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Orla de Fortaleza terá nova paisagem de ponta a ponta
Reportagem

Orla de Fortaleza terá nova paisagem de ponta a ponta

| DA SABIAGUABA À BARRA DO CEARÁ | Ponte dos Ingleses deve ficar para novembro do próximo ano e Centro Gastronômico da Sabiaguaba é previsto para 2023. Mais de R$ 270 milhões foram investidos na zona costeira da Capital
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FORTALEZA, CE, BRASIL, 24-09.2021: Trecho Projeto Beira Rio, na Barra do Ceará. Andamento de obras em execução na orla de Fortaleza, Fortaleza tem hoje diversas obras de urbanização em execução na orla. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO) (Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves FORTALEZA, CE, BRASIL, 24-09.2021: Trecho Projeto Beira Rio, na Barra do Ceará. Andamento de obras em execução na orla de Fortaleza, Fortaleza tem hoje diversas obras de urbanização em execução na orla. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)

De leste a oeste, da foz do rio Cocó à foz do rio Ceará, a orla de Fortaleza passa por diversas intervenções de requalificação e urbanização ao longo dos últimos anos. Grandes projetos tiveram início em 2020, outros são anteriores e a maioria tem entrega prevista até julho de 2022.

“A orla é uma das áreas mais importantes na nossa Cidade. Os bairros Pirambu, Cristo Redentor e Barra do Ceará formam a área de mais alta densidade ocupacional”, aponta Samuel Dias, titular da Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinf). “Produzir espaços atrativos e que gerem emprego, renda e opções de lazer é fundamental.” As obras, entretanto, precisam conciliar os objetivos da pasta com as demandas da população. Além disso, enfrentam atrasos ocasionados pela paralisação das atividades diante da pandemia de Covid-19.

A intervenção que deve levar mais tempo, por ter iniciado no último julho, é o Centro de Gastronomia Tradicional da Sabiaguaba, que tem mais de um quarto das obras já realizadas por meio da Superintendência de Obras Públicas (SOP). O projeto de arquitetura prevê 20 quiosques, bilheteria, guarita, sanitários e área para 70 mesas. Conforme a pasta, a obra preza pelo “uso de pisos elevados que tocam o solo de forma pontual, uso de madeira biossintética e implantação de teto jardim, diminuindo a carga térmica sobre a laje dos quiosques.”

A cerca de nove quilômetros dali está a comunidade Serviluz, no bairro Cais do Porto. A região passa por obras há mais de dois anos e deve estar pronta no primeiro semestre de 2022. De acordo com a Seinf, as avenidas Leite Barbosa e Pontamar estão com 40% dos serviços executados, sendo eles recapeamento e drenagem das avenidas e construção de uma Areninha. O POVO esteve no local e, durante a visita, constatou que nas obras não havia operários trabalhando e a areia cobre a quadra e parte das pistas.

São, aproximadamente, 2 km de vias que aguardam calçadão ampliado, ciclofaixa, pista de skate, academia ao ar livre, playground e quadra poliesportiva. Também são previstos três blocos com 11 boxes para comércio local, dois banheiros e estacionamento. O projeto prevê ainda a contenção da faixa de areia com vegetação nativa e cercas de palha de coqueiro para direcionar os ventos.

Ponto marcante da área, o antigo Farol do Mucuripe aguarda ser restaurado. O projeto de restauração está sendo elaborado pela Secretaria de Turismo de Ceará (Setur) e aguarda apreciação pelo secretário Arialdo Pinho e pelo governador Camilo Santana antes de ser divulgado. Assim, não há previsão para início das obras. A área permanece isolada por barreiras instaladas pela SOP para evitar acidentes.

Andando mais alguns quilômetros no sentido leste-oeste, o Mercado dos Peixes, concedido à iniciativa privada, está sendo modernizado. Segundo Eliseu Barros, administrador do local, o caramanchão está concluído. O estacionamento foi reestruturado e um bar e dois banheiros climatizados estão em construção. “Na primeira quinzena de outubro, concluiremos uma sala climatizada de manipulação e beneficiamento de pescado”, adiciona.

Já a avenida Beira Mar está em obras há três anos. A Seinf afirma que 97% dos serviços foram executados e toda a intervenção será concluída até o fim de 2021. Atualmente, paisagismo, revestimentos dos quiosques, acabamentos de piso e a construção da nova feirinha, com 707 boxes comerciais, estão em andamento.

