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Com mudanças na fiscalização em rodovias, especialistas temem aumento de acidentes fatais
Reportagem

Com mudanças na fiscalização em rodovias, especialistas temem aumento de acidentes fatais

Ministério da Integração diz que estão sendo feitos estudos para a retirada de radares das rodovias federais. Aumento do limite de pontos na CNH também será proposta do Governo Federal
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FORTALEZA, CE, BRASIL, 24-08-2016 : Novos radares de velocidade sao instalados na br 116.   (Foto: Fabio Lima/O POVO) (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA FORTALEZA, CE, BRASIL, 24-08-2016 : Novos radares de velocidade sao instalados na br 116. (Foto: Fabio Lima/O POVO)

No ano em que foi implementada a redução de velocidade na BR 116 o número de acidentes fatais, em que há uma ou mais pessoas mortas caiu para menos da metade e passou das 37 ocorrências em 2010 para 15 em 2011. Isso somente nos 10 primeiros quilômetros da rodovia federal. No último dado, em 2018, no mesmo trecho, os números caíram para 7 ocorrências. A estatística mostra a direta relação entre a redução de velocidade e redução de acidentes. Em maior ou menor escala, a redução é um padrão que se repete em outras cidades brasileiras. Além disso, estudos técnicos de diferentes instituições apontam a eficiência da fiscalização na redução de velocidade.

A retirada de fotossensores das rodovias federais é uma das propostas apresentadas na última semana pelo Governo Federal. Diante de impasses e sem estudos técnicos previamente apresentados, o Palácio do Planalto propôs alterações nas políticas de trânsito, tanto no que diz respeito à fiscalização quanto à legislação. Para especialistas, as mudanças precisam ser rediscutidas sob o risco de aumentarem a violência no trânsito.

Além da retirada de radares, o Departamento Nacional de Trânsito (Denatram) deve enviar "em breve", ao executivo uma proposta de projeto de lei que prevê, entre outras, duas alterações no Código de Trânsito Brasileiro (CTB): o aumento do limite de pontos anuais do documento de habilitação, de 20 para 40 pontos; e o aumento do prazo de renovação de cinco para dez anos, até os 50 anos de idade do condutor, com exceção de casos específicos.

"Já é consenso dentro da comunidade técnica que os equipamentos de fiscalização eletrônicos de fato ajudam a reduzir acidentes de trânsito, especialmente os mais graves. Vários estudos apontam para essa mesma discussão, com reduções de 30% a 50% do número de acidentes", afirma Dante Rosado, coordenador executivo da Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global em Fortaleza. Para ele e todos os outros especialistas ouvidos pelo O POVO a retirada de radares pode acarretar no aumento do número de acidentes.

Às margens da BR-020, em Canindé, o comerciante Everardo Soares, 48, fala da mudança drástica que ocorreu após a implantação do fotossensor. Em levantamento feito pela Folha de S.Paulo a partir de dados do Denatran, a região está, ao lado da BR 116, no Ceará, entre as campeãs na redução de mortes. "Por aqui tem dois fotossensores, um na saída e outro na entrada da Cidade, e é uma segurança grande. Antes, todo mês morria gente", diz.

De acordo com o diretor-presidente do Observatório Nacional de Vigilância Viária, José Aurélio Ramalho, a instituição enviou um documento público com contrapropostas às decisões anunciadas. "É uma análise muito técnica e objetiva sobre o equívoco que há em algumas medidas. A proposta do Observatório não é de confronto, e nem de esquerda ou direita, é de mediação na busca de reduzir esses números alarmantes de acidentes", diz. Ele aponta os custos milionários desses acidentes para os cofres públicos, seja na parte de reparos, na área hospitalar, na previdência ou mesmo na perda produtiva.

Os prejuízos trazidos por essas fatalidades custam aos países entre 3% e 5% de seu Produto Interno Bruto (PIB), além de contribuírem para levar muitas famílias à pobreza. O dado é do relatório da Organização Mundial de Saúde, que recomenda redução de limite de velocidade nas vias para a redução de mortes.

Pablo Ximenes, superintendente adjunto do Detran, alerta que além das questões de acidentes, especificamente no Ceará, os radares estão integrados no projeto SPIA em que câmeras do Governo, do Município e da União integram um sistema de monitoramento da Secretaria da Segurança Pública na captura de carros roubados ou clonados. "Não é que não tenha que haver mudanças. Sem discutir o mérito do desejo de acertar, mas questões de trânsito são complexas e qualquer erro pode gerar catástrofes", disse.

