Logo O POVO+
A experiência de ressocialização de meninas em conflito com a lei em clube de futebol
Reportagem

A experiência de ressocialização de meninas em conflito com a lei em clube de futebol

Grupo de jovens internas do Centro Educacional Aldaci Barbosa Mota treinam na Associação Esportiva Tiradentes
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
FORTALEZA,CE,BRASIL,27.08.2019: Parceria entre o clube Tiradentes e Centro Educacional Aldaci Barbosa, levam treino de futebol para meninas adolescentes que cumprem pena. (fotos: Tatiana Fortes/ O POVO) (Foto: Tatiana Fortes)
Foto: Tatiana Fortes FORTALEZA,CE,BRASIL,27.08.2019: Parceria entre o clube Tiradentes e Centro Educacional Aldaci Barbosa, levam treino de futebol para meninas adolescentes que cumprem pena. (fotos: Tatiana Fortes/ O POVO)

Duas vezes por semana, cinco meninas saem do cinza do Centro Educacional Aldaci Babosa Mota e encontram o verde do gramado da Associação Esportiva Tiradentes. Garotas em conflito com a lei, entre 15 e 18 anos, têm a oportunidade de socialização através do esporte. Elas ainda cumprem regime de internação. Mas no campo, a realidade do restante do tempo é página virada.

O grupo tem ainda uma sexta integrante, que já está em liberdade. Ainda assim, permanece praticando futebol ao lado das antigas colegas de internação. A paixão pelo esporte é o estímulo que ela precisava.

Aos 17 anos, ela teve a oportunidade de conviver com as atletas profissionais do Tiradentes, tradicional agremiação cearense. Essa experiência foi determinante para a jovem. "Aprendi muitas coisas com as profissionais. Eu me inspirei em uma que tinha 45 anos, a Tânia Maranhão. Ela tinha um físico que nem parecia que tinha essa idade", lembra.

A proximidade do Centro Aldaci Barbosa da sede do Tiradentes — apenas 55 metros de distância —, foi o primeiro estalo para a ideia do juiz Eduardo Gibson, da 5ª Vara da Infância e Juventude de Fortaleza. Adepto da aplicação da Justiça Restaurativa, o magistrado resolveu estimular uma parceria entre o Tiradentes e a Superintendência do Sistema de Atendimento Socioeducativo do Ceará (Seas).

Após os primeiros passos e um êxito atestado, no último dia 13 de agosto foi acertada a ampliação do número de vagas para garotas do Aldaci Barbosa. Já a partir do próximo mês, o número de meninas acolhidas pelo clube de futebol deverá aumentar de seis para 12 oportunidades.

De acordo com Eduardo Gibson, o "Projeto Tiradentes", agora faz parte do programa "Justiça Já", do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), que tem a pretensão de "reequilibrar o status quo que existia antes do delito, através de medidas inclusivas". Para o idealizador da tecnologia social, "esse tipo de medida restaurativa através do esporte é fundamental, pois incentiva a disciplina e o espírito de equipe, que contribuem para o coletivo".

Os treinamentos ocorrem duas vezes por semana, aos sábados e domingos, das sete às dez da manhã. No começo, as meninas do Aldaci Barbosa participaram das dinâmicas do time profissional feminino, que existia até o final do ano passado. Com o fim da equipe feminina, as jovens passaram a compartilhar o campo com o futebol masculino profissional. Porém, como há um projeto de reconstrução do elenco feminino do Tiradentes, elas voltaram a treinar isoladamente até que a equipe das mulheres seja reestruturada.

FORTALEZA,CE,BRASIL,27.08.2019: Parceria entre o clube Tiradentes e Centro Educacional Aldaci Barbosa, levam treino de futebol para meninas adolescentes que cumprem pena. (fotos: Tatiana Fortes/ O POVO)
FORTALEZA,CE,BRASIL,27.08.2019: Parceria entre o clube Tiradentes e Centro Educacional Aldaci Barbosa, levam treino de futebol para meninas adolescentes que cumprem pena. (fotos: Tatiana Fortes/ O POVO)

O andamento do projeto é acompanhado pelo juiz da Infância e Juventude, por uma assistente social, uma psicóloga e uma agente social. O POVO apurou que uma estrutura maior está sendo providenciada, por meio de parcerias com empresas que possam fornecer mais equipamentos de treinamento e profissionais qualificados. A intenção é expandir a ideia para mais modalidades de esportes, inserir outros Centros Educacionais e ampliar o número de participantes. E assim, incluir meninos e mais meninas.

A experiência é um momento especial para outra interna do Aldaci Barbosa. Para ela, já um sentimento de liberdade no gramado. "É diferente. Porque aqui (no campo), a gente está livre, lá dentro (do Centro Educacional), não", resumiu.

César Molina, coordenador de projetos sociais do Tiradentes, ressalta que o futebol pode fazer a diferença na vida das meninas e até profissionalizá-las. "Elas passam a ver a vida fora do sistema socioeducacional através do esporte", observa. E é uma via de mão dupla. Para o clube, projeta o dirigente, há "uma projeção da marca". "Estamos lidando com oportunidade de ressocialização mais efetiva. Hoje, o lado social e humano conta muito. Especialmente para atrair apoio da iniciativa privada e pública, dentro e de fora do País. No plano internacional, iniciativas como esta são mais valorizadas", avalia.

Elisa Barreto Rodrigues, diretora do Aldaci Barbosa, vê outros frutos da parceria com o Tiradentes. Segundo ela, o projeto "tem proporcionado reflexões sobre um projeto de vida, sobre compreensão de regras". Além de despertar a união do grupo em torno de um objetivo em comum.

"Elas estão motivadas e esperançosas de uma oportunidade de seguir carreira profissional na área após o cumprimento da medida socioeducativa", afirma a gestora do Centro Educacional que até o mês passado tinha 56 jovens internadas.

As garotas mantém o olhar ainda mais adiante. "Quem, sabe, no futuro, a gente pode jogar uma Copa do Mundo".

Clique na imagem para abrir a galeria


Técnico

Os treinos contam com dois comandantes, um com experiência em escolinhas e treinamento pela CBF e outro que por anos trabalho junto ao Caucaia, potência feminina no futebol cearense

O que você achou desse conteúdo?