Poucas horas após a publicação do decreto que prorrogava a quarentena obrigatória para conter o novo coronavírus e permitia a abertura de boa parte das indústrias e serviços no Ceará, o governador Camilo Santana (PT) anunciou nas redes sociais, no início da madrugada de hoje, 6, a revogação da medida.
"Diante da argumentação do nosso Comitê de Saúde, demonstrando preocupação com as flexibilizações de funcionamento colocadas pelo Governo do Estado nesse último decreto que entraria em vigor nesta segunda-feira, 6, decidi revogar imediatamente o mesmo. Estamos publicando um novo decreto, mantendo todas as proibições dos decretos anteriores, e com o mesmo prazo de validade de 15 dias. Se houve um erro nessa proposta de flexibilização, que seja imediatamente corrigido", escreveu.
Mais cedo, também nas redes sociais, Camilo havia defendido a decisão de flexibilização. "Continuamos com o mesmo critério de abertura apenas de serviços essenciais à população. Indústrias, são permitidas as que façam parte da cadeia desses serviços essenciais. Comércio, no geral, continua fechado", escreveu.
O Ceará é terceiro estado do País com a maior taxa de incidência do novo coronavírus. São 6,8 casos confirmados por 100 mil habitantes. Fica atrás apenas do Distrito Federal (13,2) e de São Paulo (8,7). Conforme o Ministério da Saúde, o Ceará é um dos cinco estados com "situação mais preocupante" devido ao risco de "aceleração descontrolada" da doença.
O decreto publicado na noite do domingo, que foi revogado, autorizava o funcionamento de feiras de gêneros alimentícios, serrarias, indústrias de móveis, tintas, utensílios domésticos, confecção, calçados, roupas, maquinário agrícola e autopeças, produção e comercialização de flores, comércio de materiais de construção, entre outras atividades.
Já o texto original permitia a abertura apenas de os órgãos de imprensa e meios de comunicação e telecomunicação em geral, serviços de call center, os estabelecimentos médicos, odontológicos para serviços de emergência, hospitalares, laboratórios de análises clínicas, farmacêuticos, psicológicos, clínicas de fisioterapia e de vacinação, distribuidoras e revendedoras de água e gás, distribuidores de energia elétrica, serviços de telecomunicações, segurança privada, postos de combustíveis, funerárias, estabelecimentos bancários, lotéricas, padarias, clínicas veterinárias, lojas de produtos para animais, lavanderias, e supermercados/congêneres.
Procurado antes da revogação, o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Ceará (Faec), Flávio Saboya, elogiou a decisão. Para ele, a mudança atendia a uma demanda importante do setor e traria efeitos positivos na economia, com a liberação da produção e comercialização de flores e produtos hortifrutigranjeiros.
O senador Tasso Jereissati (PSDB), ex-governador e colega de partido do secretário estadual da Saúde, Dr. Cabeto, criticou duramente a permissão para novos negócios. "Gostaria de externar meu profundo desacordo com o decreto do governador Camilo Santana que flexibilizou as regras de isolamento social recomendadas pelos órgãos de saúde, que têm sido adotadas por todo o mundo, principalmente, neste momento, em que a epidemia sai dos bairros de classe média alta de Fortaleza e entra na periferia. Justamente aqueles que estão mais vulneráveis e que não têm condição de usar hospitais particulares".
Tasso afirmou ainda que "do jeito que está, o número de contaminações vai explodir e o sistema de saúde do Ceará não terá condições de receber e dar o tratamento adequado à população".
O deputado Renato Roseno (PSOL) havia adiantado que o partido iria recorrer ao Ministério Público contra o decreto de flexibilização. "Os setores que ele liberou aglomeram milhares de operários. Não sei se você já viu a troca de turno de indústrias, uma única planta industrial reúne mais de 10 mil operários. Isso quer dizer que uma troca de turno representa a movimentação de 2,5 a 3 mil operários. É impossível não haver aglomeração do transporte, entrada, ponto, linha de produção, refeitório, saída", questionou.
O POVO havia procurado a Secretaria da Saúde (Sesa) questionando se houve mudança no cenário epidemiológico da Covid-19 no Estado que embasasse a mudança das diretrizes. A pasta respondeu, por meio da assessoria, que não conseguiu resposta do setor técnico para atender à demanda. (Bruna Damasceno e Sílvia Bessa. Colaboraram Ana Rute Ramires e Carlos Mazza)