O diálogo a seguir, trocado entre profissionais da saúde pelo WhatsApp, mostra o drama de uma noite de plantão na UPA da Praia do Futuro, em Fortaleza, em tempos de pandemia. Dezesseis pacientes lotavam os leitos destinados a infectados com sintomas graves da Covid-19 e nove estavam internados de forma improvisada em poltronas e macas. O POVO conversou com uma fonte sobre a realidade dramática dos plantões para médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e outros trabalhadores no enfrentamento ao coronavírus.
Superlotação, baixas constantes de profissionais por conta da contaminação, aflição por demora na transferência de pacientes para hospitais com UTIs e a falta de EPIs são alguns dos problemas do cotidiano na UPA.
- Pessoal, plantão desfalcado. Tá complicado...
- Fulano vendo os suspeitos de Covid... Oito (pacientes) e eu no pronto-atendimento
- Não para de chegar "laranjas" (pacientes em estado grave, com sintomas da Covid-19, que precisam de rapidez no atendimento)
- Raio X da unidade (UPA da Praia do Futuro) não tá funcionando...
- Nem, sequer, jantamos ainda.
- Tenha certeza de que está desfalcado (de profissionais da saúde) por algum motivo maior... muitas baixas!!! Infelizmente é algo impossível nesses momentos...
- Preciso de ajuda aqui dentro...
- Chegaram 3 (pacientes)
- Um pro tubo, agora.
- Outra saturando 30%...
Na semana passada, de dez enfermeiros lotados na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Praia do Futuro que deveriam se revezar nos plantões, sete foram afastados porque pegaram a Covid-19 ou apresentaram sintomas da doença. "Só na terça-feira, 14, foram três", revela uma fonte ouvida pelo O POVO que não será identificada.
A tragédia sanitária causou também a baixa de cinco médicos no difícil enfrentamento à pandemia na UPA. Todos teriam sido infectados pelo coronavírus e viraram pacientes em casa ou em algum hospital. "Semanalmente, são afastadas quase dez pessoas. É um caos", contabiliza.
O desfalque também tem relação de causa e efeito com outro problema. Mesmo estando na linha de frente do combate à doença, que já infectou mais de 3.500 pessoas no Ceará e matou pelo menos 182, na UPA da Praia do Futuro é insuficiente a quantidade de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) para a lida com pacientes contaminados.
O POVO apurou que, este mês, não houve repasse, por exemplo, da máscara modelo N-95 para a unidade médica da Praia do Futuro. "É um jogo de empurra. Mandam pegar na Farmácia (do Município), mas lá dizem que não tem material. Não sabemos o que fazer e fica esse jogo de empurra", reclamou.
Na tarde de ontem, 20, havia nove pacientes internados no corredor e salas de pequenas cirurgias da UPA com sintomas da Covid-19. Precisavam de transferências para o Hospital Leonardo da Vince ou outro com disponibilidade de leitos de alta complexidade. "Estão lá, sem isolamento adequado, em poltronas e macas improvisadas e expondo outros pacientes e os funcionários", alerta a fonte.
Os oito pacientes, de acordo com a apuração do O POVO, ainda não tinham feito o teste apesar dos sintomas que indicam o exame. Segundo a fonte "não há na UPA testes nem para os doentes, nem para os funcionários".
O excedente, no corredor e lugares improvisados, tem um motivo. Dezesseis infectados em estado grave estão internados em salas como a de parada/reanimação porque a UPA está com pacientes além da capacidade de atendimento. Eles estão aguardando vaga na Central de Leitos. "Estes necessitam de oxigênio e cuidados intensivos. Não estão entubados, mas se complicar não temos o que fazer", projeta a fonte ouvida pelo O POVO.
Alta
O Hospital Emergencial Presidente Vargas teve a primeira alta de paciente registrada ontem, 20. O paciente era atendido no IJF e foi admitido na unidade para finalizar o processo de recuperação.