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Do Brasil para o mundo: 40% dos exportadores são pequenos negócios
Reportagem

Do Brasil para o mundo: 40% dos exportadores são pequenos negócios

Valor exportado em produtos de pequenos negócios ultrapassa R$ 2,6 bilhões, de acordo com o Sebrae. No Ceará, acompanhamento técnico permite que mulheres empreendedoras acessem mercados no Exterior
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Mary Carvalho, empresária cearense que trabalha com cangas de praia passou a exportar para Filipinas (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Mary Carvalho, empresária cearense que trabalha com cangas de praia passou a exportar para Filipinas

Em meio à ameaça de Trump ao Brasil, O POVO foi atrás de como atuamos no comércio exterior dentre as empresas menores. Isso porque 40% das exportações brasileiras são feitas por pequenos negócios e o volume de recursos envolvidos nessas operações ultrapassou a marca de R$ 2,6 bilhões, em 2024.

Os dados são do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e comprovam que o produto nacional encontra aceitação ao redor do mundo, independentemente do tamanho do fornecedor.

O processo para que um negócio consiga expor seu produto em prateleiras internacionais ou mesmo forneça matéria-prima para outros mercados, no entanto, nem sempre é imediato. Pode envolver uma série de questões burocráticas, como certificações de saúde, por exemplo.

Ainda assim, cresce a quantidade de empreendedores brasileiros que fazem o esforço e buscam exportar. O Sebrae calculou que 28,8 mil negócios venderam ao Exterior. Desse montante, 194 eram microempreendedores individuais (MEI), 5.758 eram microempresários (ME) e outros 5.480 eram empresários de pequeno porte (EPP). O volume é recorde, conforme a série histórica iniciada em 2014.

Vender ao estrangeiro é atrativo, primeiramente pelo fato de negociar em dólar, numa escala quase de 6x1 em relação ao real. Também há o sentimento de que o mercado internacional valoriza mais os produtos nacionais, principalmente aqueles com traços artesanais.

Mary Carvalho, proprietária da marca de moda praia Cor Praiana, exportou a primeira carga ao Exterior. Uma caixa de 47 kg com 100 peças, com destino às Filipinas.

O produto enviado é tipicamente cearense: uma canga com alça de madeira que pode ser usada de várias formas, como saia, bolsa, kimono, ou como a criatividade do usuário quiser.

A empreendedora conta que tudo foi possível a partir da participação em uma rodada de negócios promovida pelo Sebrae, no Centro de Eventos. Lá, um empresário filipino a convidou para conversar.

"Vi no Instagram que estão expondo. Fico fascinada quando vejo minhas peças lá!".

Para o futuro, Mary espera fazer mais parcerias para exportação. Em missão de negócios a Portugal, também realizada pelo Sebrae, ela conta que expôs seus produtos e diz que a aceitação é bem positiva. O que se vende no Brasil por R$ 60, lá eles compram facilmente por 60 euros. "Valorizam muito nosso produto e a moeda deles tem muito peso, então vale super a pena".

Acordo assinado entre ApexBrasil e Sebrae no ano passado deve contribuir para o contínuo crescimento desse movimento comercial. É o que promete o Programa de Qualificação para Exportação (Peiex), que terá aporte de R$ 175 milhões para promover a internacionalização de MPEs, cooperativas e startups, com foco especial em empresas lideradas por mulheres e negros, em estados do Norte e Nordeste.

Rogério Morais, analista técnico do Sebrae-CE e coordenador operacional do Peiex no Estado, aponta que é relevante o papel das políticas institucionais de apoio. Em agosto, as primeiras 150 empresas locais terão acesso ao programa.

Para o crescimento dos negócios é fundamental a participação em feiras internacionais, consultorias, rodadas de negócios, além de apoio estatal, privado, câmaras setoriais, de comércio, de instituições financeiras, entre outros, elenca Rogério.

Outro ponto que tem contribuído para a evolução do potencial exportador dos pequenos negócios locais tem sido o comércio digital por meio de marketplaces, que tem meios para conduzir o processo logístico, diminuindo a complexidade da operação para os pequenos.

"Por meio de plataformas de marketplace e de uma logística simplificada, esses empreendimentos estão exportando e importando produtos com mais facilidade. Soma-se a isso a simplificação dos processos e uma maior visão empreendedora por parte dos empresários", afirma.

Do ponto de vista das pequenas empresas do Ceará, os setores que mais crescem em vendas ao Exterior são os de frutas tropicais, moda, confecção, artesanato, produtos culturais e serviços criativos, elenca o Sebrae-CE.

Diretora de Educação Profissional do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Ceará (Senac-CE), Priscilla Carneiro, analisa que a educação profissional desempenha um papel fundamental no desenvolvimento de habilidades e competências essenciais para o sucesso de empreendedores.

Ela destaca que o nível de longevidade dos negócios aumenta a partir da boa formação dos empreendedores. Por isso, formações em gestão de negócios e finanças contribuem para quem quer empreender e ter sucesso num mercado cada vez mais competitivo, especialmente para quem quer exportar.

"A formação profissional do Senac é uma ferramenta valiosa para quem busca não apenas aprimorar suas habilidades, mas também construir um negócio sustentável e de sucesso".

Questões burocráticas merecem atenção do empreendedor que quer exportar

Outro ponto que merece atenção dos empreendedores são as questões burocráticas do processo de exportação. Caso não sejam devidamente resolvidas, a operação pode ser inviabilizada.

Especialista em despacho aduaneiro e comércio internacional, Augusto Fernandes aponta que todo processo de internacionalização, seja importando ou exportando, deve começar com uma análise estratégica.

