Logo O POVO+
Quem é a base que apoia tanto Camilo quanto Bolsonaro
Reportagem

Quem é a base que apoia tanto Camilo quanto Bolsonaro

| LÁ E CÁ | Se parecem governos absolutamente antagônicos para o eleitorado, governos estadual e federal possuem simpatizantes "duplos" no Ceará, que não enxergam incoerência em conceder apoio a ambas as gestões. Entenda a questão, que pode ter reflexos até em 2022
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Plenário da Câmara Federal (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil Plenário da Câmara Federal

Quando as primeiras imagens da viagem de Jair Bolsonaro (sem partido) a Tianguá, em fevereiro deste ano, caíram nas redes sociais, um burburinho tomou conta da base aliada de Camilo Santana (PT). Horas antes, o governador já havia se manifestado sobre a viagem, se dizendo "frontalmente contrário" a uma "real possibilidade de muitas aglomerações", em recado claro de desaprovação do petista com o evento promovido pelo presidente.

Na época, o Ceará vivia momento grave da pandemia, com chance cada vez mais real de uma segunda onda de Covid-19. A imagem da comitiva do Planalto, no entanto, chamava a atenção por não conter só "bolsonaristas puros", como André Fernandes (Republicanos) ou Delegado Cavalcante (PTB). Ao lado de Bolsonaro, apareciam sorrindo também aliados de primeira hora do governador - como Domingos Neto (PSD) e AJ Albuquerque (PP).

A presença dos "camilistas" chamou atenção pelo caráter da viagem - tida como ato político do presidente e questionada pelo momento de pandemia -, mas o fato não era exatamente novo no cenário político local. Desde a posse do novo governo, ainda em 2019, diversos parlamentares cearenses têm se "equilibrado" entre o apoio local a Camilo e o apoio a Bolsonaro no plano federal - por mais antagônicas que possam ser as duas gestões.

Desses, AJ Albuquerque e Domingos Neto são os que adotam postura mais ativa, participando de eventos e subindo em palanques ao lado do presidente. Outros, como Genecias Noronha (SD) e Júnior Mano (PL), variam entre seguir o governo na maioria das votações da Câmara e até manter influência na indicação de cargos em órgãos federais.

"Muitas vezes, as discussões que se travam a nível nacional são diferentes das que se travam a nível estadual", justificou, em entrevista ao Jogo Político, Domingos Neto, negando qualquer constrangimento no apoio "duplo". "Eu tenho tentado fazer exatamente o inverso, fazer com que, em vez de uma política radical, de ódio, possamos construir pontes", diz.

"Foi assim que consegui buscar, por exemplo, recursos para que a gente pudesse tocar obras como o Cinturão das Águas, executada pelo Estado, mas com recursos federais, para o Metrô de Fortaleza, o terreno para o Centro Integrado de Segurança. O objetivo, como deputado, é fazer com que essa relação possa servir ao Estado do Ceará", afirma ainda.

Ele destaca que a questão está longe de ser exclusividade do Ceará, ocorrendo em vários outros estados. "As posições partidárias mudam de estado a estado. Existem estados onde o partido vai estar mais alinhado à esquerda, e em outros mais à direita. A nível federal isso não tem como ocorrer, é uma posição única, mas mantemos independência", diz.

Tanto no caso de Neto quanto no de Albuquerque, há ainda componente curioso sobre o "apoio duplo", com possível impacto das alianças nas eleições de 2022. O pai de Domingos, o ex-vice-governador Domingos Filho, é hoje o maior líder do PSD no Ceará, que saiu da eleição de 2020 com 30 prefeitos - a segunda maior força do Estado, atrás apenas do PDT.

Em entrevistas recentes, pai e filho têm afirmado que o PSD não abrirá mão de lançar candidato na disputa majoritária de 2022, seja na chapa para o Governo do Ceará ou para o Senado. A pretensão coloca pressão sobre a base de Camilo no Estado, que até recentemente tinha como "favorito" para o Senado o próprio petista.

Pelo bolsonarismo, já é dada como certa a participação de Capitão Wagner (Pros) na disputa pelo governo. Domingos, no entanto, avalia que há "muita água pela frente" até 2022. "Creio que nem o presidente queira influenciar meu voto no Estado, nem o governador vai querer influenciar meu voto a presidente", diz.

Caso de AJ é ainda mais curioso. Atual secretário das Cidades de Camilo e um dos aliados mais próximos dos Ferreira Gomes no Ceará, o deputado Zezinho Albuquerque (PDT), pai de AJ, também não esconde pretensões por voos maiores dentro da base aliada.

A reportagem procurou AJ Albuquerque para ouvir o deputado sobre o caso, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

 

O que você achou desse conteúdo?