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Entregadores de aplicativos fazem paralisação nacional
Reportagem

Entregadores de aplicativos fazem paralisação nacional

Queda no valor das entregas, fim dos bloqueios de usuários e falta de máscaras e álcool em gel estão entre as principais reivindicações feitas pelos trabalhadores às empresas
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CATEGORIA reivindica melhor condição de trabalho (Foto: Fabio Lima)
Foto: Fabio Lima CATEGORIA reivindica melhor condição de trabalho

Classificados como trabalhadores essenciais em meio à pandemia do novo coronavírus, os entregadores ligados aos aplicativos de entrega devem ganhar destaque durante todo o dia de hoje. É que a categoria vai parar boa parte do segmento comandado principalmente por Ifood, Rappi e Uber Eats no País.

As reivindicações são muitas e vão desde o pedido às empresas de garantia de máscaras e álcool gel para evitar o contágio do novo coronavírus, até demandas mais antigas, como maior transparência sobre as formas de pagamento adotadas pelas plataformas, aumento dos valores mínimos para cada entrega, mais segurança e fim dos sistemas de pontuação, bloqueios e exclusões apontadas como indevidas.

"Com o desemprego decorrente da pandemia, aumentou o número de trabalhadores nas entregas, e a maior oferta de mão de obra fez com que as empresas diminuíssem o valor da corrida. Além disso, eles estão enfrentando outra questão, que é o risco do contágio, e por isso os pedidos por melhores condições de trabalho", destaca Mariana Férrer, procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho do Ceará (MPT-CE).

"Muitas dessas demandas têm relação com as ações que o MPT ingressou na Justiça do Trabalho de São Paulo, em relação aos entregadores e, aqui no Ceará, com os motoristas de aplicativo. No entanto, as empresas recorreram e essas liminares foram cassadas", explica.

"As empresas dizem que os trabalhadores têm liberdade para atuar quando quiserem, mas, na prática, eles são tão subordinados ou mais do que muitos trabalhadores. Eles cumprem cargas horárias de 9 a 10 horas por dia, incluindo fins de semana, para ter uma renda mínima e não podem recusar corridas, porque afeta a pontuação. Quando elas chamam os entregadores de microempreendedores, é só um jogo de marketing", afirma a procuradora.

Glauberto Barbosa de Almeida, o Betão, é presidente do Sindicato dos Mototaxistas do Ceará e aponta o momento difícil para os entregadores que trabalham por aplicativo. "Muitos trabalham 16 horas por dia para ganhar R$ 2,2 mil, descontando todos os custos de combustível e manutenção do veículo. No início, tirava-se até R$ 3,5 mil, porque tinha muita demanda e pouca gente - o que não é o caso de agora. Por isso que os apps punem os que se recusam a fazer corridas, porque tem gente de sobra. E essas punições, a meu ver, caracterizam subordinação e, consequentemente, relação de vínculo de trabalho", conclui.

O POVO entrou em contato com as empresas Ifood, James, Rappi, Uber, Uber Eats e Zé Delivery. Em relação ao aumento da cobrança das taxas para os clientes e a diminuição da quantidade paga aos entregadores, o Ifood disse que "os valores acompanham o dinamismo do mercado" e que "o valor médio das rotas é de R$ 8,46, sendo que todas as rotas têm um valor mínimo de R$ 5 por pedido. Em maio, o valor médio por hora trabalhada dos entregadores foi de R$ 21,80. Para fins de comparação apenas, esse valor é 4,6 vezes maior do que o valor por hora, tendo como base o salário mínimo vigente no País".

Pelos dados do Ifood, os ganhos médios mensais do grupo, que tem a atividade de entregas como fonte principal (37% do total), aumentaram 70% em maio ante fevereiro. A empresa disse ainda que "possui 170 mil parceiros de entrega em sua base. No mês de março, "saltamos de 131 mil (fev/2020) para 170 mil entregadores ativos. Atualmente, 64% de nossa base utiliza o app de forma casual, ficando logados cerca de 20 horas por semana - considerando uma semana de 6 dias, isso representa menos de 3 horas por dia".