A pasta informa que até a conclusão dos serviços a região contará com novos postes de iluminação, espaços para convivência com caramanchões, academias, banheiros, parques infantis, quadras de vôlei de praia, anfiteatro, pista de hockey, Casa do Turista e quiosques para alimentação e bebidas. “Todos padronizados, que vão garantir o reordenamento do comércio na região”, afirma em nota.

Seguindo o caminho da orla, está a Ponte dos Ingleses: interditada desde 2018, a estrutura passa por serviços de infraestrutura. Ancoragem, concretagem das ferragens, manutenção preventiva e restauro visam recuperar todos os pilares e vigas do equipamento. A Seinf estima que essa etapa seja entregue em novembro. Somente então, a SOP dará início à requalificação do equipamento e do entorno, com piso industrial, guarda-corpo e quiosques. Essa ação tem prazo de 12 meses para conclusão.

Na Vila do Mar, um trecho de cerca de 300 metros é o que falta para a entrega total do projeto. “Essa é uma área densamente povoada e com habitações em áreas de risco; não é apenas um trecho de construção de pista e calçadão. É necessário que toda essa população seja indenizada da forma correta para que possa habitar outro local”, aponta o secretário Samuel Dias. Segundo ele, o valor necessário para as indenizações supera o valor total da obra e a “Prefeitura de Fortaleza está se organizando para iniciar essas indenizações".

Finalmente, no extremo oeste da Cidade, está sendo construído o projeto Beira Rio. Quem passa pela região já pode perceber a conclusão de dez boxes comerciais, duas quadras poliesportivas, uma quadra de areia e parte do calçadão. Atualmente, estão em andamento os serviços de execução dos quiosques, calçadão e remoção das desapropriações para dar continuidade ao muro de contenção e urbanização.

O novo calçadão será integrado à Vila do Mar e terá novo mobiliário, paisagismo e academia ao ar livre, além da revitalização da Praça do Forte de Santiago. Atendendo ao pedido dos moradores e comerciantes, a praia contará também com chuveirões, bicicletários, estacionamento e posto de guarda-vidas. As obras estão com 40% de execução e têm previsão de entrega total para o primeiro semestre de 2022.

FORTALEZA, CE, BRASIL, 24-09.2021: Trecho Projeto Beira Rio, na Barra do Ceará. Andamento de obras em execução na orla de Fortaleza, Fortaleza tem hoje diversas obras de urbanização em execução na orla. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 24-09.2021: Trecho Projeto Beira Rio, na Barra do Ceará. Andamento de obras em execução na orla de Fortaleza, Fortaleza tem hoje diversas obras de urbanização em execução na orla. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)

O andamento das obras

Centro de Gastronomia Tradicional da Sabiaguaba

Status atual: 26% dos serviços executados

Investimento: R$ 9.269.359,85

Área: cerca de 25 mil m²

Início da obra: julho de 2021

Previsão de entrega: até 2023

 

Serviluz

Status atual: 40% dos serviços executados

Investimento: R$ 8,5 milhões

Área: 2 km de extensão

Início da obra: março de 2019

Previsão de entrega: primeiro semestre de 2022

 

 

Farol do Mucuripe

Status atual: a área está isolada para evitar acidentes. Um projeto de restauro está sendo elaborado pela Secretaria de Turismo do Ceará (Setur). Não há previsão para início das obras


Mercado dos Peixes

Status atual: concedido para iniciativa privada até 2038, passa por modernização

Investimento: R$ 8 milhões


Beira Mar

Status atual: 95% dos serviços executados

Investimento: R$ 123 milhões

Área: 66 mil m²

Início da obra: julho de 2018

Prazo inicial: agosto de 2020

Previsão de entrega: segundo semestre de 2021 


Ponte dos Ingleses

Status atual: serviços de infraestrutura estão em execução; depois, o Estado dará início à requalificação do equipamento e entorno

Investimento: R$ 5 milhões

Área: mais de 2 mil m²

Início da obra: janeiro de 2021 - o equipamento está interditado desde 2018

Previsão de entrega: a infraestrutura deve estar finalizada em novembro


Vila do Mar - 2ª etapa

Status atual: 40% dos serviços executados

Investimento: R$ 120 milhões

Área: 620 m de extensão

Início da obra: março de 2018

Prazo inicial: março de 2019

Previsão de entrega: primeiro semestre de 2022


Beira Rio

Status atual: 40% dos serviços executados

Investimento: R$ 7,8 milhões

Área: 33 mil m²

Início da obra: agosto de 2020

Previsão de entrega: primeiro semestre de 2022

FORTALEZA-CE, BRASIL, 29-09-2021  Obras de urbanização em execução na orla. com 40% dos serviços executados, já realizaram parte dos novos passeios, drenagem e construção de uma nova Areninha. Tinha previsão de entrega até julho de 2022 Local apresenta-se sem trabalhadores e com a areia tomando conta da Areninha e da via.  (Foto: Júlio Caesar / O Povo)
FORTALEZA-CE, BRASIL, 29-09-2021 Obras de urbanização em execução na orla. com 40% dos serviços executados, já realizaram parte dos novos passeios, drenagem e construção de uma nova Areninha. Tinha previsão de entrega até julho de 2022 Local apresenta-se sem trabalhadores e com a areia tomando conta da Areninha e da via. (Foto: Júlio Caesar / O Povo)

