Logo O POVO+
Câmara aprova versão do relator do PL Antifacção sem equiparação ao terrorismo
Comentar
Politica

Câmara aprova versão do relator do PL Antifacção sem equiparação ao terrorismo

|Embates| Deputados votaram a sexta versão apresentada pelo relator. No Plenário, Motta barrou inclusão de emendas ou destaques que equiparassem facções com terroristas
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Comentar
VOTAÇÃO aconteceu nesta terça-feira, 18 na Câmara dos Deputados (Foto: Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados)
Foto: Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados VOTAÇÃO aconteceu nesta terça-feira, 18 na Câmara dos Deputados

A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira, 18, o PL Antifacção, de autoria do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas que foi aprovado na forma do substitutivo do relator. A proposição foi alvo de disputa entre o Palácio do Planalto e a oposição, especialmente após o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), escolher Guilherme Derrite (PP-SP), secretário de Segurança Pública de São Paulo temporariamente licenciado, como relator.

O relator apresentou seis versões do texto ao longo de duas semanas - a última protocolada pouco antes do início da discussão em plenário. As mudanças atenderam aos pedidos do governo Lula. Mesmo assim, petistas continuaram críticos e tentaram adiar a votação, mas foram derrotados. A proposição agora vai ao Senado.

Foram 370 votos pela aprovação, 110 votos contrários e três abstenções. O governo tentou que a Câmara votasse o texto enviado pela gestão, mas houve derrota. Em seguida, governistas encaminharam voto contrário por considerarem a versão de Derrite como incompleta e com falhas.

O texto do relator prevê ainda a apreensão prévia de bens do investigado em certas circunstâncias, com a possibilidade de perdimento dos bens antes do trânsito em julgado da ação penal. Governo e oposição discutiram mudanças e o relator defendeu que seria uma alteração pedida por membros do Ministério Público.

Os governistas discordaram da maior parte do substitutivo e apoiaram o projeto original. Já parlamentares da oposição elogiaram as mudanças feitas pelo relator.

Seis versões do relator

O relator apresentou seis versões do texto ao longo de duas semanas - a última protocolada pouco antes do início da discussão em plenário. As mudanças atenderam aos pedidos do governo Lula. Mesmo assim, petistas continuaram críticos e tentaram adiar a votação, mas foram derrotados. A proposição agora vai ao Senado.

O texto final aprovado endurece penas e cria tipos penais para crimes cometidos por integrantes de facções.

Essa proposta passou por extensa negociação entre lideranças partidárias nesta terça depois de um adiamento da votação na semana passada.

Tanto governo como Derrite, de oposição, disseram que faltou diálogo entre as partes. Derrite disse que "não foi procurado em nenhum momento".

Já Lindbergh Farias (RJ), líder do PT na Câmara, disse no plenário que o relator recusou conversar com os ministros Ricardo Lewandowski, da Justiça, e Gleisi Hoffmann, das Relações Institucionais, para negociar. "Faltou diálogo, vontade de se sentar na mesa de negociação", afirmou.

Lindbergh criticou a escolha de Motta por Derrite como relator. "Ao escolher o relator Derrite claramente trouxe uma conotação de disputa partidária", disse. 

Equiparação com terrorismo

Oposicionistas em especial ainda tentaram emplacar no projeto a equiparação de facções ao crime de terrorismo. Dois governadores - Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, e Cláudio Castro (PL), do Rio - estiveram na Câmara nesta terça-feira para exercer pressão.

Derrite incluiu o tema na primeira versão do seu relatório, mas logo recuou após intensa ofensiva do governo.

Motta disse que essa inclusão "não faz parte do escopo do texto" e impediu a votação para a inclusão do tópico na proposta.

Integrantes do Centrão trabalharam para que esse trecho não entrasse no texto. O relator na Câmara também já conversou com o relator no Senado, Alessandro Vieira (MDB-SE), para garantir que o texto avance na outra Casa legislativa. Pessoas a par do diálogo dizem que houve sinal positivo.

Na quinta versão, protocolada na tarde desta terça, Derrite cedeu em duas das principais críticas apontadas pelo governo: o destino dos bens apreendidos pela Polícia Federal e outras medidas que afetariam a Receita Federal.

Derrite criou o conceito de organização criminosa ultraviolenta, também chamada de facção criminosa, o "agrupamento, de três ou mais pessoas, que emprega violência, grave ameaça ou coação para impor controle territorial ou social, intimidar populações ou autoridades, atacar serviços, infraestrutura ou equipamentos essenciais, ou que pratica, ainda que ocasionalmente, quaisquer atos destinados à execução dos crimes tipificados nesta lei".

O relatório prevê a existência do crime de domínio social estruturado. Essa infração reúne condutas graves cometidas por facções, como o uso de violência para impor domínio territorial, ataques a forças de segurança ou sabotagem de serviços públicos.