A Uber e a Uber Eats afirmam apenas que "não houve nenhuma diminuição nos valores pagos pelos usuários por entrega, que seguem sendo determinados por uma série de fatores, como a hora do pedido e distância a ser percorrida".

Já a Rappi informa que criou um "mapa de demanda para ajudar a identificar as regiões com maior número de pedidos de forma a orientá-los sobre os locais com melhores oportunidades. O frete varia de acordo com o clima, dia da semana, horário, zona da entrega, distância percorrida e complexidade do pedido". Dados da empresa mostram que cerca de 75% deles ganham mais de R$ 18 por hora, quando ativos em entregas, e quase metade dos entregadores parceiros passam menos de 1 hora por dia conectados no app.

Sobre a disponibilização de máscaras e álcool, as quatro empresas afirmaram que fornecem os materiais ou fazem o reembolso. Os aplicativos James e Zé Delivery não responderam até o fechamento desta edição.

Os motivos da interrupção dos serviços

Veja algumas das reivindicações dos entregadores dos aplicativos de delivery na paralisação nacional de hoje

Aumento do valor por quilômetro rodado

“A quantidade de pessoas pedindo comida por aplicativo só aumenta, mas as empresas fizeram foi diminuir o valor das taxas de entrega”, diz Betão.

Aumento do valor mínimo de entrega

“Nos horários e dias de movimento fraco, a gente passa horas esperando o aplicativo tocar. Na rua, debaixo de sol e chuva. O ideal seria existir uma taxa mínima a ser paga para que a pessoa que se colocou lá à disposição não volte para casa sem ganhar nem um real”, afirma um entregador motociclista.

Fim dos bloqueios e desligamentos indevidos

“Muitos entregadores se veem bloqueados do dia para a noite sem nem saber o motivo. Imagina você ter que colocar comida na mesa e se ver impossibilitado de trabalhar, sem motivo algum?”, questiona.

Seguro de roubo, acidente e vida

“Vários colegas se acidentam e ficam meses sem trabalhar. Uns até morrem. Se não morre na pista, morre de bala. Fortaleza não é uma cidade fácil, no que diz respeito à criminalidade. A gente está trabalhando para as empresas, mas elas simplesmente lavam as mãos quando alguma coisa ruim acontece”, afirma um ciclista que não quis se identificar.

Fim do sistema de pontuação Rappi

O sistema de pontuação da empresa estaria obrigando os entregadores a trabalhar nos fins de semana. Para conseguir acesso a mais a corridas e determinadas áreas com restaurantes, cada trabalhador precisa atingir uma pontuação mínima por semana, ou seja, quanto mais corridas ele fizer, mais pontos acumula para o período seguinte. Segundo a categoria, esse modelo faz com que o entregador estenda a jornada de trabalho, principalmente aos fins de semana, a fim de alcançar a pontuação que possibilite o acesso à área de trabalho e não tenha pedidos restringidos pelo aplicativo nos dias seguintes.

Alimentação

“O que acontece é um verdadeiro contrassenso, pois os entregadores estão sempre transportando alimentos, refeições e compras, mas não têm auxílio nenhum para comprar um alimento. Muitos passam fome durante a jornada de trabalho”, aponta Mariana Férrer, procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho do Ceará
Equipamentos de proteção Individual
“Os entregadores também querem que as empresas forneçam álcool em gel, máscaras e locais para higienizar os veículos, porque muitos estão bancando esse gasto. Outros acabam se expondo mesmo”, destaca a procuradora.

Fontes: Glauberto Barbosa de Almeida (Betão) - Sindicato dos Mototaxistas do Ceará (Sindimotos-CE) / entregador motociclista de entrega de alimentos / entregador ciclista de entrega de itens variados / Mariana Férrer - Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE)

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