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Falar é preciso
Reportagem

Falar é preciso

| FALTA INVESTIMENTO | Municípios relatam experiências ao encarar o suicídio e buscam a prevenção
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Uma falta puxa a outra: sem investimento público necessário, não há capacitação ou conhecimento para encarar o suicídio e também não se sabe a extensão do problema. "Falta um retrato real do suicídio ou tentativa de suicídio no Interior e, consequentemente, faltam políticas públicas", ratifica a psicóloga educacional Ariel Barbosa Gonçalves, docente da Faculdade Vale do Salgado, em Iguatu (a 360,1 quilômetros de Fortaleza).

Entre 2015 e 2016, destaca Ariel, o CAPS municipal começou a identificar "números crescentes de suicídio ou de tentativa de suicídio" entre "homens, na faixa etária jovem-adulto". Foi quando profissionais voluntários, que têm interesse no tema, criaram um ambulatório de prevenção. A dimensão territorial impacta o estigma e o preconceito, relaciona a psicóloga: "Quando morre alguém (por suicídio) em uma cidade como a nossa, as pessoas criam uma especulação e acabam perdendo muito do elemento humano, da empatia. Isso faz com que as pessoas que ficam, os sobreviventes, sejam vitimizados e se tornem fatores de risco para o suicídio".

O tema traz um estigma, compartilha Diego Mendonça Viana, psicólogo do Creas de Umirim (a 98, 4 quilômetros de Fortaleza): "As famílias têm medo de falar sobre isso, de conversar até com profissionais". Buscar ajuda especializada no serviço público, ele completa, é ainda um entrave. É que "essa forma de ajuda seria uma exposição porque, aqui, todo mundo se conhece".

Apenas "de um ano e meio para cá", sinaliza o psicólogo, começaram "conversas públicas" sobre saúde mental, incluindo o suicídio. A rádio tem sido uma ponte até os idosos da zona rural, por exemplo. "Ainda de forma muito tímida, mas estamos conseguindo uma abertura (para desmistificar o assunto)", considera Diego.

Em Ocara (a 101,6 quilômetros de Fortaleza), o CAPS geral atende a, aproximadamente, duas mil pessoas, retrata Wgerbesson Freire Maciel, psicólogo coordenador do Creas local. "Temos duas psicólogas, duas assistentes sociais, um psiquiatra que vem duas vezes por semana, uma enfermeira. Uma equipe básica", reflete. Quando os suicídios de 2018 e 2019 aconteceram e foi urgente encarar o problema, houve "muita resistência até a palavra suicídio. É uma palavra forte, não é fácil falar", espelha Wgerbersson. "Quando começamos a estudar, identificar causas, fatores de risco, entendemos que falar é a melhor forma de prevenção. Quando temos informação, conseguimos ajudar o outro de forma correta", encara.

Os silêncios são fortes, "principalmente, diante de uma cultura fortemente religiosa", percebe a psicóloga Lara Vasconcelos Hardman, coordenadora do CAPS tipo 1, em Pacoti (a 93,5 quilômetros de Fortaleza). E há também as especulações que não levam a compreensão nenhuma. "Cada vez mais, os jovens do município têm manifestado ideação suicida ao lidar com frustrações, perdas, mudanças. As famílias se sentem despreparadas para manejar tais sofrimentos, mas, cada vez mais, procuram ajuda. Têm quebrado os preconceitos com relação ao serviço de saúde mental, o que considero bastante positivo", equilibra. (Ana Mary C. Cavalcante)

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