Analisar o mercado-alvo, estudar exigências legais, tarifárias e logísticas, além de buscar compreender a demanda local. Na sequência, é preciso formalizar o processo junto à Receita Federal, por meio do registro no sistema Registro e Rastreamento da Atuação dos Intervenientes Aduaneiros (Radar).

"Esse cadastro habilita a empresa, através do seu CNPJ, a atuar legalmente no comércio exterior brasileiro. A partir daí, inicia-se a etapa operacional", pontua.

Augusto aponta ainda outro fator que tem influenciado esse crescimento é a maior disseminação de informação e orientação técnica entre pequenos empreendedores. Segundo ele, ainda existe a percepção de que exportar ou importar é um processo exclusivo de grandes indústrias, mas, com o apoio correto, pequenos negócios podem atuar de forma competitiva.

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Dina Pereira, CEO da marca Flor da Aurora
Dina Pereira, CEO da marca Flor da Aurora

Sebrae lança projeto para mulheres empreendedoras exportarem

Iniciar um canal de vendas ao Exterior pode ser transformador para a vida de uma empresa. É neste sentido que um projeto atua junto a mulheres cearenses donas de pequenos negócios, com capacitação para que as empreendedoras iniciem o processo de exportação.

Esse é o projeto Elas Globais, coordenado por Mônica Arruda, articuladora da Unidade de Cultura Empreendedora do Sebrae-CE. Ela explica que o projeto vai além da capacitação, mas realiza uma ação de aproximação comercial a partir da realização de uma missão empresarial.

Mônica destaca que o lançamento do edital surgiu a partir do programa Sebrae Delas, que atua com mulheres empreendedoras em várias jornadas: desde capacitações básicas, mentorias, até o desenvolvimento de negócios liderados por mulheres no Ceará inteiro.

"Percebemos, no entanto, que já existiam empresárias em um patamar mais consolidado, buscando alternativas de mercado. Foi aí que criamos esse projeto específico aqui do Ceará. Ano passado foi a primeira edição, este ano foi a segunda, e já estamos pensando na próxima", ressalta.

Uma das participantes da primeira turma do projeto e que até hoje é acompanhada pelo Sebrae é Dina Pereira, CEO da marca Flor da Aurora, que produz alimentos e cosméticos a base de mel natural.

Natural de Madalena, ela superou uma depressão que a fez abandonar sua antiga ocupação como fotógrafa, mas viu no empreendedorismo uma chance de mudança de vida.

Começou com a marca oficialmente em 2021, na pandemia, por necessidade. Mas conta que recebeu oportunidades de expor seus produtos feitos a base de mel em feiras, como a PEC Nordeste e o negócio deu salto, ela virou palestrante e prepara o lançamento de novo produto, tendo atualmente cinco biocosméticos (gloss, xampu e condicionador sólidos, espuma e sérum facial) registrados na Anvisa.

Em setembro, a Flor da Aurora terá estande no Apimondia, maior feira de apicultura do mundo, que será realizada na Dinamarca. Depois segue para outra feira internacional, na China. Lá terá a oportunidade de vender seus produtos.

Dina conta que, em termos de exportação, a marca já enviou produtos para Lisboa e está fechando parceria no Porto, em Portugal. "Também surgiu uma proposta do Uruguai, e estamos buscando oficializar exportações para os Emirados Árabes, voltadas para salas VIP de aeroportos", afirmou.

Diretora de Negócios da ApexBrasil, Ana Paula Repezza.
Diretora de Negócios da ApexBrasil, Ana Paula Repezza.

Apex Brasil e o esforço para que o Brasil amplie sua participação no mercado internacional

Ao longo da última década (2014-2024), o aumento de empresas de pequeno porte que passaram a atuar no mercado internacional saltou 112,4%, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic). A alta é relevante, mas há o desafio de ampliar o volume exportado.

Os pequenos negócios representam menos de 1% dos US$ 337 bilhões exportados pelo Brasil em 2024. E, para a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), ampliar a capacitação e criar oportunidades concretas de inserção no mercado internacional tem sido uma prioridade estratégica.

É preciso lembrar que as micro e pequenas empresas (MPEs) são responsáveis por cerca de 95% das empresas nacional e 80% dos trabalhadores empregados, segundo o Sebrae.

Aliar essa grandeza ao potencial de oportunidades abertas no mercado internacional tem o poder de ampliar negócios, avalia a diretora de Negócios da ApexBrasil, Ana Paula Repezza.

Para ela, a exportação é uma estratégia poderosa para o fortalecimento dos pequenos porque amplia mercados, dilui riscos e impulsiona a competitividade.

"No mercado interno, essas empresas enfrentam forte concorrência e muitas vezes limitação de demanda, mas ao acessar mercados internacionais, conseguem atingir novos públicos e aumentar seu faturamento em moeda forte, o que protege o caixa contra oscilações do câmbio. Além disso, a experiência com exportação exige a adoção de padrões internacionais de qualidade, logística e gestão, o que gera um salto de profissionalização e inovação", aponta.

Para preparar melhor os exportadores, a Agência tem o Programa de Qualificação para Exportação (Peiex), que já capacitou mais de 30 mil empresas em todo País. Em 2024, foram 5.071 empresas atendidas, sendo mais de 70% micro ou pequenos negócios.

Valores exportados pelos Pequenos Negócios

Período / Valor (em R$)
2014: 1,15 bilhão
2015: 1,07 bilhão
2016: 1,16 bilhão
2017: 1,28 bilhão
2018: 1,52 bilhão
2019: 1,69 bilhão
2020: 1,96 bilhão
2021: 2,85 bilhões
2022: 3,15 bilhões
2023: 2,77 bilhões
2024: 2,62 bilhões
Fonte: Sebrae

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