No começo de outubro, a Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado aprovou por unanimidade o Projeto de Lei 412/2022, responsável por regulamentar o mercado de carbono no Brasil. Ou seja, a partir dele o Brasil teria um mercado regulado — assim como a Inglaterra e os Estados Unidos —, para além do mercado voluntário.
Com o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), o Brasil poderia precificar as próprias metas de redução de emissão de CO2, o que é inviável pelo voluntário. Estariam sujeitas ao SBCE empresas e pessoas físicas que emitirem acima de 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente (tCO2e) por ano. Esses operadores devem monitorar e informar suas emissões e remoções anuais de GEE. Quem emitir mais de 25 mil tCO2e também deve comprovar o cumprimento de obrigações relacionadas à emissão de gases.
Segundo Luan Santos, a aprovação do PL reacendeu um importante debate. "Ninguém vai querer fazer nenhum esforço enquanto não tiver um ambiente jurídico regulatório minimamente seguro", comenta.
O PL não veio sem poréns. Por enquanto, a governança desse mercado regulado é indefinida, o que poderia ser um ponto de tensão e de fragilidade jurídica. "Essa questão da governança tem que ser resolvida antes de virar uma lei de fato, ou existe a possibilidade do PL virar uma lei sem ser implementada. Sou a favor de que a composição desse órgão seja estabelecida em lei, porque na hierarquia jurídica é algo mais concreto e seguro", afirma o doutor em Direito Ambiental Leonardo Munhoz, pesquisador no Observatório de Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Além disso, o agronegócio foi deixado de fora do mercado regulado, apesar de ter papel relevante na emissão de GEE. "O mérito das emendas reflete o que se observa nos principais mercados regulados de carbono em que a agropecuária não é incluída na regulação, sobretudo pela importância do setor para a segurança alimentar e pelas muitas incertezas ainda existentes na metodologia de estimativa de emissões", defendeu a senadora Leila Barros (PDT-DF), presidente da CMA e relatora da matéria.
Segundo a parlamentar, o mais acertado é incentivar a "difusão de técnicas de agricultura de baixo carbono" enquanto se trabalha no desenvolvimento de métricas que contabilizem adequadamente as emissões do setor.
Ocorre que as indústrias incluídas no mercado regulado devem fazer um inventário de fontes de emissão. "O agro nesse ponto é um pouco mais delicado, porque é uma atividade muito heterogênea. (A métrica para emissão) para gado é uma, para soja é outra, para cana é outra… É muito complicado na parte operacional, e as métricas ainda não são muito pacificadas na academia e na técnica", explica Leonardo.
"Vamos lembrar que as metodologias hoje disponíveis são do mercado europeu e americano, portanto, são de países desenvolvidos industriais em clima temperado. O Brasil vai ter uma chance de ouro em criar suas metodologias para uma agricultura de clima tropical."
Na opinião do professor Luan Santos, o agronegócio estar temporariamente de fora do SBCE é um "problema". "O agro é muito complexo, então existem críticas, sim, com relação às metodologias para fazer inventários, mas também existe para transporte, para a indústria", compara.
Para ele, as implicações políticas e econômicas de se incorporar o agronegócio no mercado regulado também parecem influenciar a decisão. "Existe uma preocupação muito grande de gerar algum tipo de política climática que vai impactar exportações, porque isso vai impactar variáveis macroeconômicas como a inflação e o PIB."
Ainda assim, Leonardo indica que atualmente nenhum outro mecanismo de mercado regulado inclui o agronegócio. "Mas o agro pode mitigar por via de boas práticas agrícolas, como a restauração de pastagem e de floresta e a manutenção de áreas de proteção permanente (APP). Ou seja, você vê que essa mitigação do produtor rural está ligada não só ao mercado de carbono, mas também à implementação do Código Florestal."