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Ceasa 50 anos: as histórias de quem abastece a mesa dos cearenses
Reportagem

Ceasa 50 anos: as histórias de quem abastece a mesa dos cearenses

Com três entrepostos, a Central de Abastecimento do Ceará faz com que mais de 500 toneladas de produtos alimentícios cheguem aos 184 municípios do Estado, além de outras cidades
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Wilson Matos Costa trocou o emprego em um banco para se tornar comerciante de frutas na Ceasa-CE (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Wilson Matos Costa trocou o emprego em um banco para se tornar comerciante de frutas na Ceasa-CE

 

“Em discurso pronunciado ontem, por ocasião da solenidade de inauguração da Central de Abastecimento do Ceará, o governador César Cals destacou o trabalho realizado pelo Ministério da Agricultura em favor da atividade primária regional”. Assim se inicia o texto publicado no O POVO, em 10 de novembro de 1972, a fim de noticiar a abertura da Ceasa-CE. O governador destaca o papel das autoridades e as políticas voltadas ao estímulo da agricultura. Mas não só de formalidades se forma a cinquentenária empresa.

Com três entrepostos, situados em Maracanaú, Barbalha e Tianguá, a Ceasa faz com que mais de 500 toneladas de produtos alimentícios cheguem aos 184 municípios do Ceará e em regiões dos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Maranhão. São 1.289 permissionários, gerando 10.300 empregos diretos e 15.800 empregos indiretos em todo o Estado. Junto deles, são criadas e repassadas as histórias de milhares de trabalhadores e suas respectivas famílias.

Ceasa completa 50 anos de atividade (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Ceasa completa 50 anos de atividade

Antes de ser oficialmente inaugurada em Maracanaú, a Ceasa-CE possuía um escritório que funcionava no Centro de Fortaleza, onde iniciou suas atividades e onde os primeiros funcionários começaram a trabalhar. Só em novembro de 1972 mudou-se para Maracanaú, levando consigo muitos dos comerciantes que vendiam frutas e verduras no Centro.

Entre eles estava o analista de mercado Odálio Girão, que faz parte da empresa antes mesmo de ela se estruturar em galpões. “Estou aqui desde a pesquisa para o projeto do que é hoje a segunda maior central de abastecimento do Nordeste, faz quase 52 anos”, conta. “Passei por quase todos os departamentos e com isso fui conhecendo o abastecimento, a logística e a comercialização”. A maior Ceasa da Região é no Recife (PE). 

“Até os anos 1990, a Ceasa se expandiu muito, o mercado estava absorvendo cada vez mais e a demanda, aumentando; mas os produtos eram praticamente os mesmos: banana, laranja, mamão, tomate”, lembra. “Depois o consumidor passou a exigir outros produtos e passamos pelo crescimento da diversificação. Isso estimulou a produção em todo o Ceará e devemos crescer ainda mais nos próximos anos.” 

Como Odálio, alguns permissionários estão nos galpões de Maracanaú desde os primeiros anos de funcionamento. O POVO conta suas histórias para celebrar os 50 anos da Ceasa, comemorado nesta quarta-feira, 9 de novembro de 2022. 

 

 

O permissionário mais antigo em atividade

Francisco Ferreira Manço, o Chico Briba, é conhecido por todos os galpões da Ceasa em Maracanaú. Trabalhando há mais de quatro décadas no local, o vendedor de frutas é o permissionário há mais tempo em atividade.

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 “Faz uns 45, 46 anos que estou aqui. Trabalhava no mercado velho da (avenida) Duque de Caxias e o pessoal trouxe a gente de lá pra cá”, conta. Por alguns anos, seu principal produto era a laranja; hoje, o sustento da família vem das “carradas” de abacate que chegam toda semana vindas do Espírito Santo (ES).

“Mil quilos para um, 500 quilos para outro, 500 para outro… Vendo aqui dentro e, quando eles terminam de vender, me pagam”, assim vai Seu Chico. “A Ceasa é minha mãe, meu pai, meu tudo. O que eu tenho, consegui aqui dentro. Criei minha família: uma moça e três rapazes, criados com muito trabalho.”

No entreposto de Maracanaú, as frutas são o gênero mais comercializado — em volume, responderam por 49,5% dos produtos vendidos no local. O abacate que sustenta a família de Francisco está em décimo lugar; entre todos os permissionários, cerca de 9,5 toneladas no ano passado, gerando aproximadamente R$ 40,5 milhões.

