraneide Moura Silva, presidente do colegiado. O placar de momento era de 3 a 2 a favor cassação e da realização de novas eleições no Município.

A desembargadora acompanhou a divergência para julgar improcedente a Aije, por falta de prova idônea suficiente à condenação. "Pedi vistas para analisar com maior cautela o conjunto probatório diante da gravidade das acusações e suas consequências. O acervo fático não sustenta a condenação dos investigados por abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio, razão pela qual acompanho a divergência", informou logo no início do voto.

Empate mantém decisão popular

Devido ao colegiado estar desfalcado de um membro, ficando com número par de desembargadores eleitorais, foi possível chegar no ineditismo do empate, como destacaram os presentes.

Diante disso, a presidente indagou aos colegas como entendiam que deveria ser procedido. De forma unânime, os desembargadores votaram pela manutenção da soberania popular, com o respeito ao que fora decidido nas eleições de 2024, mantendo-se os mandatos de prefeito e vice de Iguatu.

Mesmo tendo votado pela cassação, o desembargador Daniel Carvalho Carneiro explicou que há uma sentença (inocentando os réus), que foi objeto de recurso, não tendo havido entre a corte maioria para a reforma da sentença, devendo assim ser mantida a decisão da instância anterior.

"O princípio maior da Justiça Eleitoral é a soberania popular. Não alcançamos uma maioria, que sirva como precedente", afirmou, recebendo a concordância de seus pares.

Desta forma, a presidente Maria Iraneide concordou que o julgamento estava encerrado.

Após a decisão, o advogado da coligação adversário, que ingressou na Justiça Eleitoral, Pedro Teixeira Cavalcante Neto, afirmou ao O POVO estar analisando se irá opor embargos de declaração ou recurso especial.

O voto

Antes da decisão do que fazer após o empate, a presidente desembargadora eleitoral Maria Iraneide votou por cerca de 30 minutos.

Maria Iraneide justificou a divergência da relatoria, que pedia a cassação, afirmando não poder admitir que "presunções e indícios que, embora traga graves acusações de natureza criminal, não guardam prova robusta de ligação direta de ligação com o pleito eleitoral propriamente dito, sirvam de base para medidas tão gravosas como a cassação de mandato e a declaração de inelegibilidade".

A desembargadora admitiu, no entanto, haver vínculo pessoal do candidato e da advogada Márcia Rúbia, com a utilização do escritório dela como ponto informal de campanha, além de uma transferência feita a pedido da advogada a pessoa indicada (Thiago Fumaça), no valor de R$ 10 mil. "É fato ainda que o prefeito esteve no escritório algumas vezes e que Tiago tem influência em locais do Município", disse.

"Tais fatos, todavia, não são suficientes por si sós para comprovar a configuração dos ilícitos eleitorais apontados", explicou.

A presidente destacou ainda que entende haver como prova apenas a transferência única de R$ 10 mil, o que considerou "valor irrisório frente à magnitude da campanha majoritária em um Município com mais de 100 mil habitantes". Lembrou ainda não haver elementos que indiquem reiteração de pagamentos e nem a origem primária do numerário.

Dessa forma, sobre a acusação de abuso de poder: "ainda que se esteja diante de fatos criminais graves, e que merecem pronta investigação, não há comprovação robusta do envolvimento dos investigados e, muito menos, seu direcionamento específico para a eleição majoritária de Iguatu. A condenação pelo simples fato de existir relação pessoal entre os investigados e pessoas objeto destas apurações criminais seria uma responsabilização objetiva vedada nesta seara", disse.

Também não se verifica, segundo a magistrada, a captação ilícita de sufrágio (compra de votos): "uma vez que não há prova de promessa, oferta ou entrega de vantagem pessoal a eleitores com finalidade de obtenção de voto".

"A dúvida ou mera possibilidade da ocorrência de ilícito não pode autorizar a substituição da vontade popular manifestada nas urnas", concluiu.

Sessões anteriores

No último dia 24, o julgamento havia sido suspenso após o juiz Luiz Evaldo Gonçalves Leite pedir vista do processo, alegando ter sido convocado um dia antes e destacando a complexidade do caso. Em voto no último dia 3, ele se declarou suspeito, diante da impossibilidade de atuação por comprometimento de imparcialidade.

O relator do caso, Wilker Macêdo Lima, havia votado anteriormente pela cassação dos diplomas e pela realização de novas eleições. Além disso, aplicou uma multa de R$ 30 mil ao prefeito e ao vice e os declarou inelegíveis por oito anos a partir da data do pleito.

Entenda a ação que pedia cassação de prefeito e vice de Iguatu

Em sentença proferida em 28 de julho, o juiz Carlos Eduardo Carvalho Arrais acolheu parcialmente embargos de declaração e dando a eles efeitos infringentes, modificando o teor da decisão anterior. A decisão partiu após análise de embargos de declaração que apresentaram uma entrevista concedida pela advogada Márcia Rúbia Batista Teixeira como um fato novo.

Dessa forma, o juiz alterou a decisão anterior em que ele determinava a cassação dos diplomas e inelegibilidade por oito anos de Roberto e Francisco. Na primeira sentença, outras duas pessoas foram indiciadas pela Polícia Federal (PF) em inquérito que apura supostos crimes eleitorais e associação criminosa, dentre elas Márcia.

As investigações revelaram suposto uso de um comitê eleitoral paralelo e clandestino, operado pela advogada, que teria intermediado a compra de apoio de um líder de facção criminosa por R$ 10 mil e o pagamento irregular de militantes. A Polícia Federal e a Polícia Civil apuraram se os investigados buscaram "contratar os serviços" da organização criminosa para obter vantagens.

O relatório da PF diz haver "indícios consistentes de despesas não identificadas no Processo de Prestação de Contas da campanha de 2024", o que configuraria a prática de "Caixa Dois". Contudo, na nova sentença, o juiz entendeu que, mesmo ainda havendo "indícios suficientes" de caixa dois ou irregularidades no pagamento de pessoal, tais fatos, por si só, não autorizam automaticamente a cassação dos mandatos.

Arrais também destaca que a transferência de R$ 10 mil realizada para um chefe de facção criminosa foi concretizada antes da campanha eleitoral; "momento em que não há provas nos autos quanto à existência de relação" entre a advogada Márcia e Roberto Filho.

Camisetas teriam sido distribuídas ilegalmente

A PF também apontou a aquisição e distribuição de camisas de campanha que não foram devidamente registradas na prestação de contas. Declarações e imagens de câmeras de segurança indicam essa movimentação no escritório de Márcia, com a presença do próprio Roberto Filho em algumas ocasiões.

O juiz, no entanto, reavaliou a premissa de que o local funcionava como "comitê eleitoral paralelo e clandestino" e local de "distribuição indiscriminada de material de campanha", citando as camisas. Segundo ele, Márcia esclareceu que o material era encomendado e pago pelos próprios eleitores à fábrica do irmão dela, e não distribuídas gratuitamente pela campanha.

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