As urnas mal haviam sido fechadas no último domingo, 2, e os dois candidatos que foram ao segundo turno já começavam as suas articulações de olho na vitória.
No dia seguinte ao do pleito, Jair Bolsonaro (PL) recebeu apoio expressivo de governadores, enquanto Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negociava a adesão de adversários na corrida.
Do lado bolsonarista, engrossaram as fileiras Romeu Zema (Novo), Cláudio Castro (PL) e Rodrigo Garcia (PSDB), governadores de Minas, Rio e São Paulo, respectivamente.
A Lula se juntaram nomes fortes da disputa. Terceiro e quarto colocados, Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) manifestaram-se a favor do ex-presidente.
Além da declaração de apoio, Tebet, que terminou a campanha com 5 milhões de votos, foi além, prometendo participar ativamente desta segunda etapa do pleito. Na sexta-feira, 7, a emedebista esteve em evento ao lado de Lula.
Ciro, por sua vez, limitou-se a gravar um vídeo, sem citar Lula ou o PT. O aceno do pedetista foi comemorado, no entanto. O ex-ministro obteve pouco mais de dois milhões de votos na eleição.
Fora desse grupo, outros personagens se mostraram favoráveis à eleição de Lula, entre eles os tucanos Fernando Henrique Cardoso e Tasso Jereissati. Senador pelo Ceará e adversário do PT, Tasso se reuniu com Lula na quinta-feira, 6. FHC, ex-presidente da República, encontrou o petista 24 horas depois.
Essa queda de braço por apoios pode definir a eleição no segundo turno? Para especialistas ouvidos pelo O POVO, Lula segue em vantagem, mas Bolsonaro avançou numa posição mais vantajosa do que estava no primeiro turno.
Se a nova etapa é uma corrida, o presidente pode ter largado melhor. Ele precisa, no entanto, de mais votos para conseguir uma ultrapassagem sobre Lula, que tem uma dianteira de seis milhões de sufrágios.
"Bolsonaro recebeu apoios importantes no Sudeste, que é uma região em que ele não foi tão ruim quanto se esperava. Talvez tenha caído mais na real e pisado mais concretamente no chão até agora do que os movimentos do Lula", analisa Emanuel Freitas, professor de ciência política da Universidade Estadual do Ceará (Uece).
De acordo com Freitas, o candidato à reeleição deu-se conta mais rapidamente de que o segundo turno seria um páreo duro. "No discurso mesmo do domingo", frisa, "ao falar dos mais pobres, sinalizou com a antecipação do pagamento do Auxílio Brasil".
Conforme o pesquisador, esses "movimentos foram mais acertados do que os de Lula", cuja campanha demorou para reagir, ainda sob o impacto do resultado apertado da votação: 48% do petista ante 43% de Bolsonaro.
Professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Fabio Kerche pondera que, embora o presidente tenha reunido adesões importantes de governadores dos três maiores colégios eleitorais, a transferência de votos não se dá de maneira automática.
"A transferência de votos nunca é total, por mais que o candidato peça. É uma vantagem para a campanha, mas não acredito que seja suficiente pra mudar. Porque não vai conseguir transferir todos e o desafio do Bolsonaro é mais do que simplesmente crescer, ele precisa crescer, mantendo-se as votações estáveis, e no limite quase que tirar voto do Lula", aponta o pesquisador.
Ainda de acordo com Kerche, Bolsonaro tem motivo para celebrar. Afinal, impediu que a fatura se liquidasse no primeiro turno e aglutinou forças no segundo. Mas relativiza esses deslocamentos.
"É uma notícia boa para ele, mas não é suficiente pra dizer que pode acontecer a virada", argumenta. "A virada dele é bastante improvável. O padrão de eleições mostra que quem termina na frente com essa vantagem, somada com a rejeição do Bolsonaro, é favorito. Lula ainda é favorito."
Cientista político e professor da Faculdade Mackenzie (SP), Rodrigo Prando concorda. Segundo ele, "matematicamente, a probabilidade maior de vitória a gente sabe que é do Lula".
O docente enfatiza, no entanto, que, "politicamente, Bolsonaro está mais fortalecido do que se imaginava no primeiro turno".
Eleitorado de Ciro e Tebet será decisivo
Antes adversários de Lula no pleito, Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) declararam voto no petista no segundo turno. Somando-se, eles obtiveram quase 8 milhões de votos no primeiro turno.
Para Vitor Sandes, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), esse eleitorado de Tebet e Ciro vai ser decisivo na eleição.
"Esses apoios podem ser importantes para elevar a votação e avançar sobre os votos dos eleitores que apoiaram outras candidaturas no primeiro turno", afirma.
Segundo ele, "tentar conquistar os votos dos eleitores que votaram no Ciro e na Simone Tebet e tentar evitar que a abstenção, que geralmente aumenta no segundo turno, influencie sobre a votação" é um dos desafios tanto para Lula quanto para Bolsonaro.
Ambos têm a missão de tentar conquistar esse espólio dos candidatos derrotados. Embora pesquisas indiquem migração de maior fração para Lula, uma parcela deles cogita ir para Bolsonaro. (Henrique Araújo)
Campanha de Lula foi "pouco propositiva"
Para Emanuel Freitas (Uece), o ex-presidente Lula terá de corrigir um erro cometido no primeiro turno. Segundo ele, a campanha do petista foi "pouco propositiva".
"Acho que a campanha dele no primeiro turno se centrou muito na defesa da democracia e dos seus governos. Foi pouco propositiva, e acho que é isso que deve fazer no segundo turno", diz.
O pesquisador afirma que uma correção de rumos passa pelo diagnóstico do Brasil de hoje, mas também pela sinalização do que deve fazer.
"Qual é o Brasil que nós temos com Bolsonaro e qual é o Brasil que ele propõe? Não apenas o Brasil que era o Brasil dele, porque isso a gente sabe. É preciso que mostre o Brasil que temos e o Brasil que será com ele", aponta.
Finalmente, Freitas considera que o petista não deveria perder tempo tentando conquistar votos de segmentos que o rejeitam, tais como os evangélicos.
O mais importante seria reforçar as bases do seu eleitorado no Nordeste e tentar diminuir a distância que o separa de Bolsonaro no Sul e Sudeste. (Henrique Araújo)