A prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tem o poder de acelerar a mudança de rumos da direita brasileira. A avaliação é que a direita deve ser fragmentada em torno de novas lideranças, que devem brigar pelo "espólio" bolsonarista de grande liderança direitista no Brasil.
Isabela Kalil, pesquisadora e coordenadora do Observatório da Extrema Direita, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), afirma que a proximidade das eleições de 2026 deve gerar um movimento de disputa entre nomes tentando viabilizar candidaturas.
Apesar do primeiro discurso lamentando a prisão do ex-presidente, de defender posição de "arbitrariedade" do Supremo Tribunal Federal (STF), a pesquisadora observa que as ações agora passam a ser calculadas do ponto de vista eleitoral.
O ápice desse movimento de viabilização, segundo a analista, poderá ser uma briga ferrenha que pode aumentar a desunião da direita. Segundo ela, faltaria tempo hábil para construção de uma nova figura unificadora para a eleição presidencial, pois tal processo "demandaria anos".
Segundo Isabela, o risco é de desfragmentação completa em meio às disputas envolvendo nomes como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), nome mais tecnocrático, o do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), mais envolvido com a pauta da segurança pública, e o do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), nome da pauta do conservadorismo.
"A foto de alguns governadores unidos em torno da agenda da direita não parece combinar com outros que já se apresentam como presidenciáveis. É uma questão de tempo para haver disputas, que podem se tornar públicas ou não, e que inclusive já podem estar ocorrendo nos bastidores", diz.
Do ponto de vista jurídico, a defesa do ex-chefe do Executivo tenta as últimas cartadas. O advogado Paulo da Cunha Bueno primeiro pediu prisão domiciliar humanitária por motivo de doença, o que foi negado. Agora sustenta que a prisão é uma "tentativa de causar humilhação ao ex-presidente".
"Essa questão de tornozeleira é uma narrativa que tenta justificar o injustificável. O presidente Bolsonaro não teria como evadir-se da sua casa, pois há uma viatura com agentes federais armados 24 horas por dia na sua porta".
Para o advogado criminalista, professor de Direito e membro do Conselho de Leitores do O POVO, Nestor Santiago, a decretação da prisão preventiva de Bolsonaro antes do julgamento final de seu processo criminal só veio porque a Polícia Federal entendeu haver risco de fuga do ex-presidente.
Conforme Nestor, além dos vídeos da tornozeleira eletrônica danificada por Bolsonaro, a vigília marcada para a porta do condomínio, ontem, 22, poderia se tornar um "tumulto", visto o que já aconteceu na ocasião dos atos antidemocráticos, em quartéis.
"O objeto da ação penal ainda não está transitado em julgado, isso é importante colocar. Não é comum (decretar prisão preventiva), mas não existe nenhuma proibição. Até porque, segundo o ministro Alexandre de Moraes, haveria um risco claro de fuga com o rompimento da tornozeleira e criação de um tumulto que pudesse evitar a ação mais efetiva da polícia", analisa.
Para o futuro jurídico de Bolsonaro, o advogado ressalta que já foi negado pelo ministro Moraes o pedido de prisão domiciliar no caso da eminente condenação no STF. E que, a preço de agora, é muito pouco provável que haja qualquer possibilidade de encarceramento no domicílio do ex-presidente, apesar da alegação da defesa de risco à vida em decorrência de doença.
"Fica muito difícil o argumento de que Bolsonaro estaria doente para evitar a prisão em regime fechado. No curto prazo, de dois ou três meses, acho pouco provável que haja qualquer possibilidade de prisão domiciliar", pontua.