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Estresse financeiro: quando a falta de grana afeta não apenas o bolso
Reportagem

Estresse financeiro: quando a falta de grana afeta não apenas o bolso

|Dívidas| Brasileiros gastam mais do que recebem e despesas causam estresse para mais da metade da população, segundo pesquisa
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 Fábio Xavier conseguiu através da organização financeira a recuperaração das suas dívidas (Foto: FABIO LIMA)
Foto: FABIO LIMA Fábio Xavier conseguiu através da organização financeira a recuperaração das suas dívidas

O representante comercial Fábio Xavier conta que já teve muita dificuldade com dívidas no passado. Costumava gastar mais do que ganhava e usava as reservas financeiras para gerar mais despesas. Foi assim que ele viu seus problemas financeiros se tornarem uma bola de neve.

A situação que Fábio vivenciou faz parte da realidade de 34% da população brasileira, segundo o sétimo Raio X do Investidor Brasileiro, realizado pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

O estudo aponta também que, por consequência do descontrole financeiro, 52% dos entrevistados afirmaram ter um alto nível de estresse por preocupações relacionadas à falta de dinheiro e atrasos de contas. 

São o que os dados da 2ª Coleta do Panorama da Saúde Mental, realizado pelo Instituto Cactus em parceria com a AtlasIntel também destacam. Segundo o relatório, 82% dos entrevistados afirmam ter preocupações com sua situação financeira, enquanto 22% dos respondentes já deixaram de fazer alguma refeição por falta de dinheiro.

Neste caso, Fábio se lembra que, enquanto estava afogado em dívidas, sentia-se cada vez mais preocupado conforme elas cresciam, e sempre estava aflito e nervoso. À época, até sua relação familiar foi afetada.

De acordo com o superintendente de Sustentabilidade, Inovação e Educação da Anbima, Marcelo Billi, apesar de o estresse financeiro ser um fator verificado em todos os estratos sociais, os percentuais são maiores entre a classe D/E (62% com alto estresse), principalmente por conta da baixa renda e da vulnerabilidade social.

A pesquisa mostra que entre as pessoas que já investem, o percentual de estresse financeiro é um pouco menor do que na comparação ao restante da população (45%).

Segundo Marcelo, isso está relacionado ao fator de segurança já que o próprio relatório mostra que 36% de quem faz aplicações em produtos financeiros consideram a segurança como a principal vantagem do investimento. Ou seja, essas pessoas se sentem mais amparadas para situações adversas de suas vidas que envolvam o dinheiro.

A questão da segurança financeira é também um dos principais causadores de estresse. Segundo os dados, 56% dos brasileiros têm receio de perder suas fontes de renda. Para o economista Érico Marques, a incerteza é o principal fator geracional desse estresse.

“Por que muita gente pensa em fazer concurso público? É por que vai ganhar muito dinheiro ou por que vai ter uma certa estabilidade? O ambiente de incerteza pode me gerar estresse quando eu começo a pensar se amanhã eu vou ter um emprego, ou uma situação de trabalho que remunere, pode até ser que eu seja despedido. Existem pessoas que têm dificuldade para conviver com isso”, afirma Érico.

Já Marcelo Billi, declara que perder as fontes de renda é uma preocupação legítima de pessoas que não querem entrar em dívidas ou aumentar as que já possuem. Para ele, a falta de instabilidade financeira causada por trabalhos autônomos ou informais também justifica esse receio.

Com as dívidas recuperadas há cerca de quatro anos, Fábio Xavier assume que em certo momento da sua crise financeira, após viver, como o mesmo classificou, “sem paz”, ele passou a normalizar a sua situação e teve que “se acostumar” com as dívidas para conseguir obter autocontrole. O representante comercial conta que o estopim para decidir organizar suas finanças foi perceber que seu nome estava incluso no SPC e Serasa.

“Eu me auto consultei, percebi que estava fazendo gastos desnecessários, e me conscientizei. O meu autocontrole foi primordial, entendi que eu não podia continuar dessa forma porque era errado, então eu tive que correr atrás e fazer o certo”, relembra Fábio.

“Para reorganizar minhas dívidas tive que parar, e não foi pouco tempo. Tive que equilibrar meu raciocínio, até entender que é questão de tempo obter o controle de todas as dívidas e a gerência do que entra que sai”, finaliza.

 

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Dicas de como organizar as finanças

1 MAPEAMENTO
O primeiro passo para organizar as finanças é elencar todas as despesas e saber quais são as despesas fixas obrigatórias, aquela que todo mês vem para pagar e que tem um valor fixo, como o aluguel, detalha o economista Érico Marques.

