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"Aprendi a (ter) esperança no ser humano"
Reportagem

"Aprendi a (ter) esperança no ser humano"

Os socorristas Herlon Braga, Ricardo Lima e Davi Maia narram as emoções dos dias de resgate no Edifício Andréa
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Ricardo Lima estava na casa dele, preparando-se para buscar as filhas na escola, quando uma ocorrência de incidente com múltiplas vítimas entrou no rádio de comunicação. Era terça-feira, 15 de outubro, 10h30. O socorrista voluntário dirigiu-se ao cruzamento entre as ruas Tibúrcio Cavalcante e Tomás Acioli no próprio carro. "Parecia que tinha explodido uma bomba, era muita gente chorando, os familiares chorando, as pessoas paravam a gente e perguntavam pelo parente e a gente nem sabia o que dizer na correria... Uma coisa que você não esquece. Como socorrista voluntário, ser humano, você fica chocado em ver aquilo ali", relembra. Em meio à tragédia que vitimou fatalmente nove pessoas e deixou outras sete feridas, os profissionais que atuaram durante os cinco dias de operação desde o desabamento do Edifício Andréa, no bairro Dionísio Torres, foram exemplos de solidariedade e empatia.

Diante da dor do outro, Ricardo aquiesceu. "Por muitas vezes eu me afastei e fui em uma loja para chorar escondido. Ali não existia católico, protestante, ateu: ali existia amor ao próximo. E o voluntariado é isso. A gente passava e eles perguntavam se estávamos bem e se queríamos água. Uns faziam questão de passar e só abraçavam a gente, não diziam nada. É como se passassem uma energia pra gente".

Como voluntário, Ricardo já participou de resgates na colisão do VLT e também em um acidente com veículos na avenida Osório de Paiva, mas o desabamento o marcou. "Parece que Fortaleza parava, você não ouvia carro, não ouvia buzina, nada. O que eu aprendi com essa tragédia foi a (ter) esperança no ser humano. Se tiver técnica, conhecimento e não tiver amor ao próximo, não funciona", complementa.

O socorrista voluntário Davi Maia chegou ao local cerca de 20, 30 minutos após o desabamento. Profissional da saúde, ele auxiliou no resgate de uma das vítimas com vida. "A emoção tomou conta do local. Aquele foi o momento marcante", compartilha. O socorrista participou de quase toda a operação do resgate, conforme informou ao O POVODas lembranças desses dias cinzas, o silêncio é a mais ensurdecedora. "A cada momento que era pedido silêncio no local batia um desespero. Foi bem delicado, foi bem difícil... Um dos momentos que eu jamais vou esquecer. Mesmo com a tristeza, o luto, fica o aprendizado. Muitos profissionais de saúde passaram horas, viraram noites. Sou grato a Deus de ter participado das buscas por sobreviventes de forma direta e indireta", continua.

Socorrista do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), Herlon Braga relata a consciência do dever cumprido. "A sensação é de saber que eu pude ajudar a salvar vidas, mesmo com exaustão estampada na fisionomia de todos que estavam lá no meio do concreto e do ferro retorcido. A nossa vontade de encontrar os sobreviventes falou mais alto. Eu sou grato pela oportunidade de ter trabalhado lado a lado com homens e mulheres que, incansavelmente, trabalharam para encontrar as vítimas com vida e poder dar um alívio a quem procurava seu ente querido", encerra.

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