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Esperança vigiada: o que pensam e sentem os vacinadores
Reportagem

Esperança vigiada: o que pensam e sentem os vacinadores

Profissionais da enfermagem, de Fortaleza e do Interior, comentam a experiência de levar as tão aguardadas doses e realizarem o trabalho diante das câmeras que registram o momento marcante, mas também serve para fiscalizar se a aplicação ocorre como deveria
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FORTALEZA, CE, 09-04-2021:  Relato da enfermeira Adja Montenegro, 32, que esta trabalhando na campanha de vacinacao da Covid-19.  A entrevista e sobre como esta sendo a vivencia, o impacto na vida pessoal e profissional e como e o dia a dia nos locais de vacinacao. Centro de Eventos, Edson de Queiroz.( BARBARA MOIRA/ O POVO) (Foto: BARBARA MOIRA)
Foto: BARBARA MOIRA FORTALEZA, CE, 09-04-2021:  Relato da enfermeira Adja Montenegro, 32, que esta trabalhando na campanha de vacinacao da Covid-19. A entrevista e sobre como esta sendo a vivencia, o impacto na vida pessoal e profissional e como e o dia a dia nos locais de vacinacao. Centro de Eventos, Edson de Queiroz.( BARBARA MOIRA/ O POVO)

Desde que a campanha de vacinação contra a Covid-19 teve início no Brasil, as redes sociais passaram a guardar registros dos momentos em que se recebe as “doses de esperança”. São fotos e vídeos de um instante que antes era tão corriqueiro, o de ser vacinado, e na pandemia passou a despertar novas emoções. Para quem as aplica, também não é algo trivial. No dia a dia, vacinadores dividem alegrias, tristezas, orgulho da profissão e confiança na Ciência.

Tanto por acrescentar à bagagem profissional quanto por motivos pessoais, a experiência na vacinação contra a Covid-19 tem sido importante para Adja Montenegro, 32, que atua no Centro de Eventos, em Fortaleza. A enfermeira perdeu a avó para a Covid-19 há um ano e gostaria que ela pudesse ter vivenciado esse processo. “Nada paga (poder) fazer parte desse trabalho. E apesar de, às vezes, ser bastante cansativo, já nos adaptamos à rotina. A gente se ajuda”, diz.

Patrícia Rolim (esq), enfermeira em Brejo Santo, é parte da equipe volante de vacinação
Patrícia Rolim (esq), enfermeira em Brejo Santo, é parte da equipe volante de vacinação (Foto: ACERVO PESSOAL)

Coordenadora da Atenção Básica à Saúde de Brejo Santo, município localizado a 502,4 km da Capital, Patrícia Rolim Rocha faz parte da equipe volante que deu início à vacinação na cidade e dá apoio às equipes de Saúde da Família para acelerar a aplicação. Apesar de ter outra função, ela faz questão de continuar atuando na campanha até o último vacinado. “A alegria de quem recebe as doses é muito grande, está sendo muito gratificante. E essa emoção não passa. Vão passando os dias, vão chegando as novas doses, e a sensação é como a primeira, lá do início”, comenta.

Diversos aspectos diferenciam a vacinação contra a Covid-19 de outras campanhas de imunização. A expectativa de quem recebe a vacina e a rapidez com que as doses são aplicadas logo que chegam aos municípios são alguns deles. “Acho que a vacina da influenza todo mundo quer tomar para não gripar. Na da Covid-19 o sentimento é outro. O pensamento é, realmente, de sobrevivência”, observa Patrícia.

Além disso, há o reconhecimento dos profissionais em forma de presentes e lembranças, pontua Adja. Quando menos esperam, recebem bolos, salgados e outras comidas com bilhetes enviados por empresas ou outros “mimos” levados por idosos que comparecem aos locais de vacinação. Além disso, tem sido comum que as pessoas desabafem com os vacinadores. “(São) pessoas que estão vindo se imunizar e acabaram de perder alguém que também poderia, mais para frente, estar aqui recebendo essas doses de esperança”, lamenta a enfermeira.

FORTALEZA, CE, 09-04-2021:  Relato da enfermeira Larissa Domingues, 26, que esta trabalhando na campanha de vacinacao da Covid-19.  A entrevista e sobre como esta sendo a vivencia, o impacto na vida pessoal e profissional e como e o dia a dia nos locais de vacinacao. Centro de Eventos, Edson de Queiroz.( BARBARA MOIRA/ O POVO) .
FORTALEZA, CE, 09-04-2021:  Relato da enfermeira Larissa Domingues, 26, que esta trabalhando na campanha de vacinacao da Covid-19.  A entrevista e sobre como esta sendo a vivencia, o impacto na vida pessoal e profissional e como e o dia a dia nos locais de vacinacao. Centro de Eventos, Edson de Queiroz.( BARBARA MOIRA/ O POVO) . (Foto: BARBARA MOIRA)

Foi o caso de uma mãe que havia perdido dois filhos para a Covid-19 ou de uma médica que, minutos antes do horário agendado para a vacina, havia perdido um familiar. “O paciente chega tão nervoso por essas situações que temos que acalentá-lo no momento da imunização”, complementa Larissa Domingues, 26, enfermeira que também trabalha no Centro de Eventos, na Capital. “Graças a Deus temos aqui uma equipe muito humanizada.”

