O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou ontem o decreto que oficializa tarifas de 50% aos produtos exportados pelo Brasil. Mas a extensa lista de exceções à taxação acabou trazendo uma certa "sensação de alívio" para quem imaginava o pior.
Ficaram de fora da alíquota alguns dos produtos mais importantes na pauta de exportações brasileira para o mercado americano, como o suco de laranja, celulose e os aviões da Embraer. No total, são 694 exceções.
Dentre os produtos com peso significativo na balança, praticamente apenas o café e as carnes terão a tarifa extra de 40% - que se soma à de 10% que já está em vigor, chegando à taxa de 50%. Essa taxação valerá dentro de sete dias, de acordo com a ordem executiva divulgada pela Casa Branca.
Nas contas da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), a lista de exceções corresponde a 43,4% do total de US$ 42,3 bilhões comercializados entre os dois países. Com isso, cerca de US$ 18,4 bilhões em exportações brasileiras ficam de fora do tarifaço.
"Embora essas exceções atenuem parcialmente os efeitos da tarifa de 50% anunciada, a Amcham reforça que ainda há um impacto expressivo sobre setores estratégicos da economia brasileira. Produtos que ficaram de fora da lista continuam sujeitos ao aumento tarifário, o que compromete a competitividade de empresas brasileiras e, potencialmente, cadeias globais de valor", destacou a entidade, em nota.
O texto da ordem executivo traz um tom muito mais político do que econômico. Ataca o governo brasileiro e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e faz uma defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro e de "milhares de seus apoiadores" como alvos de "violações dos direitos humanos que minaram o Estado de Direito no Brasil".
No texto, a Casa Branca informa que considera o Brasil uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional dos EUA, classificação semelhante à adotada contra países considerados hostis a Washington, como Cuba, Venezuela e Irã.
"O presidente Donald J. Trump assinou uma Ordem Executiva implementando uma tarifa adicional de 40% sobre o Brasil, elevando o valor total da tarifa para 50%, para lidar com políticas, práticas e ações recentes do governo brasileiro que constituem uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos", diz o comunicado da Casa Branca.
Em resposta, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou que é "inaceitável a interferência do governo norte-americano na Justiça brasileira".
Em postagem nas redes sociais, ele destacou que o Brasil é um país soberano e democrático, que respeita os direitos humanos e a independência entre os poderes. "Um país que defende o multilateralismo e a convivência harmoniosa entre as Nações, o que tem garantido a força da nossa economia e a autonomia da nossa política externa", disse.
O acirramento da crise diplomática entre os dois países preocupa o setor produtivo. Isso porque o comunicado da Casa Branca traz um alerta expresso que, caso o Governo do Brasil tome medidas de retaliação, Trump irá aumentar a alíquota ao Brasil.
Ontem, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou, por meio de nota, que a tarifa de 50% causa grande preocupação, pois compromete cadeias produtivas, reduz a produção, ameaça empregos e investimentos e contratos de longo prazo. Mas, a entidade descarta, contudo, a possibilidade de retaliação, e reforça que o país deve se manter unido e ampliar os canais de diálogo e de negociação com os Estados Unidos.
"Seguimos defendendo a negociação como forma de convencer o governo americano que essa medida é uma relação de perde-perde para os dois países, não apenas para o Brasil", afirma o presidente da CNI, Ricardo Alban.
Josilmar Cordenonssi, economista e doutor em Administração, avalia que a lista de exceções beneficia muito mais os EUA considerando que o país não produz em grande escala a maior parte dos itens. Mas, mesmo assim, o cenário continua adverso, já que a média de tarifas enfrentadas pelos produtos brasileiros era de 2%, ou seja, o patamar subiu em cinco vezes.
Ele ainda destaca o papel de pressão exercido pelos empresários dos EUA, que defenderam seus interesses na importação de produtos brasileiros. O que pode continuar sendo uma estratégia a ser explorada, já que o teor da lista de exceções revela a ideia protecionista da medida.
"Não dá para negociar quando a moeda de troca exigida é a interferência no sistema de Justiça. Mas dá para tentar negociar indiretamente, através do setor privado americano que compra os nossos produtos, que eles pressionem", pontua. (Beatriz Cavalcante, Samuel Pimentel e Carmen Pompeu e Agência Estado )