 

 

Tradição de pai para filho

Outro comerciante que movimenta a Ceasa-CE desde os primeiros anos de atividade é Davi Lessa, que aparece lá desde 1978. “Eu venho para cá desde os 5 anos e trabalhando mesmo desde os 15”, lembra Esaú Lessa, filho que hoje está à frente das vendas no entreposto de Maracanaú.

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“Com o passar do tempo, ele trouxe irmãos para trabalhar aqui e já vamos na segunda geração de Ceasa”, conta. “No começo, a gente trabalhava com um mix maior, mas nos especializamos em melancia e abóbora (jerimum). Hoje produzo 50% do que vendo, no Rio Grande do Norte e aqui, no Baixo Acaraú, e o restante é parceria.”

Hoje, especialmente após a pandemia de Covid-19, o patriarca “está mais com um conselheiro” do comércio familiar. “Ele tem 78 anos. Vem aqui, dá uma olhada em tudo, é mais como um hobby. Até porque o horário da gente é bem dizer noturno”, completa Esaú, que chegou meia-noite à Central para preparar a feira do último dia 3. 

 

 

O bancário que há 33 anos mudou de ramo

Dos 70 anos vividos, Wilson Costa está há quase metade trabalhando na Ceasa. “Está com uns 33 anos. Era funcionário do Banco do Brasil na época e o salário estava meio difícil. Procurando uma alternativa para melhorar minha renda, vim parar aqui e estou até hoje”, relata.

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O ex-bancário começou vendendo laranja e hoje oferece uma variedade para os clientes: manga, tangerina, coco, abacate… “Produzo coco verde, ali na BR-020 em Caucaia, e compro mais alguma coisa aqui para revender”, explica.

Ele conta que para ganhar a vida e sustentar a família o caminho é um só: trabalhar cada vez mais. “A Ceasa hoje não está mais na época de ganhar dinheiro, mas ajuda no orçamento. Já foi mais fácil; hoje está mais dinâmico, aumentou e diversificou muito os setores”, avalia. “Mas dá para arranjar alguma coisa. É melhor do que nada ou do que ficar parado em casa.”

 

 

Para além das frutas e verduras

Francisco Valdeci, o Didé, é mais um dos permissionários antigos da casa. “Há 36 anos essa história começou comigo vendendo colorau no meio do sol o dia todinho. Com o tempo, o ramo da Ceasa foi se ampliando e consegui botar uma tenda; da tenda para uma barraca e da barraca para uma loja”, recorda. A jornada, porém, teve um soluço em 2009.

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O incêndio aconteceu na manhã do dia 24 de maio de 2009. Era um domingo, único dia em que a Ceasa não abre. A destruição das chamas ficou registrada na memória dos lojistas e nas páginas do O POVO.

“O espaço abrigava 20 lojas que vendiam cereais, materiais plásticos, enlatados e bombons e também tinha o corredor ocupado por pequenos comerciantes”, noticia o jornal impresso veiculado na manhã seguinte.

“Eu já tinha quatro lojas e todas pegaram fogo. Aí recomeçamos em barraca e, dali quatro anos, construíram um galpão novo; desde então, estamos nessa loja”, completa Didé, conhecido pela venda de produtos naturais, doces e molhos.

Temperos, ervas, ração… Tudo o que produz em Baturité é levado para a Ceasa. Parte do ganho vem também da revenda de artigos de outros produtores. “Toda semana tem freguês e tem freguês de muitos e muitos anos, parece até da minha família.”

Falando em família, Didé explica que o nome dos produtos vem de sua mãe. “Tia Iza é um nome que pegou e nunca quis tirar. É tanto que fiz foi patentear.”

 

 

Linha do tempo

 


Melhor aproveitamento dos alimentos

Também conhecida por toneladas de desperdício, há três anos a Ceasa abriga o projeto estadual Mais Nutrição. A iniciativa mantém um banco de alimentos in natura que seriam desperdiçados pelos comerciantes por falta de demanda ou condições estéticas, mas que permanecem adequados ao consumo humano. Além disso, produz polpas de frutas e um mix de legumes desidratados para a transformação em sopa.

No entreposto do Cariri, o projeto atende 6.092 pessoas de Barbalha, Juazeiro do Norte e Crato. De lá já foram doadas cerca de 264 toneladas de alimentos, incluindo cestas básicas. Na Região Metropolitana de Fortaleza, 23.680 cearenses são atendidos na Capital, em Maracanaú e em Caucaia. Mais de 2,4 mil toneladas de alimentos foram doadas desde o início do programa.

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