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Edifício São Pedro: Crônica de uma morte anunciada
Reportagem

Edifício São Pedro: Crônica de uma morte anunciada

Orçada em R$ 1,7 milhão, a demolição do icônico primeiro prédio da Praia de Iracema. População foi ao local se despedir, lamentar e concordar com a derrubada do imóvel
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Início da demolição do Edifício São Pedro (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Início da demolição do Edifício São Pedro

No início da manhã, na esquina da avenida Historiador Raimundo Girão com a rua dos Arariús, o impacto das máquinas de construção trabalhando já ecoava. Pássaros voavam assustados diante da novidade e diversos curiosos se achegavam ao local para tirar fotos e se despedir de um dos prédios mais icônicos da Capital.

A demolição do Edifício São Pedro, prédio icônico localizado na Praia de Iracema com 71 anos de história, teve início nesta terça-feira, 5. Os trabalhos de derrubada ocorrem apenas um dia após o anúncio feito pelo prefeito José Sarto (PDT) e devem seguir por 3 meses, conforme O POVO antecipou ainda nessa segunda-feira, 4. A obra é orçada em R$ 1,7 milhão.

Em coletiva de imprensa, o secretário de Infraestrutura de Fortaleza, Samuel Dias, reafirmou que a gestão municipal buscará o ressarcimento dos custos da demolição com os proprietários do prédio. "A Prefeitura está tomando a frente em função dessas condições específicas de risco potencial. Vai fazer a demolição, e as custas vão ser ressarcidas. Vamos buscar o ressarcimento disso com os proprietários do prédio”, disse.

Ainda segundo o secretário, o trabalho será realizado por uma empresa terceirizada, contratada pela Prefeitura para fazer serviços dessa natureza. Em relação ao processo de demolição, Samuel Dias detalhou que os trabalhos serão feitos com marretas, sem explosões.

“Foi feito um reforço com escoras nos quatro primeiros andares para a gente aumentar um pouco a segurança e acessar o prédio. A partir daí, através de guindastes, gruas e máquinas pesadas, a gente sobe até o topo do prédio e começa a, mecanicamente, desmontar o prédio de cima para baixo”, explicou.

Ao fim dos trabalhos, o titular da Seinfra destacou que a calçada será reformada, de acordo com o projeto de revitalização da Praia de Iracema, porém os proprietários do imóvel deverão decidir o que será feito no local.

“Após a demolição, nós vamos deixar a área limpa, vamos fazer as calçadas dentro do projeto da revitalização da Praia de Iracema, mas o terreno pertence ao ente privado, aos proprietários, e cabe aos proprietários a decisão do que vão fazer com o terreno”, afirmou.

O edifício São Pedro foi inaugurado em 1951, sendo o primeiro a ter mais de três andares na Praia de Iracema. É o que explica Kataly Araújo, 44, que trabalha como guia de turismo. Atuando há mais de oito anos no ramo, ela já tinha como parte da rotina levar turistas para conhecer a fachada do antigo Iracema Plaza Hotel.

“O Iracema Plaza foi inspirado no Copacabana Palace do Rio de Janeiro. Ele era um prédio luxuoso, onde pessoas famosas se hospedavam. Por conta da sua arquitetura diferenciada, os turistas sempre se interessam por ele”, explica.

Triste pela demolição, Kataly foi até as proximidades ao edifício para se despedir. “É realmente a perda de um dos cartões postais da Praia de Iracema e de um dos poucos prédios que restavam de uma Fortaleza antiga”, comentou o guia.

Para o músico e jornalista Dalwton Moura, a terça-feira que marca o início da demolição do São Pedro é também um dia de velório. “A gente sabe o que o Poder Municipal coloca sobre os riscos e que agora a estrutura não tem mais retorno. Existem laudos que atestam isso e nós não temos condição de discutir esses laudos, não é nossa expertise. O que a gente questiona é: por que se deixou chegar essa situação?”, indaga.

Com lágrimas de pesar nos olhos, ele expressa que, caso intervenções fossem realizadas a tempo, Fortaleza poderia contar com um novo equipamento cultural. “O São Pedro poderia ter se transformado em um centro cultural ou um equipamento de turismo, como um museu. Poderia ser o Centro de Referência da Música do Ceará, algo pelo qual lutamos tanto para que seja construído”, diz Dalwton.

Há também quem aprova a demolição do São Pedro. Morando em Fortaleza há dois anos, a paraibana Renata Geylma, de 26 anos, pontua problemas urbanos em decorrência da degradação do prédio.

“Ele era muito antigo e estava muito deteriorado, o que era um perigo inclusive para quem passava por perto. Também tinha pessoas que se atreviam a entrar, inclusive para fazer coisas ilícitas ou para morar. Como é uma estrutura velha, acho mais interessante que aproveitem o espaço e construam um equipamento turístico”, comenta.

O secretário municipal dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social, Francisco Ibiapina, apontou que 16 pessoas em situação de rua foram retiradas do edifício na última sexta-feira, 1º. Porém, apenas parte delas demonstrou interesse em integrar o programa de aluguel social da Prefeitura de Fortaleza.

“A saída do equipamento foi totalmente voluntária, foi fruto de uma abordagem técnica. Eles compreenderam a situação de risco em que estavam submetidos e saíram voluntariamente”, finalizou.

Por outro lado, parte das pessoas que se abrigavam no Edifício São Pedro estava no entorno na manhã desta terça-feira e relata que não conseguiu retirar os pertences do local.

Wanderson Morais, de 27 anos, morava no local há mais de dez anos e afirmou que objetos, como televisão, cama e geladeira continuam no local: “Por que eles não avisaram para eu retirar as minhas coisas?”.

A esposa dele, Micaele Roberta, lamentou ter que sair do edifício, principalmente no inverno. Segundo ela, a Prefeitura apenas informou que o local seria demolido e que eles teriam que sair.

 

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