2 VARIÁVEIS
É importante classificar também as despesas obrigatórias variáveis, como a conta de luz, que podem mudar todos os meses. Pode ser que ali seja possível enxugar o consumo e assim reduzir gastos

3 LAZER

Outro ponto é categorizar as despesas fixas não obrigatórias, como um "streaming" de vídeo e as despesas variáveis não obrigatórias, como saídas para restaurantes e compras.

4 CORTES

Em seguida, você começa a rever as suas despesas, excluindo aquelas que não são obrigatórias, sejam elas fixas ou variáveis, para adequar à realidade das receitas

5 NEGOCIAR

Tente renegociar aquelas dívidas mais caras ou em atraso. Mas não se esqueça que, ao fazer isso, as parcelas devem estar acomodadas no planejamento dos próximos meses

Controle das finanças e saúde mental

Dos 52% dos entrevistados que indicaram sentir alto nível de estresse em relação às contas, 39% revelaram não conseguir dormir de modo adequado devido à preocupação com as finanças pessoais.

Segundo o economista Érico Marques, o dado reflete a importância da questão financeira para o dia a dia, já que as dívidas acarretam em consequências negativas, como dificuldade de crédito e a sensação de ansiedade em chegar ao fim do mês sem ter condições de pagar as contas.

Ele ainda destaca que o principal problema do estresse não é o dinheiro, mas a falta dele, que leva a uma série de limitações. Porque na nossa sociedade, precisamos de recursos financeiros e a falta dele reduz o que você pode fazer.

"A nossa vida é uma vida financeira. Imagine que eu sou um pai de família e não tenho dinheiro para pagar o plano de saúde dos meus filhos, ou eu estou com as prestações do colégio atrasadas. Então, o estresse é fruto daquilo que eu não vou conseguir fazer em função de estar sem dinheiro", afirma Érico.

O economista reforça que o modo ideal para diminuir o estresse e as preocupações financeiras seria equilibrar suas contas gastando menos, porém é necessário ter noção que podem ocorrer situações imprevisíveis, como uma doença ou uma demissão.

"O mundo não é do jeito que a gente deseja. Então precisamos equacionar a realidade financeira com o ambiente financeiro. Não posso falar, 'faça orçamento que tá tudo resolvido'. Precisamos saber qual a história da dívida? É algo que eu poderia ter evitado ou eu não tive nenhum controle e aconteceu?", enfatiza.

Érico finaliza afirmando que é necessário entender que a gestão financeira, não é só técnica, mas é comportamental, a partir da compreensão de que vivemos em uma sociedade em que somos parte daquilo que consumimos.

"Provavelmente você conhece pessoas que não ganham tanto e são organizadas financeiramente, como você vai conhecer pessoas que ganham relativamente bem e são desorganizadas financeiramente, vai de acordo com o que cada um entende da sua vida. É necessário perceber se as emoções estão mandando nas suas decisões financeiras", conclui.

Baixa remuneração agrava vulnerabilidade financeira e social no País

Um total de 75% dos brasileiros não guardam dinheiro por falta de condições financeiras, segundo a pesquisa da Anbima.

Para a economista e professora Alessandra Benevides, isso está diretamente relacionado à baixa remuneração dos brasileiros.

"O brasileiro médio ganha geralmente um salário mínimo, no máximo um salário e meio, o que não oferece as condições mínimas de sobrevivência de uma família. Por isso, no Brasil, há uma restrição financeira e uma alta demanda por coisas que ainda são básicas e que o brasileiro não consegue pagar com o seu salário", afirma.

Alessandra também explica que problemas estruturais, como a falta de acesso a uma educação formal de qualidade e mais experiência em lidar com tecnologia, são alguns dos motivos para os brasileiros ganharem pouco.

A economista destaca que a reserva financeira é uma opção de precaução, investimento e planejamento que seria mais viável aos brasileiros caso houvesse mais acesso à educação financeira nas escolas, o que auxiliaria na criação de uma noção de como é importante haver uma organização financeira.

A fala é também reforçada pelo superintendente de Sustentabilidade, Inovação e Educação da Anbima, Marcelo Billi, que reitera que o conhecimento e a organização orçamentária são essenciais para as pessoas tomarem melhores decisões em relação às suas finanças.

Mas a carência de educação financeira é determinante para situações de vulnerabilidade social, causadas através de questões estruturais do Brasil, em que ainda há altas taxas de desemprego e de desigualdade social. Ou seja, uma parte da população vive com um patamar muito pequeno de dinheiro e está mais vulnerável às oscilações da economia.

Segundo a professora, outro fator positivo da educação financeira, seria uma melhor escolha com o que gastar: "O brasileiro tem uma cultura que prioriza a compra de celular ao invés de gastar com um investimento que dê o retorno. Preferimos pagar parcelado, do que pagar as contas à vista, isso faz diferença, porque pagar parcelado significa embutir juros naquela conta. Mas para que a pessoa tenha essa consciência, é preciso que ela tenha o mínimo de educação financeira."

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