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Uma sociedade mais responsável
Reportagem

Uma sociedade mais responsável

| TROCA | Os brasileiros precisam doar mais por causas que façam diferença de forma política. E as instituições devem ser transparentes e inovadoras para atrair mais doadores
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Apenas 0,23% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro é de doações. Nos Estados Unidos essa marca sobe para 2%. Os aportes para instituições sem fins lucrativos, o terceiro setor, podem ajudar a mudar cenários sociais e econômicos.

A diretora de comunicação do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis), Andréa Wolffenbuttel, destaca que muitos doadores - principalmente os de faixa etária mais elevada - acabam tendo uma compreensão mais emergencial da doação. "Muitas vezes a pessoa está preocupada com aquela causa, mas não tem uma visão estratégica da doação", pondera. E exemplifica: "em Brumadinho, milhares de pessoas doaram para as vítimas. Mas quantas doam para uma organização ambiental, que fiscalize as empresas?".

O vínculo emocional que desperta o desejo de doar em prol de crianças doentes, animais abandonados, pessoas em situação de vulnerabilidade é importante. É o que mantém muitas instituições de pé. Organizações que têm um papel mais abrangente, de influenciar políticas públicas ou lutar por garantia de direitos, acabam tendo grande impacto, mas pouco apelo. "Assim dependem muito mais de um filantropo ou de um financiamento estrangeiro. O problema é que são fontes únicas, que se acabarem, acabam também com a organização. Quando existem muitos doadores é mais difícil isso acontecer", detalha Andréa.

O Brasil, conforme ela, é um país paternalista, que deposita no governo a responsabilidade por todas as soluções. Influenciado também pela Igreja Católica. "Em países protestantes e de cultura anglo-saxônica, por exemplo, o pensamento é mais de que cada um é também responsável pela sociedade. Nesses locais a sociedade civil é mais fortalecida", analisa.

Andréa destaca que uma das estratégias hoje é fazer com que o doador saiba qual sua causa. Não apenas de ajuda, mas de mudança. "O que você quer mudar no mundo, o que te toca, o que você quer mudar? Tentar despertar um pouco essa doação para saber o que quer mudar", acrescenta.

Outra barreira impede que as doações no Brasil cresçam. Conforme o Idis, a doação média anual do brasileiro caiu de R$ 250 para R$ 200 entre 2017 e 2018. A falta de confiança e transparência corroborou para este cenário. "É preciso profissionalizar a gestão dessas instituições. Com isso você consegue maior eficiência na aplicação dos recursos e quando se tem isso, aliado à maior transparência, motiva mais pessoas a doarem", avalia o membro do Conselho Federal de Economia (Cofecon) e professor da Uece, Lauro Chaves.

Uma das formas mais eficazes de alocar recursos provenientes de doação, conforme o especialista, é escolher territórios. Delimitar áreas e públicos para obter resultados mais palpáveis. "Não é possível substituir a amplitude, a capilaridade do Estado, não se resolvem problemas sociais com ações pontuais. Mas se resolvem em um determinado território", detalha Lauro. Nas contas, o economista garante que doações de R$ 5, como a da aposentada Maria Creuza,fazem a diferença. Basta contabilizarmos que se 100 mil pessoas fizessem o mesmo, alguma causa social, com certeza, sofreria um impacto positivo.

Alavancar mais doações depende também de uma discussão tributária diferenciada. Principalmente em relação a heranças. O diretor geral do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), Mário França, lembra que nos Estados Unidos há muita tributação em cima de heranças familiares, o que favorece que doações sejam feitas. "Aqui você não vê milionários doando para universidades e fundações. Nos EUA é muito comum. Na Europa também", pondera. De acordo com Mário, há uma discussão sobre a questão no País, mas que ainda enfrenta muita resistência.

 

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