Visualizar a ocorrência diária de homicídios no Estado em 2020 é observar a existência de sobressaltos de violência ao longo do ano. O que mais se destaca ocorreu em fevereiro, nos dias do motim da Polícia Militar. Os cinco primeiros dias do motim tiveram quatro dos dias mais violentos no ano. O dia com o maior número de CVLIs ocorreu durante a paralisação: em 21 de fevereiro, 38 pessoas foram assassinadas em todo o Estado.
A paralisação da PM teve início no fim da tarde de 18 de fevereiro e foi até 1º de março. Entre as reivindicações dos militares estava reajuste salarial com aplicação da inflação dos anos 2021 e 2022. Após representantes da categoria aceitarem proposta do Governo do Estado, parte da categoria não aceitou a proposta e passou a ocupar batalhões e tomar viaturas. O baque no policiamento levou o Governo a solicitar o envio de tropas da Força Nacional e do Exército.
Enquanto isso, os assassinatos explodiram. Com 456 CVLIS, nunca um fevereiro foi tão violento desde 2013, início da série disponibilizada pela SSPDS. Relatos de fontes policiais dão conta de que as facções aproveitaram a ausência de policiamento para atacar territórios "rivais".
Em depoimento à Polícia Civil, um integrante da Guardiões do Estado (GDE) afirmou ter recebido ordens para "proteger" a comunidade Santa Filomena, no bairro Jangurussu, "que vinha sendo atacado desde o inicio da paralisação da Polícia Militar", conforme consta da denúncia do Ministério Público Estadual (MPCE). João Pedro de Abreu Severo foi preso ao lado de John Rodrigues da Rocha e Jonas Victor Rodrigues da Silva, depois de atirar contra uma viatura descaracterizada da Polícia Civil — segundo afirmaram, acharam que o carro tinha integrantes do CV.
Com 18 assassinatos, a região que mais sofreu com os homicídios naqueles dias foi a Área Integrada de Segurança (AIS) 9, onde estão localizados bairros como Mondubim, Maraponga, José Walter e Conjunto Esperança. Nessa região, foram registrados cinco homicídios, em um intervalo de três dias, que a Polícia suspeitou ter sido praticado por um mesmo grupo, por causa do modus operandi semelhante.
Testemunhas relataram a existência de grupos de motociclistas em todas as ocorrências. As mortes de Mateus Ferreira da Conceição, Marcelo Vinicius Silva de Oliveira, Adriano Jesus de Sá, Francisco Bruno Cosmo Sena e Antônio Rubens Castro de Souza seguem sendo investigadas e não resultaram em denúncia até o momento. O MPCE solicitou que os projéteis das armas encontradas nos locais do crime fossem comparados.
Outro caso que segue em investigação é o que vitimou Jose Guilherme da Costa Camara, 17, no bairro Vicente Pinzón. A investigação apontou que o crime foi cometido por cerca de 12 homens, que usavam balaclavas e estavam em seis motos. Eles abordaram a vítima e ordenaram que ele ficasse de costas, com as mãos na parede. Foi quando José Guilherme se virou para trás que eles dispararam. Após atirar, eles teriam juntado as cápsulas e permanecido rindo no local do crime. Neste caso, porém, relatos de testemunhas levaram os investigadores a suspeitar da participação de agentes de segurança no crime. Por isso, o caso é investigado pela Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública (CGD).
O POVO solicitou à SSPDS, através da Lei de Acesso à Informação (LAI), o número do inquérito de todos os assassinatos ocorridos durante o motim para verificar o andamento das investigações sobre o caso. A pasta não repassou as informações, afirmando que os dados são "estratégicos".