Ocupação do litoral alencarino transforma ambientes e comunidades

A relação de Fortaleza com sua orla nem sempre foi parecida com a atual. Segundo o geógrafo Eustógio Dantas, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), "a lógica da urbanização é recente, entre os anos de 1920 e 1930". Parte dos fortalezenses descobriu as praias como local de sociabilidade e construiu casas de veraneio nas praias de Iracema, Meireles e Mucuripe.

Enquanto alguns encontravam novo lazer, outros gradualmente foram expulsos. "Deu-se um embate com as populações tradicionais. Especialmente na década de 1960, quando começaram a construir prédios residenciais", conta Dantas. O que era de uso ocasional ganhou a dinâmica de moradia de uma elite e os calçadões foram construídos.

Conforme o professor, a partir da década de 1980 os governos buscaram evitar ou minimizar a exclusão social. Ele cita como exemplos a criação de centros de lazer à beira-mar e de linhas de ônibus dos bairros para as praias. Ainda assim, a gentrificação é marcante. "Isso é diferente na porção oeste com a Vila do Mar, onde se teve a preocupação de manter os moradores. Mas é preciso esperar, ver se a dinâmica imobiliária não vai alterar", ressalva.

Moradora da região, Beatriz Maciel lembra que, no início das obras, "a população estava sem entender". "O projeto estava sendo estudado há 'décadas', mas pra nós foi do nada." Ela conta que as desapropriações foram o ponto mais crítico, mas houve solução com indenizações ou novas moradias. No geral, ela vê que o projeto trouxe melhorias: lazer para as crianças e mais estrutura para os moradores montarem barzinhos e barracas de comida.

O atual secretário da Infraestrutura, Samuel Dias, assegura que "procura sempre ouvir a comunidade antes, durante e depois da execução das obras". Ele cita como exemplos de escuta adequações feitas para a pesca esportiva no Beira Rio, colocação de piso específico que não prejudique esportes na avenida Beira Mar e mudanças no projeto no Serviluz enquanto Zona Especial de Interesse Social (ZEIS).

Entretanto, moradores da comunidade no bairro Cais do Porto têm outra percepção. "Houve falta de planejamento; começavam de um jeito e depois tinha que refazer algumas coisas", diz o agricultor urbano Bruno Ribeiro. Vivendo no Serviluz há 33 anos, Ribeiro afirma que "as obras estão paradas no momento e causam transtornos com as calçadas quebradas, a areia invadindo os quiosques".

Hoje, a maioria das obras em curso na orla são onde há moradias de risco. "É importante que seja feito com diálogo e compreensão", aponta o secretário. "As áreas devem beneficiar quem vai visitá-las, mas principalmente quem reside". A Seinf garante que trabalha "sempre muito integrada" com a Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor), a Secretaria Municipal dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS) e a Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE).

Preocupação semelhante é afiançada pela Sema na Sabiaguaba. "É um projeto construído em consenso, com sugestões da comunidade e debates nos conselhos gestores do Cocó e da Sabiaguaba, e que segue as medidas das áreas de proteção", enfatiza o secretário Artur Bruno. Ele aponta ainda que a obra não é feita nas dunas, e sim no lado oposto.

Para Luiza de Sousa, presidente das associações de moradores e dos comerciantes da Sabiaguaba, a reformulação é vista com bons olhos. "Tudo o que a gente tinha para trabalhar era necessário para sobreviver, mas sabíamos que estava afetando aquela parte do rio", afirma, lembrando a falta de esgotamento correto. "Foram três anos discutindo esse projeto. E conseguimos o que todo mundo queria: cuidar da natureza, das famílias e dos turistas."

Para Dantas, a área tem grande risco de testemunhar a substituição de comunidades tradicionais por loteamentos de luxo. "O governo dá garantias da manutenção da população, mas nada é garantido. Depende muito da capacidade de mobilização e de resistência das comunidades", opina.

 

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