Os quase 40% dos empreendimentos eólicos em terras privadas apenas com títulos de Cadastro Ambiental Rural (CAR) demonstram um cenário de precarização dos termos do uso da terra na instalação de grandes empreendimentos na zona rural, alega Rárisson Sampaio, membro da Comissão de Direito Ambiental da Ordem de Advogados do Estado do Ceará (OAB-CE).
"Na prática, aquele que ocupa um terreno na zona rural deve informar ao órgão ambiental do respectivo município ou estado sobre essa condição, a fim de viabilizar o monitoramento e eventual regularização das condições ambientais naquela área. Em termos de segurança jurídica, os registros no CAR não possuem qualquer efeito."
Para o advogado, as empresas, no viés econômico, não possuem interesse em ter a propriedade dos imóveis, apenas a posse com o intuito de usar a terra.
O cenário favorece para os contratos de arrendamento ou cessão de uso de terra entre as empresas e os proprietários.
"Trata-se de um uso mais precário e limitado do bem imóvel, o que não dispensa a atenção e devida diligência em observar a legalidade da área ocupada".
Em relação à privatização das terras destinadas aos parques de energia renovável, Sampaio detalha que no Ceará a política fundiária é regida pela Lei Wilson Brandão (Lei nº 17.533/2021), que estabelece os objetivos e procedimentos para regularização fundiárias em terras do Estado.
O profissional classifica que os investidores buscam privatizar as terras após o início dos projetos como uma forma de reduzir os riscos e garantir a consolidação dos investimentos.
"Obter o controle da terra, ainda que mediante instrumentos mais precários, é determinante para a continuidade da exploração dos recursos. Há também prejuízos para a demarcação de terras de comunidades indígenas e certificação de territórios quilombolas, bem como o aumento da pressão ambiental sobre áreas de proteção".
Outra questão é que as práticas irregulares afetam a legalidade e a sustentabilidade das energias renováveis.
Rárisson caracteriza que a recorrência da prática de ocupações ilícitas, apropriações verdes e grilagem de terras "subverte o significado do termo sustentável".
"Na prática, o tipo de empreendimento, classificado como verde, serve apenas para legitimar a reconcentração de terras e exploração predatória dos recursos naturais em novos territórios, como o semiárido nordestino", complementa.