A pena para esse crime é de 20 a 40 anos de prisão, com possibilidade de aumento de pena pela metade ou em até dois terços, entre outros casos, caso esse crime tive sido cometido por uma liderança se houver conexão transnacional, se tiver o fim de obter vantagem econômica com a extração ilegal de recursos minerais ou a exploração econômica não autorizada ou se houver violência contra autoridades ou pessoas vulneráveis.

O projeto também endurece penas cometidas por integrantes de organização criminosa, grupo paramilitar ou milícia privada.

Confira os casos

Ameaça qualificada - pena prisão de um a três anos;

Lesão corporal seguida de morte - pena de prisão de 20 a 40 anos;

Lesão corporal - aumento da prisão (três meses a um ano) em 2/3 da pena;

Sequestro ou cárcere privado - pena de prisão de 12 a 20 anos;

Furto - pena de prisão de quatro a dez anos e multa;

Roubo - aumento da pena para esse crime (quatro a dez anos) em três vezes;

Latrocínio - pena de prisão de 20 a 40 anos, e multa;

Extorsão - aumento da pena para esse crime (quatro a dez anos) em três vezes;

Extorsão mediante sequestro - aumento da pena para esse crime (8 a 15 anos) em dois terços;

Receptação - aumento da pena para esse crime (um a quatro anos, e multa) em dois terços;

Tráfico de drogas - aumento da pena (5 a 15 e multa, no caso de tráfico, e dois a seis anos, também com multa, na situação de colaboração em grupo) no dobro; e

Posse e porte irregular de arma de fogo de uso permitido ou restrito - aumento da pena em 2/3 (nesses três crimes as penas variam entre o mínimo de um ano e o máximo de seis anos de prisão), se praticado em concurso ou ligado ao tráfico de drogas.

Fundos e alienação de bens

O relator colocou no texto um trecho que permite que a Receita Federal, o Banco Central e outros órgãos fiscalizadores possam continuar executando suas medidas de perdimento imediato de bens. Além disso, o juiz poderá decretar o perdimento extraordinário de bens, independentemente de condenação penal.

No relatório protocolado na Câmara, na semana passada, Derrite dizia que a alienação de bens do crime organizado só poderia ser feita após o trânsito em julgado de decisão judicial. Além disso, trechos do texto retirariam da Receita a capacidade de apreender mercadorias e de declarar o perdimento de contrabandos.

Delegados, auditores e empresários do setor de combustível apontavam no relatório de Derrite ataque à Receita Federal, inviabilizando o combate ao contrabando, a Operação Carbono Oculto e até ações como a das joias do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Nessa nova versão, Derrite também alterou a lei sobre o crime de lavagem e ocultação de bens e incluiu um trecho que o preso em flagrante ou "por força de mandado de prisão provisória" fará a audiência de custódia por videoconferência.

Se na versão apresentada na semana passada os bens apreendidos iriam para Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal (Funapol), agora o destino passará a ser o Fundo Nacional de Segurança Pública.

"Em um primeiro momento, optou-se, após pedido de representantes da Polícia Federal", disse Derrite. "Contudo, tendo em vista a manifestação midiática do Governo Federal de que isso poderá prejudicar as contas públicas e outros investimentos, em simetria ao que é feito com os estados, previu-se o encaminhamento do quinhão cabível à Polícia Federal ao Fundo Nacional de Segurança Pública."

Outras mudanças

Na sexta versão, Derrite propôs mais uma hipótese para aumentar a pena de eventuais réus: quando o "crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica com a extração ilegal de recursos minerais ou a exploração econômica não autorizada".

Ele também detalhou o regramento sobre as audiências de custódia via videoconferência, prevendo, por exemplo, que todos os estabelecimentos prisionais terão salas próprias, "com disponibilização de mecanismos de videoconferência estáveis".

O relator ainda fez um ajuste na redação sobre o perdimento extraordinário de bens. Agora, a previsão é de que a medida seja aplicada quando "restar clara a origem ilícita do bem, independente de condenação penal", nem necessidade de haver risco de dissipação de patrimônio.

 

 

Pontos do projeto

O texto aumenta as penas para membros de facção ou milícia para 20 a 40 anos, podendo chegar a 66 anos para os líderes das organizações

O substitutivo também aumenta em 85% da pena o tempo necessário para progressão de regime. Fica proibida graça, anistia, indulto ou liberdade condicional para membros dessas organizações

Prevê participação do Ministério Público nos casos de forças-tarefas que investiguem facções

O projeto traz a definição de organização criminosa ultraviolenta, apesar das críticas que apontaram que a criação de um novo tipo criminal poderia gerar um caos jurídico

No caso de audiência de custódia e julgamento de homicídios cometidos por membros de facção, prevê que as audiências de custódia sejam realizadas, "em regra, por videoconferência, salvo decisão judicial fundamentada em sentido contrário"

Os homicídios cometidos por facções serão julgados, no primeiro grau de jurisdição, por um colegiado e não por um tribunal do júri

Texto prevê preensão prévia de bens do investigado em certas circunstâncias, com a possibilidade de perdimento dos bens antes da decisão final da Justiça

O que você achou desse conteúdo?