Em Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza, dados da Defesa Civil do Município revelam que cerca de 21 mil pessoas e 5 mil famílias são afetadas por algum tipo de risco urbano, envolvendo perda de patrimônio e desalojamento por alagamentos e inundações. Porém, assim como Fortaleza, os números podem ser ainda maiores, principalmente em bairros críticos como Conjunto São Miguel, Conjunto Metropolitano, Parque Soledade e Tabapuá. Durante o inverno de 2025, vários alagamentos foram registrados no Município, com famílias precisando ser abrigadas em escolas.
Em uma casa na rua Verona, uma das mais movimentadas do bairro São Miguel, Francisco Eduardo Pimentel, 76, vive em uma casa que exibe os desafios do período de chuva: móveis elevados por pequenos muros de alvenaria e uma linha escura marcando o nível que a água chega todos os anos. Geladeira, guarda-roupa e até a cama estão elevados. Ele diz que construiu sozinho o "escudo" contra a chuva e que há 18 anos "está tudo atrepado do mesmo jeito!".
A arquiteta e pesquisadora de áreas periféricas metropolitanas, Kedna Francis, explica que a região está nas extremidades de dois afluentes do rio Maranguapinho e é ponto histórico de inundação e alagamento. Durante pesquisa na comunidade do São Miguel, Kedna confirmou que as casas na área estão próximas dos trilhos da Linha Oeste do Metrô de Fortaleza (Metrofor), em oposição à Lei de Parcelamento do Solo Urbano, que define uma faixa de segurança de 15 metros entre casas e ferrovia.
"Os principais setores de risco estão ao lado das afluentes do rio, que apresentam pouca infraestrutura, saneamento e coleta de lixo, além das inundações frequentes. Já na área do Zizi Gavião, parte leste e sul do bairro, a principal preocupação é a proximidade com a zona ferroviária e os vazios urbanos", completa.
A dona de casa Cláudia Maria, 37, vê todos os anos a casa ser invadida pela água do rio Maranguapinho. Desde o início de outubro, a calçada da casa de Claúdia virou canteiro de obras. A ponte sob o rio voltou a ser construída para interligar o bairro São Miguel e o Parque das Nações, onde a maioria dos moradores acessa serviços de saúde e escolas.
O projeto iniciado na gestão passada contou com o investimento de quase R$ 1,4 milhão e continua em andamento após a mudança para a gestão atual. Segundo a Prefeitura, o investimento da gestão atual já chegou a R$ 3,6 milhões para terraplanagem, pavimentação e criação de meio-fio. A previsão é de que a segunda fase de estruturação da ponte seja entregue até fevereiro de 2026.
O líder comunitário Samuel Costa, morador do bairro há 43 anos, diz que a comunidade continua desassistida de programas sociais efetivos e que a maioria da ajuda vem de iniciativa privada. A Defesa Civil disse que famílias do bairro cadastradas nos Centros de Referência de Assistência Social (Cras) devem ser contempladas com doações de kits emergenciais com cesta básica e colchões em períodos de enchente.
O Plano Diretor de Caucaia, atualizado em 2019, define o conjunto São Miguel como Zona Especial de Interesse Social (Zeis), que destaca a região como prioritária para políticas públicas. Kedna explica que territórios recebem essa classificação para concentrar ações de melhoria urbana, como recuperação ambiental, regularização fundiária, drenagem e ampliação do sistema de esgoto e saneamento.
Em nota ao O POVO, a Prefeitura de Caucaia afirma que atua preventivamente com vistorias periódicas e suporte emergencial às famílias. Gestão informa que inspeções, limpezas e desobstruções são realizadas em todos os corpos d'água do município durante o ano para minimizar transbordamentos.
Em setembro, o Governo Federal anunciou recursos para a pavimentação e drenagem nos bairros São Miguel e Parque das Nações por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC Seleções 2025). Segundo a Defesa Civil de Caucaia, relatórios técnicos devem priorizar o investimento em locais que tenham impacto direto na redução de riscos. Em nota, pasta esclarece que, desde o início do ano, a Secretaria de Infraestrutura retomou obras financiadas pelo Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), nas regiões do Picuí, São Miguel e Cristalinas.