Por meio de nota, o Ministério da Integração informou que, em relação aos dispositivos eletrônicos de medição e controle de velocidade, está sendo feito um estudo pelo CONTRAN. "Os estudos serão embasados em uma análise rigorosa no plano de radares instalados nas rodovias".

Observatório lança manifesto com contrapropostas

Por meio de carta aberta e em busca de diálogo com o Governo Federal, o Observatório Nacional de Segurança Viária lançou uma série de contrapropostas e observações quanto às decisões do Governo. A ideia do Governo Federal é que "em breve" seja enviada uma proposta de projeto de lei que prevê mudanças no Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Entre elas, o aumento no número de limite anual de pontos, de 20 para 40; e o aumento do prazo para renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), de cinco para dez anos, até 50 anos.

Sobre o aumento de pontos, o documento aponta que "Apesar de aparente benefício a toda sociedade, esta medida irá beneficiar somente os condutores infratores (menos de 5% da população brasileira), ou seja, justamente os que colocam em risco a vida dos demais 95% da população, e certamente impactam nas 37 mil mortes por acidentes registradas em 2017, e nas outras centenas de milhares que sofreram lesões permanentes". E propõe aumento menor, de 20 para 34, mediante curso de reciclagem a partir de determinada pontuação.

Sobre o aumento do tempo de renovação, o Observarório sugere que "a ampliação do tempo de renovação deve ser precedida de critérios que envolvam avaliação clínica e psicológica do condutor, de acordo com sua faixa etária e atividade", afirmam. Para a instituição, condutores que exercem atividades remuneradas são os que passam maior tempo no trânsito, necessitando assim de um acompanhamento de saúde mais frequente.

Rodrigo Nóbrega, advogado especialista em leis de trânsito, concorda que há mais facilidade em aumentar o limite, mas pondera que são necessários estudos mais embasados em relação às mudanças.

 

Menos acidentes e nenhuma morte nas BRs durante o feriado no Ceará

Seis pessoas morreram nas estradas que cruzam o Ceará durante o feriado da Semana Santa, contando da noite de quinta-feira, 18, até a manhã de ontem. Todos os casos ocorreram em rodovias estaduais (CEs). Sem mortes registradas em rodovias federais, os acidentes fatais foram reduzidos em 25% em comparação com o feriado do ano passado. O número de acidentes em geral também diminuiu, novamente puxado pelas BRs.

Além da redução em 100% no número de mortes, as BRs registraram decréscimo de 50% no número de acidentes e 51,61% no número de feridos na comparação com a Páscoa de 2018. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) comemorou o que foi a Semana Santa menos violenta nas estradas federais em cinco anos. A corporação creditou o resultado positivo à operação especial feita para o feriado, que contou com reforço no policiamento ostensivo e preventivo em locais e horários de maior incidência de crimes e acidentes graves.

Foram 2.947 autos de infração, sendo 398 por ultrapassagem proibidas, 49 pelo não uso de capacete e 46 pelo não uso de cinto de segurança. Dezoito pessoas foram autuadas por embriaguez ao volante — outras duas foram detidas. Além disso, 4.196 imagens de veículos trafegando em velocidade acima do permitido foram flagradas pelos radares das BRs. Foram mais de 6 mil carros fiscalizados pela PRF, que destacou também ter recolhido 24 carteiras nacionais de habilitação (CNHs) e 228 certificados de registro e licenciamento de veículo (CRLV). Entre as ações do órgão, ainda houve o recolhimento de 46 animais soltos em rodovias.

A PRF divulgou que, ao total, o número de acidentes nas rodovias federais no País diminui, assim como o número de mortes. Houve 11% a menos de acidentes em comparação com 2018 e 28% no número de mortes.

Nas rodovias estaduais, porém, os resultados não foram tão positivos em comparação com o ano passado. A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) divulgou que o Batalhão de Policiamento Rodoviário Estadual (BPRE) registrou aumento de 18% no número de acidentes. O número de mortes também foi maior do que em 2018, quando quatro pessoas morreram nas CEs. Apesar disso, os acidentes causaram menos feridos este ano. Foram 13 casos, contra 23 no ano passado. A SSPDS também comemorou aumento no número abordagens feitas pelos policiais. Foram abordados 14.740 veículos, um aumento de 45% em comparação com o ano passado. Foram 203 apreensões, número 28% maior que o registrado em 2018.

De acordo com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), a infração mais comum nas rodovias estaduais foi o excesso de velocidade — foram 9.829 casos. As infrações à Lei Seca foram 243. Em ambos os casos houve aumento na comparação com 2018 — 20% e 43%, respectivamente. O Detran ainda registrou o recolhimento de 102 animais e 57 infrações por tráfego em faixa de areia nas praias.

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