Rodrigo Rosa em carroça para vacinar em Juazeiro do Norte
Rodrigo Rosa em carroça para vacinar em Juazeiro do Norte (Foto: ACERVO PESSOAL)

A forte emoção causada pela oportunidade de receber o imunizante também é narrada por Rodrigo Rosa, enfermeiro da Atenção Básica à Saúde em Juazeiro do Norte, a 489,2 km de Fortaleza. A maioria das pessoas, ele conta, choram e querem registrar o momento para compartilhar com um parente distante. Mas as exceções existem. Por conta de fake news e desinformação, há pacientes de Rodrigo que têm recusado a vacina.

“Estamos sofrendo muito não só com as fake news de que a vacina faz mal à saúde, de que pode até matar; mas aqui na região também tem uma sobre calendário de vacinação”, afirma. Isso leva à presença de idosos que não deveriam comparecer ao local e causa um “tumulto enorme”. “É uma demanda extra que temos que administrar e que não estávamos esperando. Isso termina sobrecarregando muito.”

Outra particularidade da atual campanha é a maior vigilância por parte da população, por situações já noticiadas na aplicação. Apesar de a maioria dos registros serem realizados para se guardar a recordação, há quem seja invasivo ou agressivo e não peça autorização para a equipe. Larissa Domingues sente que existe a pressão, mas trabalha com tranquilidade por saber que executa a atividade de forma científica e técnica.

“Não me preocupo de as pessoas filmarem o procedimento, o estabelecimento, o material usado. Às vezes, só pedimos para não filmar o rosto, porque são muitos vídeos, realmente, que rodam na internet”, explica a enfermeira. A colega de trabalho, Adja Montenegro, concorda e percebe a prática como uma “novidade” da pandemia. “Minha experiência toda é na Imunização e eu nunca tinha visto algo assim, mesmo que a gente sempre faça tudo mostrando o paciente.”

De acordo com o artigo 21º do novo Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, “negar-se a ser filmado, fotografado e exposto em mídias sociais durante o desempenho de suas atividades profissionais” é um direito. No contexto da pandemia, como percebe a agitação das pessoas, Rodrigo conta que tem deixado a prática mais “livre”.

“E estamos seguindo à risca o protocolo da Sesa (Secretaria da Saúde do Ceará), que pede para não deixar a dose pronta, sempre preparar na frente do paciente ou do acompanhante”, complementa. Daqui para frente, o enfermeiro espera é “o dobro de trabalho”, pelo início da vacinação contra a influenza, que já começou e não pode ser administrada à mesma pessoa no mesmo período que as vacinas contra a Covid-19.

Frases 

“Quando nos foi autorizado a tomar a vacina, eu fiquei muito nervosa, mas de alegria. Jamais por medo de tomá-la.” — Adja Montenegro, 32, enfermeira

“Eu me lembro da primeira vez que eu toquei a caixa da vacina. Não consegui segurar. Os olhos lacrimejavam e a mão (ficou) trêmula, sabe? É muito gratificante, muito mesmo.” — Adja Montenegro, 32, enfermeira

“A gente defende o SUS (Sistema Único de Saúde) e a vacina como se fossem pai e mãe.” — Larissa Domingues, 26, enfermeira

“(Gostaria de) frisar a importância da Enfermagem na Saúde. Somos um pilar para a Saúde, tanto na promoção, na prevenção como na reabilitação do paciente.” — Larissa Domingues, 26, enfermeira

“A experiência tem sido ímpar. É uma coisa sem explicação, porque mais do que nunca a população precisa de você, do seu cuidado, do seu entendimento de mundo. Precisa de você como um todo, do seu tempo.” — Rodrigo Rosa, 36, enfermeiro da Atenção Básica à Saúde em Juazeiro do Norte

“Sei que é um momento histórico e, quando chegar lá na frente e tivermos vencido tudo isso, vou olhar para trás e dizer: ‘meu Deus, eu fiz parte, dei minha contribuição’.” — Patrícia Rolim Rocha, 36, coordenadora da Atenção Básica à Saúde de Brejo Santo

“Me marca muito saber que todo o quadro da nossa secretaria está voltado para isso, independentemente do dia e da hora. Todo mundo (está) na ansiedade pelas novas doses para que a gente consiga imunizar a nossa população.” — Patrícia Rolim Rocha, 36, coordenadora da Atenção Básica à Saúde de Brejo Santo

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